Nunca fui uma pessoa muito religiosa. Fiz só a Primeira Eucaristia
e nunca me crismei. Não vou a missas. Gosto de visitar igrejas fora do horário
de missa, para apreciar a arte dos templos. Apesar disso, tenho que reconhecer
o mérito em Jesus Cristo. Ele
foi altamente mal interpretado em vida, frustrando-se na cruz, e esse drama
serve de alento eterno ao ser humano, que é por excelência um ser que se
frustra o tempo todo. Esse contentamento conquista a fé das pessoas, em um
mundo tão duro e difícil. A vitória de Cristo após a humilhação é uma história
e tanto, servindo de esperança.
Era o ano de 1987, e minha irmã e eu estudávamos em um
colégio particular de freiras. Nós assistíamos a slides da Via Sacra, e éramos levados à Igreja de São Pelegrino,
também em Caxias, para ver uma réplica da Pietà de Michelangelo. E a freira nos
dizia:
- Olhem a tristeza de Maria ao carregar o filho morto – a
fidelidade da réplica era impressionante, uma pena que apenas a parte frontal
da obra podia ser vista.
Minha professora, que era freira, explicou a divisão de águas
que foi o surgimento do Cristianismo. Antes de Jesus, era tudo na base do “Olho
por olho, dente por dente”, ou seja, se eu matasse alguém, eu teria que ser
morto também. Então Jesus trouxe o conceito inédito do perdão. Se Deus tem
paciência eterna para com seus filhos pecadores, então Ele tem que saber
perdoar sempre. A frase já diz: “Errar é humano”. O ser humano foi feito para
errar, para pecar. É da essência da Humanidade cometer equívocos e fazer “burradas”.
O importante é o arrependimento: se tenho o desejo de voltar no tempo e
desfazer o erro, é porque tenho a humildade de reconhecer o erro, libertando-me
assim.
O taoismo, concebido algum tempo antes de Jesus passar pelo
mundo, é bem simétrico aos conceitos do Cristianismo: humildade, compaixão e
moderação são o tripé básico de Tao, visto que este é a mesma coisa do que
Deus, só que chamado de modo diferente. Se o ser humano é universal, Deus
também é, e assim é a mensagem cristã.
O filme “A Paixão de Cristo”, de Mel Gibson, deu pano para
a manga, sendo até acusado de antissemitismo. Na película, as últimas horas de
vida do messias são retratadas. Patriarcas judeus julgam e decidem punir o
homem com a pena capital, com o requinte de crueldade que era a crucificação,
algo equiparável a ser queimado vivo em uma fogueira da Inquisição, sendo esta em
nome de Cristo, porém uma espécie execução bárbara da qual Ele jamais lançaria
mão. A crucificação servia para assustar o cidadão comum: comporta-te e não acabarás
assim. Era aterrorizante.
O musical da Broadway “Jesus Cristo Superstar” traz uma
roupagem pós moderna à trajetória do pregador que, ironicamente, morreu
pregado. Jesus foi isso mesmo: um astro. Ele brilhava nos seus discursos e no
seu modo simples de ver a vida. Para Ele, somos todos filhos do mesmo Pai,
sendo Jesus nosso irmão, nosso igual. No filme “Celebridades” de Woody Allen, o
diretor (judeu) tenta mostrar como Jesus foi amado como um carismático astro.
Em outro divertido filme de Allen, seu personagem tenta se adaptar a alguma
religião, deparando-se em um certo momento com um holograma 3D que mostra
Cristo abrindo e fechando os olhos na cruz.
O Espiritismo reconhece tranquilamente o brilho de Cristo.
Para a doutrina espírita, Ele é o espírito mais depurado que já encarnou na
Terra.
- Nós (os católicos apostólicos romanos) respeitamos os
espíritas – disse minha professora freira certa vez.
O livro bestseller megahit
“O Código da Vinci” fala sobre o segredo de que Jesus tivera filhos com Maria Madalena
e que seus descendentes ainda viviam sobre a Terra. Ficção, é claro. Na
verdade, somos todos descendentes Dele.
O Cristianismo resultou em vários ramos. Há dias atrás, o
patriarca da Igreja Ortodoxa Russa encontrou-se com o Papa Francisco, e foi um
evento grandioso porque havia um milênio que os líderes dessas igrejas não
haviam se encontrado. Na Europa houve a cisão entre o Vaticano e a Igreja
Protestante, um momento muito bem mostrado no filme “Elizabeth” de Shekhar
Kapur. Isso sem falar das igrejas alternativas que pipocam no Brasil. Jesus
Cristo é inesgotável.
Jesus nasceu pobre, viveu pobre a morreu pobre. Ele não
nasceu herdeiro do trono de Roma; sequer nasceu herdeiro do trono de alguma
província dos domínios do Império Romano. Apenas séculos depois, depois dos
cristãos terem sido cruelmente perseguidos no império, é que a Humanidade
deu-se conta da importância de Cristo no curso da história dessa mesma Humanidade.
Jesus é o centro sobrenatural da História. A riqueza Dele está nos conceitos,
ideias e pensamentos que Ele propagou. “Matéria é nada; pensamento é tudo”, diz
o Espiritismo. O legado de Jesus está em sua própria cabeça. Jesus está na
mente das pessoas. Jesus despreza o materialismo.
Em outra instituição de ensino, minha professora interpretou
o conceito de ressurreição: Jesus, homem de carne e osso, de fato morreu e seu
corpo pereceu, mas depois ressuscitou na fé dos seus seguidores. Nesse sentido
é palpável o renascimento, pois a Ciência, por exemplo, refuta a ressurreição
da carne - ressuscitar é um conceito que não deve ser levado ao pé da letra. No
ponto de vista espírita, ressuscitar significa morrer, desencarnar e ser livre
de tudo o que afetava o corpo físico. No desencarne, a pessoa deixa tudo par
atrás: raça, cor, nacionalidade, classe social, gênero e sexualidade. É a
igualdade entre irmãos. O mundo está até hoje tentando entender o que significa
ressuscitar. E o que o “Reino dos Céus” é? Para o Espiritismo, são as colônias
metafísicas, as cidades espirituais onde os indivíduos vivem com trabalho,
estudo e diversão, em uma vida produtiva e agradável. E lá está Jesus nos
esperando, fazendo-nos entender que o Paraíso não é uma vida contemplativa e
ociosa – é um lugar cheio de riqueza espiritual, no qual tudo gira em torno da
saúde psicológica.
Jesus foi executado como um pária. Ele não foi covardemente
assassinado em uma emboscada. Não foi pego por um assassino reles. Jesus foi
oficialmente processado pelas leis do Império Romano. Foi executado como
previsto em lei. Foi
considerado um verme, um psicopata louco, um câncer social, uma ameaça à vida e
à integridade dos cidadãos. Ele foi desprezado como fezes. E esse fim deveria
ter sepultado para sempre sua passagem pelo mundo. Ele tinha tudo para cair no
mais completo esquecimento, ter virado uma piada, tratado como uma pedra de
cascalho de tão comum e medíocre. Como a verdade é a filha do tempo, o efeito
Jesus se revelou claro, conciso e compreendido. A história de Cristo é muito
forte e poderosa. É uma mensagem, a de que somos todos da mesma família e, quem
não respeita essa mensagem, sofre. A simplicidade Dele, sua racionalidade no
Seu modo de organizar o universo, é promessa de uma vida melhor após o
desencarne, como a alma sobrevive à morte do corpo. Jesus rechaçou o mundanismo
romano.
- São nossos irmãos, que sofrem – diz um espírito no filme
espírita “Nosso Lar” sobre pessoas que vagam pelo Umbral, a dimensão prisional dos
espíritos materialistas e infelizes, que não aceitam a morte do corpo físico e
nem querem desprender-se do que tinham de material na Terra.
A corajosa popstar
Madonna já se inspirou muito em
Jesus Cristo e no Cristianismo em músicas, clips e shows,
principalmente na canção “Like a Prayer” (Como uma oração) – mãos furadas por
pregos, cruzes em chamas da Ku Klux Klan, racismo e preconceito. A irreverência
artístico religiosa mina quase toda a obra da estrela, que busca brilhar como
Ele.
Eu tenho um colega do Ensino Fundamental que virou padre, e
tenho uma grande amiga minha que é freira. É raro hoje em dia um jovem decidir
pela carreira eclesiástica. Por isso a imposição de uma figura como o Papa
Francisco está sendo positiva, pois o Santo Padre esforça-se para ser um
autêntico cristão e interpretar da forma mais pura possível o legado de Jesus.
Francisco está dando um show de humildade e está se tornando um gigante
diplomático, reaproximando Cuba dos EUA, por exemplo. A mensagem de Jesus está
na união dos povos, mesmo o mundo não sendo totalmente cristão: os hindus, os
chineses, os judeus, os islâmicos, os taoistas e os budistas não reconhecem a
divindade em Jesus Cristo. Mas
Ele foi um homem tão grande que nunca desejou ter poder e influência, valores estes
mundanos. Jesus pregou o rechaço ao mundanismo e à obsessão por dinheiro, na
promessa de libertação da alma, de felicidade e de contentamento.
Eu pareço soar como um padre, não?
Na ilustração desta
postagem, o ator Jim Caviezel caracterizado no filme “A Paixão de Cristo”.
O realismo na violência sofrida é intenso.
Outro filme, “A Última Tentação de Cristo” também causou
alvoroço cultural. É arrebatadora a sequência inicial, que mostra Jesus como
simples carpinteiro mercenário, fabricando cruzes sem se importar quem nelas
eram crucificados, levando na cara uma cusparada de uma Maria Madalena que o
despreza, tendo a Nossa Senhora como mulher comum, brigando fervorosamente para
defender o próprio filho.
Se você mora ou não em Caxias do Sul, convido-o a visitar a
Igreja de São Pelegrino, um templo de interiores deslumbrantes concebidos por
Aldo Locatelli e Emilio Sessa, dois pintores italianos. A cena do Juízo Final é
de tirar o fôlego, e a Via Sacra também não decepciona.
Acima de tudo, Jesus trouxe a mensagem do Amor. Pobre
daquele que não ama a si nem aos outros. Pobre daquele que não ama a vida. No
mundo espiritual, há o conceito magno de amor incondicional, da estima saudável
– o ódio, ou seja, a falta de amor, é doente e só traz sofrimento ao espírito
odioso. Eis que um rei desencarna e deixa para trás sua coroa, e só será feliz
se aceitar que não mais tem o que tinha. Como diz o ditado, “Vão-se os anéis,
ficam os dedos”. O Espiritismo diz:
- Você não imagina a que estado ficam reduzidos aqui (no
mundo metafísico) aqueles que são considerados felizes na Terra, ou seja, os
ricos.
Em um mundo no qual tudo gira em torno de dinheiro, Jesus
vem e traz o conceito de desprendimento: você até pode ter o ouro, mas nunca
deixe o ouro ter você.
Engatado no conceito de amor vem a caridade. Por exemplo: certa
vez, uma vizinha minha pediu para estacionar o carro na vaga de garagem, vaga
correspondente à do meu pai. Como meu pai estava fora da cidade e só voltaria
muitos dias depois, eu cedi temporariamente o box à vizinha. Se eu fosse
egoísta e ganancioso, eu teria cobrado um pequeno aluguel. Caridade é ter a
consciência do próximo, algo ainda mal compreendido no mundo. De que adianta
termos as coisas se não podemos compartilhar as mesmas?
Existe um centro espírita cujo nome é “Fora da Caridade não
há Salvação”. O egoísmo é fechar os olhos para os problemas do mundo e ter uma
vida centrada no próprio umbigo: se estou bem os outros que se danem, diz o
egoísta. O problema é que, em geral, o mundo está cheio de pessoas que querem
passar uma na frente da outra. Amar é ser honesto, diria Jesus; é respeitar a
vida. Em vida, Jesus foi extremamente desrespeitado, provando assim o egoísmo
do mundo. Cada prego da cruz mostrou a falta de amor e de compadecimento que as
autoridades tiveram para com Ele. À frente de seu próprio tempo, Jesus segue
invicto na fé, como o Papa Francisco, agregando as pessoas em um posicionamento
de alegria em estar no mundo.
Jesus dá uma lição de como brilhar. Difícil imaginar algum
astro de Hollywood com o mesmo brilho Dele. Jesus mostra que o sofrimento passa
e que o êxito espiritual permanece. Vão-se as experiências; fica o aprendizado.
A paz é maior do que o sofrimento. Jesus é o maior diplomata de todos os
tempos, pregando a paz entre os povos, nunca Ele exigindo ser recompensado por
isso. Como diz o taoismo, deve haver a falta de expectativas, pois, assim, a
frustração será evitada. Jesus quis unir o mundo por amar este, nunca exigindo
ser um homem endeusado. Isso é humildade. Quantos reis perecem em seu próprio
desejo em se tornar deuses, desprezando o amor e a união! Jesus veio ao mundo,
cumpriu sua missão e voltou intocado ao Reino dos Céus, sem qualquer cicatriz
de pregos.
Jesus foi e continua sendo referência. Sua elegância é
incrível. Quando levou um tapa na cara, ofereceu a outra face. Chique como uma
fragrância agradável. Realmente, a elevação de Cristo é incontestável. Mesmo
quem não é cristão tem que reconhecer que Ele foi um homem singular, muito
singular. O maior dos visionários. Não tenho medo de Jesus – tenho medo das
atrocidades que o ser humano comete dizendo este agir em nome de Jesus, ou em
nome de outras religiões, como o islamismo, que por si só é uma bela religião.
Tenho medo do ódio e da guerra.
E, no mundo, reis sobem e descem de tronos, com suas
vaidades perecidas, enquanto Jesus permanece. Rei dos reis.