Eliseu Visconti foi um
importante pintor do Brasil entre os séculos XIX e XX, num traço fino,
sofisticado, de técnica admirável. Os textos e análises semióticas a seguir são
inteiramente meus. Boa leitura!
Acima, Autorretrato. Aqui, o artista tem um olhar incerto, debruçando-se
sobre sua própria existência, e nada mais natural do que a dúvida existencial,
pois ninguém sabe tudo, e a Vida se desdobra de formas misteriosas e um tanto
imprevisíveis. O artista olha de igual para igual nos olhos do espectador, e
convida este a saborear essa dúvida que é tão humana. Sua expressão é
extremamente séria, sem esboçar um mínimo sorriso, num Narciso que se afogou no
próprio reflexo, mergulhando em dúvida, no Narcisismo se revelando uma
cegueira, uma castração mental. É um homem belo, na flor da idade, dedicando
sua juventude ao labor. Tem um corpo belo e torneado, numa roupa de pouco
recato, informal, no modo como um artista se sente em casa dentro de seu
próprio atelier. Seus pincéis pontiagudos se revelam extensões de seus dedos,
como num guitarrista que, de tanto tocar, acaba tendo no instrumento uma extensão
de seu próprio corpo, numa relação de intimidade e proximidade, ao contrário de
pessoas arredias, que têm medo de intimidade, nunca deixando alguém chegar
perto demais. É um escudo que protege um coração frágil. Aqui, temos um
Wolverine, o célebre personagem mutante, que tem garras absolutamente afiadas e
agressivas, num aviso muito nítido: não mexa com Wolverine, o mutante mais
popular do universo de X-Men. Aqui, os pincéis são como espinhos na coroa de
INRI, e os espinhos existenciais, na sua inevitabilidade, revelam-se, testando
a coragem e a força do indivíduo, nesta senhora chamada Vida, que está sempre
com a missão de nos deixar mais humildes, mais com os pés no chão – a Vida é um
exercício de curvatura, e, quem se curva, sobrevive. E Visconti sabe que as
páginas têm que ser viradas, sempre, seja uma página doce, seja uma página
amarga. A camisa de regata é o espírito esportivo, aventureiro, do modo como é
responsabilidade da grande estrela o ato de revolucionar, na missão mais nobre
da Arte – dar a matiz de um tempo, de um momento, no que Tao chama de “mestres
do momento”. O corpo atlético e o espírito trabalhador, elaborador, sempre
praticando e deixando a mente na mais completa forma, colocando os neurônios
para trabalhar, fazendo aquilo que nos faz humanos metafísicos – pensar. Sua
mão é forte e segura os pincéis com força, numa pessoa em total controle sobre
sua própria trajetória, num artista que brilha por si só, sem precisar de
“cadeiras de rodas”, numa prova de independência, num Mundo que está sempre
testando a força dos indivíduos. Sequer vemos fios brancos na barba e no
cabelo, numa imagem de juventude, de desejo fervoroso por fazer Arte e ser
reconhecido por isso, no sentido de que a pessoa mais “calejada” é mais
ponderada, pois sabe dos perigos na “estrada”. É o ímpeto das Juventude. Ao
fundo, vemos um belo dia de Sol com nuvens “de algodão”, e um muro cinza, com
uma cerca rubra, separa o artista do mundo lá fora, no ambiente de paz e
isolamento temporário que deve haver num atelier, num momento em que o artista
tem que se desplugar ao máximo do Mundo, dialogando consigo mesmo no exercício
naturalmente solitário que é o de criação. Na extrema direita, outro braço,
também segurando um pincel espinhoso, mas este braço está mais reservado, retirado
e tímido – é o “estar em casa”, recolhido, nunca querendo se expor
desnecessariamente, na sabedoria tímida das pessoas reservadas, como se estas
soubessem que cruzam um rio caudaloso, de forte correnteza. Do mesmo modo, uma
face de Visconti está iluminada; a outra, na penumbra. São as faces social e
pessoal, num discernimento entre o que pode e o que não pode ser feito dentro
ou fora de casa. É a face escura da Lua, sempre retirada e indecifrável. E
qualquer pessoa, artista ou não, tem que ter momentos de retiro.
Acima, Gioventù. Este quadro seria digno da mostra ultrapolêmica Queermuseum, pois escandalizaria com uma
menina jovem demais para posar nua. Não se trata de uma mulher crescida, com
traços maduros. É como uma fruta verde, jovem demais para ser colhida do pé. Os
olhos da menina são extremamente densos, negros, imprevisíveis, sem espaço para
o branco dos olhos. Seu olhar é um mistério. Seu cabelo encaracolado está preso
elegantemente, numa modelo que se arrumou para posar. Seus seios estão ainda
subdesenvolvidos, dando uma ideia da beleza que irá aflorar quando a menina se
tornar mulher. Da cintura para baixo, a menina veste um véu extremamente fino e
transparente, volátil, delicado como deve ser a Feminilidade. É um tecido fino,
aristocrático, numa moça que aparenta ser de fina estirpe. Será que é de fato?
Uma de suas mãos repousa sobre o próprio colo, tapando o sexo, num Visconti
recatado demais para pintar uma genitália que, provavelmente, sequer pelos
ainda tem. É como uma Vênus de Botticelli tapando o próprio sexo, na
contradição entre recato e provocação, estando um dentro do outro. É um ser
delicado, parecendo ser feito de porcelana, de fina porcelana, sujeito a se
quebrar em qualquer descuido. A menina parece estar por um fio. Outra de suas
mãos brinca com uma mecha do cabelo encaracolado, numa modelo que não parece
direito o que fazer no momento da pose. Sua sensualidade reside nessa
hesitação, nesse recato. Apesar de ser um ser frágil, seu pescoço é forte como
um pilar, e sua pele tem coloração uniforme, com exceção das bochechas coradas,
talvez numa timidez enrubescida, ou num sinal de saúde, de boa disposição, pois
a Saúde é bela. Sua boca está corada, ardente, e esboça um sorriso mínimo e
discreto, e está quase séria, num Visconti atento a detalhes. Seu rosto
simétrico é plácido. Seus dedos são delicados, de uma menina bem cuidada, que
foi criada cheia de privilégios, sem ter que pegar em ferramentas agrárias ou
que lavar e torcer roupa. Não são mãos calejadas. Será que os pais desta menina
autorizaram de fato esta pose nua? A beleza da menina entra em harmonia com a
beleza da cena natural ao redor, com um bosque denso e plácido, cheio de Vida,
e podemos ouvir o canto dos pássaros, com tudo girando ao redor da menina, a
estrela do quadro. Ela está ladeada por vários pássaros brancos, que
representam a Liberdade que um artista tem que ter para criar. São as asas dos
anjos, que representam a liberdade de um espírito que não mais está encarnado,
no desejo de um artista de se libertar e produzir da forma mais pura e
autêntica possível – os artistas sofrem se inseridos em sistemas ditatoriais
opressores censores. Os pássaros são uma espécie de côrte, de séquito, como
damas de companhia da menina, a qual está inserida em um contexto social de privilégio,
tendo para si pessoas que façam grande parte do trabalho – a menina tem casa,
comida e roupa lavada. Difícil imaginar vida mais enfadonha do que vida de
princesa, como uma Grace Kelly, que acabou seus dias fazendo arranjos de flores
secas, sem vida, sem ânimo. Aqui, os olhos negros entram em contraste frente a
uma pele tão branca e delicada. O bosque é de um verde profundo, e é como uma
sofisticada sala de estar, num ambiente acolhedor que nos convida a desfruta do
prazer de sentar e conversar. É uma autêntica e fina sala de estar, espaço para
polidez e delicadeza, sem as agressividades do “mundo lá fora”. Aqui, a
agressividade fica por conta dos bicos das aves, e estão ali para proteger a
menina, como grades em forma de lanças, num contexto em que a Sociedade,
simplesmente, não cobra da Mulher o desenvolvimento da agressividade – esta é
opcional à Mulher, quando, na verdade, todos temos que desenvolver um pequeno
toque agressivo, como dizem os psicólogos.
Acima, Jardim de Luxemburgo. Um claro diálogo com o Impressionismo, e um
certo Eurocentrismo, tendo na Europa o epicentro do Mundo Civilizado. É um belo
dia de Sol, e pessoas elegantes passeiam e curtem esta praça tão bem cuidada e
decorada, numa ideia de como devem ser os lugares metafísicos, onde reina a
Paz. Podemos ouvir o canto de pássaros, e o clept-clept de cavalos conduzindo
carruagens para cá e para lá. As cadeiras e os bancos são o momento de
descanso, de retiro, numa pessoa que, simplesmente, quer curtir a Vida, sem
tanta preocupação em produzir e produzir, mas querendo contemplar, um pouco, o
Mundo ao redor, no olho do artista, que precisa desse momento de contemplação
para, depois, sentar, trabalhar e produzir, e é inadmissível para um artista
não ter momentos de contemplação, como numa mentalidade workaholic, na qual o
indivíduo deve apenas trabalhar – a Vida não tem sentido sem uma certa
“vagabundagem”, como é própria das grandes cidades a predileção por Vida
Cultural, rechaçando a mentalidade do “vá carpir um lote” e rejeitando a ausência
de Vida Intelectual. A mulher em primeiro plano está glamorosa, arrumada,
elegante, com um delicado vestido branco, com luvas combinando com a cor. Seu
chapéu é exuberante e exótico, numa mulher preocupada em não sair em público se
não estiver completamente aprumada, revelando uma personalidade sensível,
artística, no desejo das socialites em se tornar artistas. A mulher repousa sob
uma sombra de árvore, e carrega uma sombrinha ampla. A sombrinha é o retiro, a
pessoa reservada, que se protege ao máximo dos danos que podem causar os sinais
auspiciosos da Vida. O cabo da sombrinha é reto e fálico, numa face racional da
mulher exuberante, no desenvolvimento do pensamento prático, um pensamento tão
importante para o dia a dia. A mulher olha para o espectador e sorri
suavemente, num momento de descanso e prazer, convidando o espectador para se
sentar e conversar, no modo como um artista se torna anfitrião da própria arte,
convidando o espectador a olhar pelos olhos desse mesmo artista, num ato de
compartilhamento e compreensão, e feliz do artista que é bem compreendido. Mais
ao fundo no quadro, vemos altivas estátuas, que representam a austeridade e a
dignidade de grandes pessoas, de grandes mentes, na felicidade que preenche o
coração da pessoa respeitada, na nobreza das mentes que se fizeram compreender,
pois Entendimento é Amor, ou seja, qualquer artista quer ser compreendido,
amado e respeitado – é um grande desafio, quiçá o maior desafio da Vida. A
bolsa da mulher de branco repousa enganchada na cadeira. A bolsa é vermelha, e
representa a feminilidade, na cor rubra do interior uterino, nos mistérios que
trazem Vida ao Mundo, na responsabilidade feminina em gerar a Vida dentro de si
– é uma responsabilidade ritualística, no que é socialmente imposto à Mulher em
geral, como numa recente notícia internacional, que narrou como uma cadelinha
foi forçada, como uma escrava, a ter uma ninhada atrás da outra, para ser ganho
dinheiro na venda de filhotes. Logo atrás, vemos uma mulher de vermelho,
cabisbaixa, sangrando, um tanto triste e deprimida – é a frustração, a
prostração depressiva, numa pessoa que não se sente muito bem compreendida pelo
Mundo. Apesar de também estar aprumada, a mulher rubra está em segundo plano,
ofuscada pela exuberante dona de branco. É a face triste de um artista, que
sente como muito duro o desafio de ser amado pelo Mundo, ao mesmo tempo em que
a busca por popularidade pode degradar a integridade artística do artista – é
um dilema. Um pouco mais ao fundo, vemos um senhor sentado – é a face laboriosa
do trabalho, a pitadinha decisiva de agressividade que deve gotejar sobre a
mente do artista, pois uma mente objetivada, norteada, sofre menos. Aqui, a
mulher rubra sofre um tanto, e pergunta ao senhor o que ela mesma deve fazer
para sair de tamanha fossa existencial. Acima do senhor vemos flores rubras,
gotejando o sangue, o fluido essencial da Vida, tão ambicionado por vampiros
psíquicos, desejando sugar a criatividade de outrem. Uma brisa leve e suave
toma conta do quadro, e podemos sentir em nossas faces tal fluxo brando de ar,
deixando a Arte invadir nossos pulmões psíquicos, e a Arte, então, revela-se
vital como ar, ignorando aqueles que consideram Arte uma frescura evitável.
Aqui, vemos uma cidade vibrante e, ao mesmo tempo, plácida. E a mulher de
branco sente este prazer, convidando-nos a sentar.
Acima, Maternidade. O encanto de ser mãe, mas com vicissitudes, pois já
ouvi de uma mãe: “Dá trabalho, mas vale a pena”. Em um parque praticamente
deserto, a mãe se sente a vontade para amamentar filho, e parece ser um quente
dia de verão ensolarado, pois o menininho está nu da cintura para baixo, numa
forma de querubim, mas sabemos que crianças não são só doçura angelical, pois
um infante dá bastante trabalho com seus choros e demandas. A mãe deixa que o
filho se sirva a vontade, e está calma, sabendo que o Tempo passa lentamente. É
uma cena parisiense, e parece que os franceses não condenam uma mulher que
amamenta em público, algo que, provavelmente, no Brasil daquela época, fosse
considerado vergonhoso. As árvores parecem alfaces, no sentido de nutrição,
alimentação, no modo como um artista se alimenta da própria obra, sempre
buscando inevitáveis referências em outros artistas. A nudez do menino não
choca, pois os franceses lidam de forma muito natural em relação à nudez, numa
cidade que abriga acervos tão maravilhosos de Arte. O pescoço da mãe é forte,
como numa casa forte, que abriga as crianças, poupando estas de tempestades e
de frio. Ela olha zelosa para o filho, e remete-nos ao prazer de “mamar” numa
caixinha de leite condensado, num momento de prazer que é a alimentação. A mãe
dá tudo de si ao filho, como me lembro de uma cachorrinha que tive, a qual,
após parir e começar a aleitar os filhotes, esta cachorrinha começou a ficar
desnutrida, tal a doação de leite que ela fazia para suas crias. Ser mãe é
fazer de tudo pelo filho, visando o bem deste, algo que faz forte metáfora com
o modo como Tao “aleita” seus filhos, como na poderosa imagem da mãe zelosa e
refinada que é Nossa Senhora, em metáforas que buscam fazer com que o Ser
Humano entenda Tao. Aqui, vemos um carrinho de bebê, que é o conforto uterino,
num lugar onde o feto se sente absolutamente em casa, no trauma que é o
nascimento, quando o indivíduo se sente desligado de algo que lhe dava pleno
prazer. As rodinhas do carrinho são a passagem do Tempo, numa criança que,
rapidamente, tornar-se-á adolescente, apesar de uma mãe sempre ver um bebê no
próprio filho, por mais que este filho cresça e amadureça. Podemos ouvir o
farfalhar das folhas nas árvores, numa cena plácida e quieta, na quietude de um
lar onde deve haver silêncio, para não acordar o bebê. Na extrema direita do
quadro, uma filha já mais crescidinha, e esta sente que já não é mais o bebê da
casa, tendo que dar espaço no berço para seu irmãozinho. A menina crescidinha é
o desenvolvimento do siso, do juízo, da responsabilidade, e a menina tem que
ajudar a criar o irmãozinho, tornando-se uma extensão do amor materno. É uma
imposição de tarefa, e é claro que há um pequeno ciúme, tendo a menina
invejando todos os cuidados ao redor do bebê. Sobre uma cadeira simples,
repousa um chapéu – é o retiro, o repouso do lar, num momento de descontração,
como numa família jantando ao redor de uma mesa. É o relaxamento, numa mãe que
precisa relaxar pacientemente até que o leite seque e a mãe precise descansar
de tarefa tão árdua, tarefa que exige tanto da Mulher. A menina brinca com
brinquedinhos, no modo como a criança se desenvolve cognitivamente através das
brincadeiras, do modo como um artista “brinca” em seu próprio atelier, obtendo
prazer no processo de criação, apesar de ser necessário o desenvolvimento de
disciplina. Mais ao fundo, uma estátua num pedestal – é a dignidade austera de
uma mãe, tendo esta desempenhando um papel fundamental na perpetuação da Vida
Humana no Mundo. A sombra projetada pelas árvores é o resguardo, no teto de um
lar, lar este que tem a obrigação de fornecer um ambiente seguro.
Acima, Meu Filho Tobias aos Seis Meses. Um quadro produzido com muito
Amor. O bebezinho está desperto, revirando-se no berço, no modo como um bebê é
absolutamente vulnerável e dependente de cuidados, num ato de completa entrega,
confiando piamente nos pais zelosos. O berço tem lençóis suavemente perfumados,
e podemos ouvir o bebê na sua fala primitiva, tentando se expressar, e podemos
ouvir os inevitáveis choros, que tomam conta de uma casa na qual há bebês.
Trazer um filho ao Mundo é uma responsabilidade enorme, num pai que, “na
marra”, teve que aprender a ser pai. Tobias é adorável, e sua beleza é de um
bebê aristocrático, filho de uma rainha. Seus grandes olhos negros estão bem
abertos, num ser que está começando a observar o Mundo em volta, buscando
crescer e se relacionar com este Mundo, no grande desafio que é uma encarnação
– o bebê deixou para trás suas vidas passadas, e agora começa a encarar uma
nova encarnação, um novo obstáculo a ser vencido com garbo e galhardia. O papai
Visconti cerca Tobias de Amor, visando preparar o filho para essa travessia
complicada que é a Vida. Há uma luz suave sobre o berço, provavelmente uma luz
de velas, e não um raio potente de sol incidindo diretamente sobre Tobias – é a
proteção do Lar, um espaço que visa a máxima proteção e resguardo. Um dos pés
do bebê está calçado; o outro, nu. O pé calçado é a Vida Pública, no indivíduo
saindo vestido de casa para encarar uma jornada de trabalho e uma série de
relacionamentos sociais durante o dia, no aspecto Yang da Vida, na vida na
firma, no trabalho, no atelier, num pai que sai de casa para trabalhar, para
ganhar um salário e sustentar seu lar, na árdua tarefa de um pai que tem a
obrigação de nada deixar faltar dentro de casa, como comida. É o encargo da
Paternidade. Já, o pé descalço de Tobias é o conforto do Lar, da intimidade, de
uma pessoa dentro de casa, absolutamente à vontade, sem se preocupar se está
vestido adequadamente ou se o cabelo está penteado, num momento de descontração
com familiares e amigos íntimos, numa roda de conversa descontraída, bebendo
drinques, falando piadas e rindo. São os dois aspectos da Vida, num teor
binário – dentro de casa; fora de casa. E Tobias está sendo criado para ser
homem feito, maduro, adulto, e dar continuidade no Mundo à Raça Humana,
colocando no Mundo filhos. Temos um Eliseu Visconti que está começando a sentir
toda essa carga de responsabilidade, de obrigação, num homem cuja Vida nunca
mais será a mesma, num ato de transformação irrecuável – um pai será sempre um
pai, por mais que um dia Tobias se torne adultos e dê netos a Eliseu. A
camisolinha de Tobias está recuada, retratando um pequeno ser que ainda não se
deu conta dos preconceitos do Mundo, no modo como a Sociedade, quando o
indivíduo nasce, trata este de forma preconceituosa, pois, se é menino, algo
dele é esperado; se é menina, outra coisa é esperada, na eterna cisão da Humanidade
entre Homens e Mulheres, no pesadelo encarnatório, no qual, nessa prisão, os
Seres Humanos estão constantemente sendo desunidos, algo que contaria Tao, que
é o Pai de todos, de todinhos. Tobias está sendo criado como um reizinho,
cercado de privilégios e mimos. Suas mãozinhas querem agarrar algo, começando a
interagir com o Mundo, num novo desafio, uma nova Vida, com percalços os quais
Tobias jamais encarou anteriormente. Tobias é a grande estrela da cena, e sua
inocência faz com que as crianças tenham muito a ensinar aos adultos, pois
estes já estão “carcomidos” por preconceitos e malícia. Não disse Jesus que o
Reino dos Céus é das criancinhas? Tobias olha para algo, começando a construir
lembranças de infância, (re)descobrindo o Mundo num novo capítulo existencial,
uma nova meta, um novo crescimento. O véu de mosquiteiro visa proteger o bebê,
e os insetos são os risco e perigos, mas um pai tem que entender que, apesar de
ser forte o instinto de querer proteger a criança, esta tem que estar relativamente
livre para experimentar e, consequentemente, crescer. E as crianças
superprotegidas precisam “respirar”.