O italoargentino Lucio
Fontana (1899 – 1968) é tido como deflagrador do Espacialismo, um movimento de
vanguarda, agressivo como qualquer inovação, como o Modernismo Brasileiro. Já
teve uma mostra retrospectiva no Met Breuer, que é uma “filial” do Met de Nova
York, sendo aquele responsável exclusivamente por mostras de Arte Moderna e
Contemporânea. Fontana é conhecido por perfurar e cortar suas obras, fazendo
também entalhes. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente
meus. Boa leitura!
Acima, Conceito Espacial (1). Esta obra remete ao recente caso no Brasil
de um carro ser alvejado por militares, matando inocentes. É como a marca de
tiroteios em favelas, na efervescência do Funk Carioca, na participação de
Anitta no próximo álbum de Madonna. A cor da base é alva, branca, como se
estivesse predestinada a receber esses tiros de pistola, no prazer estuprador
de macular algo, de pisar em terras devolutas, como um imigrante italiano
abraçando uma vida dura, de muito labor, encarando terras selvagens, cheias de
índios e criaturas exóticas. Aqui é como uma constelação, uma família estelar,
no enigma das estrelas fascinando a Humanidade desde sempre, na obsessão incessante
de um artista querendo se tornar estrela, tornando-se uma referência no céu
noturno, nos sonhos de um ator em início de carreira, no duro fato de que
ninguém brilha o tempo todo, e de que a Morte vem incondicionalmente, num
artista querendo ser lembrado para sempre, deixando uma mácula indelével no
Mundo. Aqui, são como organismos microscópicos no Oceano, nos mistérios do
surgimento da Vida na Terra, com cientistas se perguntando se há Vida
Microscópica fora da Terra, nos confins de um sistema solar tão vasto, tão
frio, tão escuro. Aqui, há uma divisão entre furos e cruzes, e, apesar de
estarem todos juntos, como dançando num baile, suas diferenças jamais serão
esquecidas, num mundo democrático em que, frente à urna, somos todos iguais,
não importante sexo, cor, raça, nível social etc. Mas também num mundo em que
as diferenças jamais serão esquecidas, nas inevitáveis dores da existência,
numa pessoa que geme de dor por ser desimportante, como um ator que, no início
da carreira, teve inúmeros sonhos apolíneos, mas que, no galgar dos anos, foi
se frustrando e acabou trocando de carreira, sepultando um sonho que, apesar de
belo, não resistiu às intempéries da Vida, como no choque entre dois mundos –
um mundo idealizado e o mundo real, num choque em que o idealizado é
pulverizado e o real, na sua dureza, prevalece. Aqui, é como uma tela de
bordado, na costureira com sua agressiva agulha, perfurando o tecido, na
metáfora ao redor das costureiras, tecendo os destinos das pessoas, fazendo com
que passemos uns pelas vidas dos outros, como conheci, certa vez, um amigo, e
ele e eu estávamos passando por uma devastação existencial muito grande, só que
por motivos diferentes, e eu jamais vou me esquecer deste amigo. Aqui, é como
aquele joguinho infantil de ligar os pontos e descobrir uma forma, um desenho,
uma lógica, algo palpável, solucionando um mistério e trazendo elucidação a
superstições tolas – é o poder da Razão, a lança afiada que todos temos em
nossas respectivas bainhas. Invertendo as cores aqui, temos um fundo negro com
estrelas brancas, numa dança de sedução entre claro e escuro, nas majestosas
fotos em preto e branco das estrelas hollywoodianas, fazendo metáfora com a
vida majestosa que nos espera após o Desencarne, quando um barco nos leva a uma
dimensão em que as vicissitudes terrenas nada significam – existe uma vida maravilhosa
após a Encarnação, e entes queridos, falecidos antes de nós, aguardam-nos em
uma suntuosa festa de retorno, como um filho que finalmente volta ao Lar. Esses
furinhos de Fontana são como um rastro deixado por serpentes, na sensual
liquidiscência das cobras, seres de constituição simples, minimalista, como um
cabelo impecavelmente aprumado com gel. É como um enxame de muitos mosquitos,
num grupo social complexo, numa família numerosa, muito numerosa.
Acima, Conceito Espacial (2). Uma vista do deserto do Saara, pontilhado
por inúmeras pirâmides, na necessidade do Ser Humano em entender a finitude da
Matéria. A cor é dourada, gloriosa, nos louros exclusivos que são jogados num
artista consagrado. É como a vista aérea de construções humanas, talvez querendo
obter a atenção de seres extraterrestres, que nos olham de cima, do espaço.
Parece que os ventos do deserto foram moldando essas construções, na
sensualidade das curvas erosivas que o vento foi desenhando por eras geológicas,
no fato de que nada na Terra é eterno, e nem o Sol é eterno, e do mesmo modo
que algumas estrelas morrem, outras nascem, num Universo em constante processo
de evolução e depuração. As pirâmides, com suas pontas agressivas, apontam para
o Céu, como se quisessem dizer algo, atingir algo, na esperança de que a alma
sobreviva à putrefação orgânica, numa esperança de que algo um pouco melhor do
que a dura vida material. São como estrelas inúmeras em uma galáxia, uma
família sideral, com estrelas girando em torno de um vazio, de um buraco negro,
nas incompreensíveis demandas cósmicas, num Cosmos que funciona como se fosse
um organismo só, na pergunta: O que há além da escuridão nos confins do
Universo? O que há depois? O que é a Eternidade? A Eternidade é poderosa demais
para ser entendida pelo Ser Humano, pois a Eternidade é o imenso poder de Tao,
o qual sempre esteve aqui. Estes furinhos de Fontana seguem uma certa lógica,
um balé, e desdobram-se como serpentes, fluindo pelas areias, famintas, sempre
em busca de comida, como insaciáveis pombas urbanas, sendo alimentadas por
cidadãos que se dão ao trabalho de comprar milho granulado, como uma pessoa que
conheço, que simplesmente ama os animais de rua. As dunas não são perenes, e
estão em constante processo de modificação, nunca caindo numa mesmice, no modo
como a pessoa nunca pode crer que atingiu um momento de perfeição, pois, como
dizem as leis básicas da Dialética, tudo é processo, tudo é dinâmico, no modo
como é uma ilusão acreditar que a Terra será para sempre como é, com os
continentes migrando para lá e para cá no passar de bilhões de anos – como a
Humanidade é jovem! É da cor de um biscoito, recém-saído do forno, espalhando
um doce cheiro de baunilha pela casa, como nos furinhos nos biscoitos de
bolacha Maria. São como fios gravitacionais entrelaçados num sistema social
complexo, em que o infrator é punido e rejeitado, no modo como um psicopata assassina
sua própria vida social, “queimando-se” com tudo e todos. São serpentinas num
baile de carnaval, na inofensiva brincadeira de salão de jogar confete uns
sobre os outros, num momento de festa, num momento que faz metáfora com a rica
agenda social metafísica. São como lombrigas num intestino, apoderando-se de um
organismo, sugando a Vida, como pragas em uma árvore, ou como pragas num vinhedo,
num viticultor permanentemente atento a qualquer insinuação de parasitas sobre
os vinhedos. É o exercício cognitivo de separar o joio do trigo, observando o
Mundo do jeitinho que este é, sem maquiagens ou idealizações, no sentido da
mortificação espiritual, no exercício de não mais se deixar seduzir pelos
agouros mundanos, rejeitando e desprezando estes. É como os cabelos sedutores
de uma sereia n’água, na sedução feminina que faz com que Marte curve-se
perante Vênus, numa sociedade machista em que é complicada a questão feminista,
pois o Ser Humano constrói inúmeras ritualizações em torno de gênero. São como
os cabelos esvoaçantes de uma Gisele, encantando o Mundo com o talento de
alguém que sabe se destacar numa passarela, na agressividade de uma pessoa que
não se contenta em ser só mais uma na multidão, numa atitude altamente
antissimplória. É uma água viva com seus tentáculos cáusticos, reinando sobre
as águas.
Acima, Conceito Espacial (3). Temos pinceladas afoitas, como um papel
higiênico usado, na ironia de que as catarses são fezes psíquicas, que limpam a
mente do artista catártico. É como a vista aérea de um complexo de
arquipélagos, com muitos subconjuntos cortados por muitos lagos e rios, no fato
de que a Terra é tão rica em Vida, sem o Ser Humano saber se há esferas no
Universo com tanta Vida como há na Terra, no modo como o Ser Humano sempre
olhou para as estrelas, perguntando-se o que são elas, como num documentário
biográfico que vi ontem mesmo, sobre Rita Hayworth, no talento instintivo de
certas pessoas que conseguem se vender muito bem, pois não há livro ou
faculdade que nos ensine a brilhar, e este aprendizado tem que ser individual e
instintivo – por que certas pessoas têm tanto talento para se vender e outras
não? Aqui, há uma minoria, que são as pinceladas brancas, relegadas a um papel
mínimo e coadjuvante, discreto, sempre sendo a dama de honra e nunca sendo a
noiva, no modo como as pessoas que vagam pelos submundos têm que se contentar
com migalhas, com restos, na prisão mental que é um submundo. Aqui, há a
supremacia das pinceladas douradas, numa vida iluminada, sem a escuridão fétida
do submundo. Aqui, é um artista se vendendo como ouro, dando-nos a impressão de
que o artista reconhecido em vida teve sorte, mas não é bem assim – é uma
ilusão crer que uns nascem com sorte e outros nascem com azar, e o fracasso de
alguém não é culpa do Mundo, apesar de parecer que este é injusto e cruel. O
fundo do quadro é um oceano denso, bem escuro, que esconde o que há por baixo,
no modo como a Divina Providência esconde certas coisas por um certo tempo,
sendo muito importante que a pessoa só veja aquilo que realmente deve ser
visto, pois quando não é para a pessoa ver algo, não tem Cristo que faça ver. A
Vida é uma cortina misteriosa, e nunca vemos o que não nos é permitido ver.
Esta é uma foto do Google Earth, dando a impressão de que a Terra é plácida e
perfeita, na perfeição de uma cidade metafísica, onde as dores existenciais
cessam e onde o indivíduo tem uma vida plena, produtiva e deliciosa. O sucesso
do Google Earth se deve ao fato da metáfora que o programa faz com o Mundo
Metafísico, um plano desvencilhado das vicissitudes terrenas. Neste programa de
computador, parece que tudo está em inabalável paz, e que os problemas do Mundo
e das pessoas, simplesmente, deixaram de existir. Lucio Fontana,
definitivamente, abraça a Arte Moderna e foge dos moldes clássicos acadêmicos,
no modo como a Renascença, na época desta, era o que havia de frescor e
novidade, com as ondas, as vogues ditando tendências e renovações, fazendo da
Arte um corpo dinâmico e imprevisível, numa Arte que simplesmente não tem como
cair na mesmice, sendo função da Arte trazer sempre frescor, sempre evolução,
acompanhando o galgar moral da Humanidade, pois o comportamento moral é o foco,
o objetivo da Encarnação, e os que não têm apuro moral, perecem no Umbral, na
dimensão na qual vagam aqueles que não aceitam que há algo muito além da
Matéria, do Físico. Aqui, é uma frente fria e úmida que vai se espalhando por
um país, numa Natureza ditando as regras, cabendo ao Ser Humano aceitar
humildemente tais golpes climáticos, sempre buscando se adaptar a dias frios ou
quentes; úmidos ou secos. E as pinceladinhas brancas resistem, valentemente,
como o Modernismo Brasileiro, que foi se impondo sobre moldes clássicos e
paradigmáticos de Arte, quebrando a membrana do tédio e tendo a mesma atitude
agressiva de Lucio Fontana, rasgando as telas, no prazer desvirginante de
morder um bombom de sorvete coberto de uma casca de chocolate. Aqui, temos a
ovelha negra da família, a anomalia em Matrix, fazendo do indivíduo contestador
o nervo de novas eras, no modo como a evolução de uma sociedade se deve à
atitude do indivíduo transgressor, e a Arte tem essa função, a tarefa de trazer
frescor e novidade, pois é claro que a Humanidade jamais permaneceria para
sempre na Renascença.
Acima, Conceito Espacial (4). Lucio pegou aqui um estilete e deixou sua
mácula, sua marca, como nas garras de Wolverine, rasgando o Mundo, trilhando um
caminho, desbravando caminhos nunca antes trilhados, na coragem de uma pessoa
que se permite sonhar. Aqui, é como um olho felino, afiado, que enxerga muito
longe, como lince. É o grande e terrível olho onisciente de Sauron, o Senhor
dos Anéis, o Senhor da Escuridão que quer agrilhoar o Mundo e ser o Senhor de
tudo e todos, acabando com a Vida na Terra e promovendo Fim dos Tempos, num cenário
apocalíptico, na fraqueza do Ser Humano perante os poderes mundanos do Anel.
Aqui, é como o órgão reprodutor feminino, numa fenda que conduz a uma caverna
de mistérios, no útero que é o santuário da Vida, o nervo da Vida, a sala
primordial que trouxe todos nós à Terra. É o portal, a passagem, o canal natal
que gera a Vida e traz encarnados ao Mundo. É o termo, a gíria “racha”, que
denomina seres humanos heterossexuais do sexo feminino, no modo como a
genitália feminina tem o aspecto de uma rachadura, de um trinco em vidro,
parecendo um coco que caiu no chão e que adquiriu uma rachadura. É como um
homem castrado, restando apenas a cicatriz da extirpação. É uma brecha que
permite que a pessoa respire, no modo como é insuportável a “falta de ar” nas
pessoas que simplesmente não produzem. São as brechas da Vida em Sociedade,
como o Machismo, por exemplo, num sociopata sugador e ardiloso que se aproveita
dessas brechas para emanar malícia e maldade. A Sociedade Heterocentrada, por
exemplo: o sociopata se aproveita dessa porta escancarada para causar mal a
outrem, numa inteligência brilhante, só que uma inteligência a serviço do Mal,
como na inteligência de um Bin Laden destruindo símbolos do poder americano.
Aqui, é um risco elegante e minimalista, num dano mínimo, nas inevitáveis
feridas que a Vida nos causa, deixando cicatrizes que não nos permite que
esqueçamos, com lições e aprendizados, na demanda existencial de lições
importantes sendo aprendidas, no modo como nada, na Vida da pessoa, acontece
por acaso, numa Divina Providência que tece nossos dias na Terra. É um risco
que demarca um antes e um depois, como na passagem de Jesus pela Terra, numa
agressividade do Bem, benéfica, sem amargor, num homem que trouxe lições
importantes, sempre visando a depuração moral do Ser Humano, como ser uma pessoa
honesta, digna de respeito, no modo como nas Cidades Metafísicas só há pessoa
boas, honestas e virtuosas, pessoas que jamais optariam pelo Mal. É como uma
jangada bem fininha, rasgando mares e rios, na ânsia humana em descobrir e
desvendar, como na Era das Navegações, ou na vontade humana de pisar em Marte,
num Ser Humano sempre sedento por superações e descobertas, na ânsia científica
em desvendar mistérios. É como um fiozinho de cabelo encontrado numa cena de
crime, num fiozinho que, na perícia, fará toda a diferença, nos vestígios que uma
pessoa vai deixando na Terra, como pegadas, com legados sendo entregues no
Mundo. Aqui, temos uma virginal base branca, e o olho felino negro é
misterioso, como se revelasse um interior que jamais fora revelado
anteriormente. Estamos olhando para os confins cósmicos, sendo bilhões de anos
insuficientes para vermos tudo o que nos cerca, no poder imenso por trás da
Eternidade, uma prova do poder intermitente de Tao, a virtude eterna. Este
rasguinho nos dá vontade de rasgar ainda mais para vermos o que há dentro, num
desejo de estupro cognitivo. Esta brecha deixa o quadro respirar, como uma
fenestração de banheiro, permitindo que a umidade do banho saia pela janela. É
como um corte de papel, um corte mínimo, mas que faz toda a diferença, porque
dói. É como uma mínima ferroada de abelha, que dói mais do que imaginamos
quando vemos um ferrão tão pequenino. É o ferrão sendo subestimado,
revelando-se fortíssimo e ensinando a lição de que não devemos subestimar
outrem.
Acima, Conceito Espacial Vermelho. O gosto de Fontana por rasgos, como
uma mão calejada, habituada à lavoura. É como uma estrada trilhada inúmeras
vezes, deixando vestígios de danos e desgastes, num atelier desgastado, um
lugar próprio para labor, numa feiura e numa bagunça que só o próprio artista
pode compreender. Temos aqui uma gruta, como em um dos episódios do desenho
animado Thundercats, numa gruta cujo interior fazia com que a pessoa, ali
dentro, envelhecesse extraordinariamente rápido, em questão de apenas alguns
segundos. É uma fissura, uma rachadura em uma parede, deixando vazar umidade,
nas inevitáveis imperfeições de tudo o que é feito pelo Homem, sendo este um
ser eternamente empenhado em tentar imitar Tao, o Impecável. A cor desta obra é
a da menstruação, nas memórias que tenho no colégio, com uma colega minha
“morrendo” de dores de cólica, chorando, tendo que tomar Atroveran Gotas. Esta
gora vai gotejando aos pouquinhos, lentamente, com passinhos de bebê, com muita
paciência, até o ponto longínquo em que o copo está cheio d’água, como uma
galinha, enchendo o papo de grão em grão, numa paciência eterna, como a Paciência
Divina, sempre disposta a perdoar, pois o crescimento depende do perdão. É uma
cor muito recorrente em bandeiras nacionais, no fato de que o Ser Humano, em
seus patriotismos, é universal, e as diferenças culturais são apenas
superficiais e ilusórias, no modo como, por exemplo, a Arte é universal, assim
como o Patriarcado. É a cor da Guerra, da feiura, do ódio e da raiva, na eterna
inclinação humana em subestimar a Paz, pois só há prosperidade em meio à Paz,
nunca em meio à Guerra, sendo esta uma interrupção, um abalo sobre o qual nada
pode ser construído; nada pode prosperar. É a cor da feminilidade, da maçã do
pecado, na misoginia bíblica, culpando uma mulher pelos males da Humanidade,
fazendo da Mulher um mero e grotesco arremedo da obraprima de Deus, que é o
Homem. É a maçã que a bruxa dá a Branca de Neve, na cor da sedução, dos
organismos regados a sangue. É como uma supernova explodindo, numa grande
estrela, como uma Gisele, com a capacidade de ditar uma tendência capilar
mundial que já dura anos e anos. A intenção da Arte é imitar as forças da
Natureza, no modo como o Ser Humano, desde cedo, identifica fenômenos naturais
com deuses, como o Sol, a Lua, os rios, as estrelas etc. E o artista, no fundo,
quer ser isso, quer ser uma força da Natureza, quer abalar estruturas, quer
fazer o chão tremer, e tudo o que o artista não quer é ser ignorado, às vezes
apelando para artifícios, sempre visando obter atenção, na amargura na vida de
um artista que é, desde sempre, ignorado pelo Mundo em geral, numa frustração
triste. É a cor rubra do olho do computador maléfico do filme 2001, fazendo na Inteligência Artificial
um demônio que pouco se importa com a depuração moral da Humanidade, fazendo
metáfora com o psicopata, uma pessoa fria, desalmada e cruel, que debocha de
pessoas moralmente empenhadas. Este rasgo de Lucio Fontana traz um respiro,
como se a obra fosse um ser vivo que precisa respirar para viver, para se
manter no Mundo, no modo como o nervo da Arte é a Vida, pois esta é obra de
Tao, o misterioso, num enigma fácil de ser perguntado e difícil de ser
resolvido – o que faz um coração bater? E é exatamente este mistério o que move
o Ser Humano, seja na Arte, seja na Ciência. O interior aqui é imprevisível,
negro, precisando ser iluminado pelas luzes do Conhecimento, na cor negra dos
confins do Universo – será que existem barreiras delimitando o Universo? E após
essas barreiras, o que existe? Temos que crer no Infinito. A velocidade da Luz
é muito lenta em termos cósmicos, numa vastidão incrível. Aqui, é uma porta
estreita, e só os moralmente honestos podem passar, entrando para a Dimensão
Metafísica, a dimensão do desapego material; do contrário, há Umbral, o lugar
onde vagam os não muito honestos. Tao não faz o Mal – o Mal é um capricho
humano. Ouvimos aqui um mínimo ventinho fluindo pela brecha, no ar que nos une
ao redor da Terra.
Acima, Teatrino. Dois espectadores abraçados assistindo a um filme ou um
espetáculo. A pessoa da direita é maior, talvez o homem, no papel de protetor,
protegendo a pessoa menor e mais fraca, que é a mulher, no modo como a
Sociedade considero belo um casal cujo homem é mais alto do que a companheira,
na relação erótica entre protetor e protegido, como Batman e Robin. A tela aqui
é dourada, muito dourada, no ouro metafísico cornucópico que nos aguarda na
dimensão acima, uma dimensão que não é submetida às intempéries da Natureza. Na
tela, há furinhos em uma fila indiana, como o rastro viscoso deixado por uma
lagarta, como um artista construindo uma carreira, sempre sabendo que não pode
parar de trabalhar, de lutar pela Vida, pois, se parar, sabe que virará peça de
museu – não importa quanto sucesso alguém obtém, pois este alguém sempre tem
que ter a força para virar a página e seguir em frente com a Vida. Aqui, a tela
é uma aurora majestosa, na sedução da Estrela D’Alva, sempre anunciando um novo
dia, na beleza das terras metafísicas, o Reino prometido por Jesus – temos que
ter Fé. Todo o entorno da cena é bem escuro, absolutamente preto, como as
tubulações em banheiros, levando a túneis escuros, no mistério que divide o
Universo entre Físico e Metafísico. A escuridão é a imprevisibilidade da Vida,
sempre nos pregando peças, sempre fazendo brincadeiras, sendo essencial à
pessoa entender o senso de humor de Tao. Esses furinhos são como a trajetória
de um corpo celeste, no modo como os antigos observadores sabiam que certas
estrelas, que hoje sabemos que são planetas, “dançavam” pelo Céu,
diferentemente do restante das estrelas. É como uma parede calejada, que já
recebeu inúmeras obras de Arte penduradas, numa galeria com toda uma história e
uma trajetória, sempre sendo necessário fazer com que a parede seja imaculada,
tentando o Ser Humano entender o que é uma Imaculada Conceição, que é a total
ausência de Matéria, de coisas, de objetos, de joias, de metais etc., no
sentido de que a Vida Material é uma ilusão, uma grande ilusão, grande ao ponto
de seduzir muitos espíritos mundanos e indepurados. Acima na cena, formas que
são como galhos de árvore, no modo como a Natureza vai invadindo a Vida em
Sociedade, no constante trabalho terrestre de varrer ruas e podar plantas,
fazendo com que as Cidades Físicas se pareçam ao máximo com a dimensão acima. E
a aurora permanece majestosa, como se todo o universo fosse pintado de ouro,
fazendo parecer com que o ouro físico seja absolutamente tudo; mas não é. O
Cinema é a capacidade humana em sonhar com um mundo não tão duro como este no
qual estamos encarnados, acorrentados. Como na II Guerra Mundial, época em que
o Cinema tinha a missão de nos fazer esquecer de tantas tristezas, tanta violência
e tanta morte, no modo como os Jogos Olímpicos foram suspensos nos períodos
bélicos, assim como a Festa da Uva de Caxias do Sul foi suspensa durante o
conflito. E os namorados abraçados curtem um momento de interação social,
havendo no casal heterossexual uma inevitável representatividade – Yin e Yang,
os opostos que formam Tao, o perfumado Amor Eterno. Os furinhos são como
capelinhas, e dentro de cada uma há um astro, um artista célebre, ou um
político célebre, no modo humano de culto às celebridades, no modo como Jesus
Cristo foi um grande superstar, o maior da História do Mundo, segundo o
Espiritismo. Os pontilhados são a organização da Vida, com um dia após o outro,
no modo humano de contar o Tempo linearmente, entre passado e futuro, havendo
no Tempo uma ilusão, pois o resto do Universo despreza absolutamente os modos
humanos de contar o Tempo, por meio de rotações e translações que, fora de
nosso sistema solar, nada significam. As cabeças desses namorados são grandes,
no crescimento mental por meio da Arte, havendo nesta a dignidade de nos fazer
humanos. Esta aurora é a de Scarlet O’Hara, tirando força do fundo d’alma para tocar
a Vida para a frente.
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