Falo sobre vários artistas da Pop
Art. As análises semióticas a seguir são minhas e não do livro-base de
Osterwold, minha referência bibliográfica.
Acima, Artist’s
Studio, ou seja, Atelier do Artista,
um óleo sobre tela de Patrick Caulfield, de 1964. Há traços que lembram o
mestre Miró. A simplicidade das formas traz uma certa placidez, como numa sesta
ou siesta, no preguiçoso prazer do descanso
à tarde, após o almoço, deixando que o organismo encarregue-se da digestão, da
assimilação do alimento, nas demandas orgânicas do corpo humano, pois existe em
Portugal um folclore de piadas que colocam o brasileiro como preguiçoso, e
dentro do Brasil são contadas piadas de como os nordestinos são preguiçosos. A
preguiça é um pecado capital e, ainda assim, deliciosa, no prazer da
transgressão, da violação, da rebeldia. Aqui, parecemos estar da Espanha. O
intenso amarelo esquenta a cena, só sendo desafiado por uma delgada faixa roxa
na parte superior, num quadro com quase três metros de comprimento, longo como
uma boa sesta. Um vaso de porcelana está com ricos desenhos vegetais, com
galhos, ramos, folhas e flores dançando em um ritmo sedutor de languidez, como
na canção Lazy Afternoon, ou seja, Tarde Preguiçosa, cantada pro Barbra
Streisand, a qual disse em público que, na maior parte do tempo, deseja ficar
sob uma árvore e simplesmente nada fazer, no dolce far niente italiano, ou seja, um doce em nada fazer, na canção de Rita Lee na qual esta chama o
amante para um banho de banheira sem nada mais a fazer se não falar bobagem. O
vaso é elegante e vazio, assim como o prazer vazio do nada, de Tao. O vaso
lembra uma cerâmica antiga grega, no Sol sedutor da Grécia, numa tarde ociosa.
Ao lado esquerdo do vaso, três prédios retratados com minimalismo, com ligeiros
traços que delineiam seus formatos e suas janelas, pincelados por traços
brancos de paz e placidez, com outros ligeiros traços de outras cores, sendo
que, abaixo dos prédios, vemos uma rua de paralelepípedos, com algumas de suas
pedras sendo mostradas em pinceladinhas retangulares, num artista que diz muito
com pouco a mostrar. No lado direito do vaso, um grande círculo vermelho que,
com um pequeno “cabo” inferior, mostra o formato de um estômago em chamas, com
intensa queimação em suas paredes internas, de quem exagerou na pimenta,
ingrediente básico na culinária mexicana, sendo que este quadro todo também
lembra o México. O “estômago” arde desesperadamente, como arde o coração de uma
pessoa que está fazendo uma bela catarse, limpando-se por dentro e adquirindo
paz interna com tamanha limpeza psíquica. A lado do estômago, dois traços
pretos ondulares iguais, como nas calçadas à beiramar de Ipanema, como ondas do
mar em lindas praias europeias no verão, na sedução mediterrânea de águas
azuis, ou nas casas brancas na Grécia, na sensualidade banhada pelo mar
Mediterrâneo. Junto às “ondas” negras, vemos três pontos pretos ovalares, no
poder da vida que nasce de um ovo, no mistério que o ser humano jamais
resolverá, pois Tao é mistério eterno. Os pontos são como trigêmeos, e servem
para construir referências, dando noções espaciais em um mapa. São como
reticências que foram desmembradas umas das outras, buscando novamente
reencontrar-se e restaurar a ordem do universo. Os pontos são como cabeças
decapitadas na Revolução Francesa, como cabeças são arremessadas por catapultas
no livro O Senhor dos Anéis. Quase
toda a cena aqui é cruzada por um retângulo negro de linhas delgadas,
restringindo o estômago e estabelecendo limites entre os terrenos de dois
cidadãos, no respeito à propriedade privada. No lado direito desta tela, formas
retangulares como cartões de juiz de futebol, tendo um “cartão” negro,
assinalando o humor fúnebre e o período de luto, tendo dois cartões de tons
diferentes de roxo e tendo um pequeno cartão amarelo pastel, da mesma cor do
fundo do vaso de cerâmica, na candura discreta dos tons pastéis. No extremo
inferior direito da tela, uma linha tênue curvilínea que parece ser uma
apressada assinatura, como uma minhoca contorcendo-se abaixo de um tórrido Sol
mexicano. Seria a assinatura de Caulfield? Esta “minhoca” é modesta, e ocupa
uma pequena parcela da tela. Comedida.
Acima, Flag on Orange
Field, ou seja, Bandeira em Campo Laranja,
uma encáustica sobre tela de Jasper Johns, de 1957. Johns ama trabalhar com a
bandeira americana, e este trabalho é um dos muitos do autor com esta bandeira,
num chauvinismo catarteado. O field
citado parece uma plantação de trigo que, com um suave vento, balança
sensualmente em suspiros e murmúrios indecifráveis, porém, agradáveis, como nas
plantações que amanhecem com misteriosas marcas geométricas entranhadas nos
vegetais, atiçando a imaginação dos que creem em alienígenas, como no seriado Arquivo X. O campo parece uma superfície
de madeira que sofreu muitas lesões e danos, como cicatrizes, revelando uma
história e uma trajetória, como dizem que um homem com barriga proeminente é um
homem com história, com uma carreira. Teria um OVNI pousado no campo e
entalhado, como deboche, a bandeira dos EUA? Vasto, o país estadounidense é uma
colcha de retalhos cultural, e cada canto do país tem sua própria cultura
popular, sotaque e características, como ocorre em um país de medidas
continentais como o Brasil. Os campos de Jaspion, digo, Jasper são majestosamente
dourados, como cabelos loiros de uma rainha na colheita, na fartura de um país
de terras tão fartas como os EUA. O campo plácido convida a darmos um cochilo
em suas confortáveis fibras, e, assim, desligamo-nos do mundo ao redor e
mergulhamos nas agradáveis garras do cochilo, anestesiando-nos, varrendo a dor
e o stress para longe. Aqui, a bandeira tem elementos em branco, o que dá um
aspecto limpo, como há pessoas que creem que uma pessoa vestida de branco é o
melhor aspecto que pode existir, numa cor que simboliza a saúde, os médicos, os
enfermeiros, como plácidas nuvens de algodão desfilando lentamente pelo céu. As
listras são como pistas de corrida, na competitividade que permeia o mundo
capitalista, no pensamento liberal, no qual o homem pertence a si mesmo e não a
um estado. Nestas raias de piscina de natação, os concorrentes mergulham n’água
exatamente no mesmo momento e, no desenrolar da prova, podemos ver com clareza
que é o melhor, numa evidência em um mundo que premia os campeões, dando-lhes
metais nobres como prêmio. As listras vermelhas são o sangue de americanos que
se tornaram heróis de guerra, num país bélico, no qual é prioridade a
construção e manutenção de um exército forte, agressivo e temível, na
arrogância das grandes potências, que jogam pesado no jogo global em busca de
controle sobre o globo, como no popular jogo de tabuleiro War, ou seja, Guerra, no
qual os participantes competem por pontos de controle em um mapa mundi, na
ilusão de que o mundo pode ser possuído pela força e pelas pontas de facas.
Aqui, o mapa está traçado sem se preocupar com exatidão de linhas e formas, e a
bandeira é hesitante e incerta, num momento de insegurança, e o fundo azul sob
as estrelas tem pinceladas apressadas, dando um charme ao conjunto, como calças
jeans desbotadas e rasgadas – quem diria que roupas com aspecto usado seriam
moda? As estrelas estão praticamente iguais umas às outras, e sua ordenação dá
a ilusão de ordem em meio ao caos do mundo e da existência – o ser humano gosta
de ter a sensação de ordem, algo levado a cabo por regimes ditatoriais, nos
quais a paz e a quietude são obtidas por meios artificiais, como opressão e
terror, com terroristas que querem simplesmente amedrontar o globo inteiro, na
inevitável inesquecibilidade do Onze de Setembro. A bandeira aqui parece que
foi lavada com um bom sabão em pó, transmitindo a sensação de limpeza e
perfume, no prazer de se vestir uma roupa limpinha ou de se deitar em uma cama
com lençóis suavemente perfumados, como no início do livro espírita Violetas na Janela, no qual a
protagonista Patrícia desperta desencarnada em um confortável cama, uma cama
convidando ao sono e ao sossego. As estrelas ordenadinhas são a esperança dos
astrônomos de um dia poderem catalogar, registrar e batizar todas as inúmeras
galáxias ao redor do universo, as quais, por suas vezes, possuem inúmeras
estrelas compondo essas galáxias. Afinal, como diz o Espiritismo, Deus é o infinito.
Acima, Quote, ou
seja, Citação, um óleo e serigrafia
sobre tela de Robert Rauschenberg, de 1964. JFK exercendo eterno fascínio na
América. A imagem do político está virada, horizontalizada, sem a hierarquia
vertical, e sua gravata negra senta com seus cabelos, e com poucos traços
podemos identificar esta pessoa pública, muito pública, uma das pessoas mais
notórias da História Contemporânea do Mundo. Ao lado do presidente, um círculo
verde, como um sinal que diz siga, na
aprovação que os americanos tinham para com Kennedy. O círculo é como um
planeta Terra coberto de vegetação, sem oceanos nem desertos, num mundo farto,
paradisíaco, perfeito, onde as vicissitudes da vida não entram nem se
expressam. É como um tatu que se recolheu no seu formato de bola, na reclusão
de que as pessoas públicas necessitam, pois ninguém consegue ser público o
tempo todo, necessitando de momentos de privacidade com a família e amigos
próximos. Ao lado do ponto verdejante, como um limão esperando para ser cortado
ao meio e utilizado em uma receita cítrica, vemos uma nuvem bem negra, fechada,
talvez selando o violento destino da morte deste homem público, numa nuvem
negra que traz uma tormenta incrível, fortíssima, como nas nuvens negras que
fecharam no céu durante a crucificação de Jesus Cristo. A nuvem negra é como
uma fumaça de caminhão, numa nuvem de óleo diesel sufocante, poluída,
carregada, envenenando quem se atrever a inalá-la. É como o céu negro da
horrível terra de Mordor de O Senhor dos
Anéis, uma terra que lembra o termo murder,
ou seja, assassinato, como na
premonição de assassinato em O Iluminado. Vemos
dois paraquedistas, gerados pelo mesmo clichê, quiçá xilogravura, saltando de
um avião de guerra e pousando em terras inimigas, arriscando-se a virar
prisioneiros de guerra. Parecem dois astronautas saídos de uma nave redonda,
explorando o espaço na paranoia competitiva da Guerra Fria, quando Capitalismo
e Comunismo brincavam de competir pelo poder global – no fundo, ambos os lados
gostavam de guerrear, no deleite bélico das personalidades agressivas, das
pontas de faca. Os paraquedistas parecem ter nascido de um grande ovo, e são de
uma cor bordô, de um vermelho escuro, num embriagante vinho. Entre eles, um
desenho cúbico, geométrico, matemático, na frieza metódica com a qual os
cientistas fazem avanços, talvez cientistas a serviço de forças governamentais
obcecadas em vencer uma guerra, com essas mesmas forças fazendo de tudo para
surpreender o inimigo e capturá-lo em uma emboscada. Abaixo do cubo, manchas
negras, como sujeira ou petróleo, com forças difíceis de se identificar,
parecendo fachadas de prédios ou algo parecido, numa estranheza recorrente em
obras da Pop Art, pois as experiências estranhas acabam revelando-se as mais
marcantes e interessantes, visto que os artistas odeiam o óbvio. No canto
inferior esquerdo, placas de trânsito, e uma delas diz pare, como se fosse um apelo em nome da paz universal dizendo para
que a Humanidade pare com tantos horrores, sofrimentos e destruições, pois
disse Barrack Obama que um homem é lembrado pelo que construiu; não pelo que
destruiu. Outra placa aponta o caminho de um asilo público, no recanto das
almas solitárias e paupérrimas, cujas vidas estão cheias de vazio existencial,
sem norte, sem sentido, sem vida. As setas dão o sentido, a direção, e ajudam o
indivíduo a evitar a depressão e o desânimo. Ainda outra placa aponta uma via
pela qual só pode se transitar em um sentido, pois Tao não é o melhor caminho;
é o único caminho. Os dizeres one way
rechaçam vias ilusórias secundárias, guiando o indivíduo pela grande avenida una
da existência, na qual outras vias são mentiras e enganações. Acima das placas,
borrões em bordô que mal podem ser identificados ou classificados, obtendo o
simples aspecto de borrão randômico, aleatório, como se estivéssemos observando
nuvens no céu, e cada pessoa enxerga aquilo que quiser enxergar, na liberdade
de pensamento.
Acima, Europe I,
ou seja, Europa I, um óleo sobre tela
de Larry Rivers, de 1956. Uma tela complexa, cheia de elementos mesclados uns
com os outros, com borrões incertos. As pinceladas brancas estão presentes
aqui, assim como pinceladas amareladas. Só que fica difícil identificar com
exatidão o que são estes desenhos tão enigmáticos. No lado esquerdo, algo
parecido com uma TV ou um forno de microondas, ou então um armário, um
criadomudo, num elemento que carrega discretamente o título deste trabalho. Um
pouco acima, algo parecido com um astronauta com um capacete redondo, coletando
informações e enviando-as à Terra por rádio, talvez assediado por uma nave
extraterrestre, nos infindáveis mistérios do Cosmos, uma vastidão absolutamente
além da compreensão humana. O que nos cerca? Quem somos? Para onde vamos e de
onde viemos? Ao lado do astronauta, dois senhores de longas barbas brancas,
como um Charles Darwin, coletando inacabáveis informações sobre todas as formas
de vida sobre a Terra, e talvez um dia catalogando formas de vida alienígena.
Os senhores parecem ser o mesmo, ou gêmeos, lembrando a carismática figura de
Papai Noel, com o apelo típico desta época do ano em todo o Mundo Ocidental,
quiçá em outras partes. O senhor da esquerda veste um elegante terno marrom,
vestido para uma grande ocasião, talvez numa cerimônia de entrega do Prêmio
Nobel. Os senhores são como o personagem velhinho do filme Esqueceram de Mim, no qual o idoso estabelece um relacionamento
como o protagonista Kevin, lembrando que o Natal é época de paz e
(re)conciliação. Uma tarja branca repousa sobre a testa do senhor da direita,
como uma bandeira da paz, nos auspícios da virada do ano, na euforia do Feliz
Ano Novo. Acima dos senhores está um homem de bigode com uma gravata borboleta,
ou algo parecido, e ele está com um olhar tenso e fixo, talvez observando algo
que não o agrada. O homem parece estar ofendido, enfurecido, indignado, assim
como fica o artista malcompreendido. Acima do astronauta há uma mulher totalmente
alva, como uma Virgem Maria intocada pelo mundano, dando a mensagem de
esperança de que algo de melhor nos espera após uma encarnação na Terra – um
lar nos espera; uma vida sem dor nos espera. A mulher pálida esta olhando para
o lado, distraída, interessando-se por algo que não é mostrado na tela. Seu
vestido, também branco como o de uma noiva, tem um recatado decote, revelando
apenas o pescoço, e a mulher veste sobre os ombros uma pele de animal, na
crueldade predatória, tão fora de moda hoje em dia, na era do pensamento
ecológico. Mas o animal aqui não parece estar morto, e parece que fareja o
astronauta, no salto evolutivo que fez de neandertais seres civilizados,
intelectuais, numa sociedade permeada pelo pensamento, pela filosofia
civilizatória. Ao lado da mulher vemos uma face apagada, e sua boca é sequer mostrada,
com olhos discretos, de alguém que não sabe que está sendo retratado em uma
tela da Pop Art. Abaixo dele há uma forma em vermelho, com uma gota de sangue
escorrendo, sujando o quadro com os horrores da guerra, da selvageria da Idade
da Pedra. Até quando o Ser Humano continuará debatendo-se entre paz e guerra?
Na parte inferior da tela, vemos os sapatos do senhor da esquerda ou da
direita, num ambiguidade atroz, como se fossem siameses compartilhando do mesmo
corpo, num inevitável convívio, pois da vida em sociedade é convívio, como no
seriado Chaves, no qual os
personagens têm de aturar as presenças uns dos outros, na comédia das falhas
que existem na vida em
sociedade. O astronauta olha para o céu; já, os senhores
olham para fora da tela, analisando o espectador. Aos pés dos senhores, folhas
negras caídas de uma árvore no outono, como na famosa canção California Dreaming, na qual o
personagem, em um dia invernal com céus cinzentos e folhas escuras, sonha em
estar na Califórnia, num lugar ensolarado e agradável. Será que todos os
personagens neste trabalho de Larry Rivers querem estar em outro lugar?
Acima, Friendship of
America and France (Kennedy and de Gaulle), ou seja, Amizade entre a América e a França (Kennedy e de Gaulle), um óleo
sobre tela de Larry Rivers, de 1961-62. Vemos setorizações, como em
compartimentos mondriânicos. Na parte superior, os dois políticos mencionados
no título desta tela, numa amizade, numa harmonia, numa concordância
diplomática, primando pela paz e pelo entendimento entre as partes – dois
cavalheiros cordatos, civilizados. Duas grandes nações unidas, mesmo que
separadas por um vasto oceano. Por algum motivo desconhecido, este quadro tem a
reprodução de várias carteiras de cigarro, de marcas famosas, como Marlboro e
Camel, na sólida indústria que é a tabagista, sendo americanos e franceses,
unidos pelo vício, dois povos que fumam muito, alimentando um mercado sempre
próspero, um mercado que não se importa com os danos à saúde do tabagista,
apesar dos EUA serem o país que concebeu as restrições públicas ao consumo de
cigarro, como em prédios nos quais é simplesmente proibido fumar, forçando os
fumantes a buscar outros lugares para o hábito, no sentido de que, talvez,
chegará o dia em que o fumante americano só poderá fumar dentro de sua própria
casa, algo contrastante com épocas em que fumar era considerado chique, sexy,
interessante, divertido e saudável, como nas estrelas hollywoodianas dos anos
30 e 40. Aqui, as carteiras de cigarro estão dispostas umas ao lado das outras,
como numa gôndola de supermercado, facilitando o acesso a uma droga que, apesar
de lícita como o álcool, tem lá seus pontos negativos. Mas os fumantes não
parecem se importar, mesmo que nas carteiras de cigarro haja hoje advertências
cada vez mais incisivas. Em quatro carteiras aqui, o capacete do deus Mercúrio
na sua liberdade alada, no sentido de que só fuma quem quer, assumindo para si
as consequências, no livre arbítrio espírita. O capacete vende uma ideia
enganosa de liberdade, pois fumar é ser um prisioneiro, e todo mundo sabe que o
cigarro vicia, tornando-se irresistível ao indivíduo viciado. O capacete dá a
ideia de proteção, mas o cigarro não protege, bem pelo contrário, expõe as
pessoas a doenças consequentes. O capacete dá a ideia de blindagem, mas o
fumante não está blindado, e sim em perigo. O camelo, animal montado e convertido às
vontades humanas, dá a falsa sensação de controle, pois o fumante está fora de
controle. O camelo está pedindo para ser montado e domado, trazendo um apelo
mercadológico marcante, numa das marcas de cigarro mais famosas do mundo. Vemos
uma carteira da marca Lucky Strike, título que remete à palavra sortudo, quando na verdade o fumante não
está com sorte, bem pelo contrário, está no azar do ciclo vicioso. O
aristocrático brasão da marca Marlboro passa a ideia de sofisticação, bom
gosto, classe e sangue azul, como se o fumante estivesse entrando para um
seleto clube, um clube muito fino e diferenciado, mas na verdade o clube dos
fumantes é um grupo de pessoas dependentes. Uma das carteiras de cigarro traz a
palavra end, ou seja, fim, na pertinente mensagem de que o
cigarro torna-se o fim, a finalidade do fumante e, também, torna-se a finitude,
a ruína. Este quadro todo é bem colorido e alegre, no esforço mercadológico para
vender cigarro. Seria uma crítica de Larry Rivers à indústria, aos apelos
publicitários? O cigarro Camel é inspirado nas tradições turcas, nas quais o
tabagismo é milenar, remetendo a um animal do deserto e simbolizando o hábito
turco, no qual o cigarro é normal e corriqueiro. Seria aqui o cigarro um elo de
união entre duas nações ou entre várias nações? Em uma das carteiras, na
extrema esquerda inferior, vemos uma silhueta de mulher de salto alto em meio a
tortuosas fumaças, na associação do tabagismo e charme e sedução – não é Charm
o nome de uma marca famosa de cigarro? Nesta tela há uma variedade de cigarros
à disposição, num mercado desenvolto e abundante, apresentando opções e
seduzindo que já está viciado. Acima do rosto do presidente francês, duas
estrelas, como as da bandeira americana, e essa dupla pode simbolizar a amizade
entre duas estrelas políticas, em duas nações que compreendem o que é
Democracia, apesar de não haver liberdade no ato de fumar. Rivers traz-nos um
paradoxo.
Referência
bibliográfica:
OSTERWOLD,
Tilman. Pop Art. Köln: Taschen, 2007