quarta-feira, 31 de maio de 2017

Quais são as novas, Nova York?




            Uma pessoa de minha família sofreu em Nova York uma gigantesca decepção. O que aconteceu é que esta pessoa, ao acertar os valores na agência de viagens, antes de viajar, foi informado de que poderia comprar ingressos para ver, ao vivo, ninguém menos do que Frank Sinatra. Então esta pessoa chegou em NY cheia de expectativas e, na noite do espetáculo, foi ao teatro da Broadway, e na bilheteria havia um atestado médico exposto, dizendo que o show estava cancelado porque o Sr. Sinatra estava doente a afônico. Mesmo tendo o dinheiro devolvido, esta pessoa de minha família pegou um táxi e voltou ao hotel, indo dormir com esta frustração, na cidade que nunca dorme. Falando em celebridades, uma jornalista brasileira, certa vez em um guia de viagens, disse que uma das coisas mais maravilhosas de NY era ver na rua passeando, sozinha, Jackie Onassis, a qual tem um lago no Central Park que leva o seu nome. Isso se chama respeito – passear tranquilamente e ser, ainda assim, famosona, assim como NY.

            Como neste blog já falei sobre o Metropolitan Museum of Art, o Met, vou dar apenas rápidas pinceladas sobre este, mas já vou avisando: se NY fosse um trem, o Met seria a locomotiva, o nervo, o condutor. O resto da cidade viria engatado atrás. Nada contra os vagões atrás, mas o que move a Big Apple é a fina cultura de um museu cosmopolita e rico, riquíssimo, muito graças aos milionários americanos que fizeram e fazem gordas doações ao museu. Em NY, por favor, vá ao Met. Outra pessoa de minha família disse que o que mais valeu a pena em NY foram o Met e o Central Park.

            NY já foi cenário de tantos, mas tantos filmes, que quem chega lá não se sente em uma terra totalmente estranha. Filmar em NY é caro, e requer, além de autorização da Prefeitura, pagar altas taxas, o que faz com que diretores americanos optem por filmar na cidade americana de Vancouver, a qual tem ruas extremamente fiéis às de NY, tanto que o que é filmado em Vancouver, o expectador jura que foi filmado em NY. É muito mais barato filmar em Vancouver. É claro que a Big Apple tem atrações estritamente turísticas, como passear de charrete pelo Central Park, algo romanceado em tantos filmes. NY segue sendo sedutora, benéfica, cruel, bela, forte. Como diz Madonna em uma música que leva o nome do slogan famoso I Love New York, esta cidade não é para mulherzinhas; ou em uma canção de outra artista, as luzes desta cidade inspirarão você, e não há algo que você NÃO possa fazer lá. NY é coração do Mundo Ocidental, com paixão declarada de gênios como Woody Allen, que usou a cidade em tantos de seus filmes, com inesquecíveis trilhas sonoras, como da célebre obra de Ira Gershwin, que traz identidade cultural a esta ilha bonita. Outras das inúmeras declarações de amor a NY são os seriados Friends, Seinfeld, Sex and the City e Will & Grace.

Todos querem morar em NY. O turista sente-se num filme. Sem falar que é uma cidade de clima diversificado: o verão é o cúmulo de quente e o inverno é o cúmulo de frio, com dias de tanta neve que a Prefeitura tem que orientar os nova-iorquinos a não sair de casa. Ouvi dizer que NY no outono é belíssima, por causa das cores das árvores. Antigamente, as ruas de Caxias do Sul eram adornadas por plátanos, mas foram eliminadas porque, na época, achava-se que os plátanos causavam tuberculose. Hoje, na cidade serrana, só há plátanos em pontos específicos. Uma pena. Em NY, a manutenção do Central Park é terceirizada, e a Prefeitura sabe que o parque tem que ser extremamente bem cuidado, pois é um dos espaços verdes mais famosos do mundo, incrustado em uma frenética selva de pedra, onde reinam oportunidades, sucessos e frustrações. Há de tudo em NY.

            Era fevereiro de 1998, e fui com um amigo. Ao chegarmos de manhã cedo no Aeroporto JFK, diga-se de passagem bem pequenino para ser um aeroporto de NY, esbarrei-me com o frio, depois de uma noite meio mal-dormida no avião, inevitavelmente mal-dormida – não estou reclamando. No controle alfandegário, fui atendido por uma moça bonita que tinha o cabelo igual ao de Courteney Cox em Friends. Como nós, os passageiros, só poderíamos chegar no hotel ao meio-dia, pegamos um ônibus com os viajantes da excursão, e no ônibus começou a tocar, a todo volume, New York, New York, algo interessante se a noite tivesse sido bem-dormida. Well, fizemos um passeio de barca para ver a Estátua da Liberdade e depois fomos a um shopping bem na ponta sul da ilha, com uma inesquecível loja de esculturas em madeira. E, finalmente, chegamos no hotel, um Hollyday Inn muito bom. Na excursão, havia um casal simpático que me chamavam de “Caxias”, pois sabiam que sou de Caxias do Sul. Havia também um rapaz que comprou centenas de CDs nesta viagem.

            Fiz algo de que me arrependi: como eu sabia que seria um clima frio, fui com um par de botinas, compradas especialmente para a viagem. Só que eu não tinha noção de que deve-se bater muita perna por NY, para aproveitar as ruas da cidade. Lá pela quinta quadra, meus pés começaram a doer, e tive que comprar, às pressas, um par de tênis confortáveis. Na loja, eu disse à simpática atendente negra que meus pés doíam, e ela disse I undestand; I’m a woman, ou seja, Eu entendo; sou mulher. Normalmente, os nova-iorquinos são abertos à interação e ao intercâmbio cultural, numa urbe tão heterogênea.

            Para continuar aguentando o frio, fui à tradicional loja de departamentos Macy’s para adquirir um sobretudo, o qual tenho orgulhosamente até hoje, usando-o no auge do inverno serrano gaúcho. Na Macy’s, atendeu-me um rapaz italiano muito polido, que me disse que morava no bairro Village, o mesmo de Friends. O rapaz viu meu sobrenome italiano e perguntou se eu era da Itália. Ainda na loja, vesti o casaco, e, no mesmo estabelecimento, tratei de comprar um cachecol. Em Chinatown, passei por uma linda loja de artigos chineses, e me vidrei num belo par de dragões de porcelana, fantásticos, fortes, estranhos, vibrantes, finos. Então, aconteceu um fato engraçado, pois o atendente, um chinês filho do dono da loja, propôs-me um trambique: ele diria ao pai que me vendeu o par por 120 dólares, mas na verdade o filho embolsaria 20 dólares a mais que eu daria a este “por baixo dos panos”. Que sacanagem com o velho! Na tradicional bookstore Barnes & Noble, adquiri um livro sobre o faraó Aquenáton, um regente que me fascina, o que me remete à deslumbrante sessão egípcia do Met, com suas esculturas perfeitas em granito. Também adquiri um livro na loja de sebo Strand Bookstore. Na giftshop do Met, adquiri dois pôsteres florais e um bloco de cartões postais de temática japonesa. Na famosa loja de brinquedos F.A.O. Schwarz, bem do ladinho do The Plaza Hotel, adquiri um bicho de pelúcia, numa loja de atendentes extremamente corteses. Em outra bookstore, adquiri o livro sagrado do Taoísmo, algo que já mencionei neste mesmo blog, numa postagem sobre Taoísmo. Como já disse neste mesmo blog, comprei também uma caneca do seriado televisivo The Nanny, do qual sou fã, mas depois, em casa, a peça caiu e quebrou – que pena. Também dei-me ao luxo de adquirir um perfume marcante, o Xeryus, de Givenchy. Se algum dia eu voltar a NY, farei menos compras, pois uma cidade é muito mais do que lojas.

            Pessoas de minha família foram a NY no outono, e deve ser uma época boa de se visitar a ilha, sem muito frio nem calor. Uma amiga minha disse que foi no verão, e que o verão nova-iorquino é muito quente, assim como dizem que Buenos Aires é cálida nos meses de verão. E, como eu já disse aqui, o inverno da Big Apple pode ser bem complicado. Quando fui, praticamente não choveu, mas um vento frio e cortante cruzava a ilha.

            Aconteceu algo de que não esquecer-me-ei: meu amigo e eu estávamos caminhando na rua e recebemos panfletos de uma casa tradicional de shows, de cujo nome não lembro, mas achamos desinteressante e jogamos fora os papéis de divulgação, sendo que, só depois, ficamos sabendo que, na noite anunciada, ninguém menos do que Madonna fez um show surpresa, cantando algumas canções do álbum que estava lançando na época, o respeitado Ray of Light, trabalho que até levou um Grammy. Por que eu não fui à casa de shows? Que ódio! Coisas de Manhattan. Falando nisso, mandei um e-mail para Lucas Mendes do programa Manhattan Connection, da Globo News, falando que tomei café da manhã no The Plaza Hotel, o que me custou cerca de 40 dólares, para comer o mesmo sucrilhos que encontro em qualquer lugar do mundo, até no supermercado do ladinho da minha casa, e Lucas concordou comigo. O Plaza é tão pretensioso que a chapelaria custa 3 dólares, contra o preço-padrão de 1 dólar em todas as outras chapelarias da cidade. Na verdade, eu só quis ir ao Plaza por causa do filme Cuidado com as Gêmeas, com Bette Midler e Lily Tomlin, e decepcionei-me ao ver que o interior do saguão, no filme, foi todo construído em set, sendo muito diferente da recepção real do emblemático hotel nova-iorquino.

No MoMA, jamais esquecer-me-ei de estar a poucos centímetros de distância de um trabalho de Salvador Dalí. No Guggenheim, caminhei pela famosa rampa em caracol. Em Little Italy, almocei uma deliciosa pasta ao molho vermelho. Em Chinatown, comemorava-se o Ano Novo Chinês, e vi um cortejo fúnebre passando na rua, mas não tirei fotos em respeito ao falecido. Na Times Square comi uma pizza em um restaurante bem sujinho, bem New York. Num restaurante chinês, comi um delicioso pato ao molho de morango. Fiz uma visita guiada pela tradicional escola de design gráfico Parsons. Fui a diversos night clubs, pois NY é uma cidade de vida noturna intensa e diversificada, com ótimos DJs.

            Conheço uma pessoa que me disse que não curtiu NY. Que pena. A cidade é cheia de brasileiros, tanto residentes quanto turistas. Vi ficar deslumbrado um carioca com um show de artistas de rua. Outro aspecto que me chamou a atenção foi ver tantos turistas japoneses em NY. Falar em artistas, fui ver três shows da Broadway: Titanic, que nada tem a ver com o filme, Miss Saigon, sobre uma inocente e adorável menina em dissonância com um ambiente mundano, e O Fantasma da Ópera, com a célebre cena do lustre caindo “em cima” da plateia. Dizem que Cats e O Rei Leão são fantásticas. Da próxima vez, não verei tantas peças; verei apenas uma – já está bom vendo uma só. Aconteceu algo engraçado quando eu estava na fila para comprar ingresso para a Broadway: eu estava distraído lendo os painéis com os nomes das peças e uma nova-iorquina abordou-me severamente, como se eu estivesse me insinuando para desrespeitar a fila. Eu, hein.

domingo, 28 de maio de 2017

Vida de Publicitário




            É claro que os nomes (de pessoas e instituições) que uso aqui são fictícios, pois meu objetivo é falar sem atingir. Doce ou amarga, cada experiência de vida é válida. O mais frustrante e fascinante da vida é que tudo continua mesma m..., não? O mundo não muda, e isto é bom. O que muda é o modo da pessoa observar o mundo. Isso sim. E como é bom crescer. E encarar o mundo de sempre. É encorajador.

Comecei como estagiário numa agência de design gráfico, a Timeless, que desenhava marcas e embalagens. Foi uma experiência interessante até. Só que eu comecei a ser obrigado a me tornar um faz-tudo na empresa, e comecei a fazer coisas que nada tinham a ver com design. Tinha que inclusive aguentar uma mulher breguinha, esposa de um dos donos da agência Timeless, e essa mulher insistia em dizer que um certo filme era como uma mensagem anti-Brasil por parte dos americanos. Por favor. Um dia, completamente desmotivado a ir trabalhar, liguei e disse que não iria, e fiquei em casa desenhando coisas desvinculadas da Timeless. Num dado momento, mandei todos ali à m..., sem falar que fui sutilmente assediado sexualmente – para bom entendedor, meia palavra basta. E tinha na Timeless uma designer, completamente sem dinheiro, coitada, com uma filha para sustentar, e essa designer ficava dizendo que uma certa lanchonete da cidade era um reduto de burguesia. Que revoltada. Jesus meu. Sem falar que era um ambiente pouco saudável, sem vista pela janela, naqueles prédios, normalmente impessoais, do Centro da cidade. E as pessoas ali não eram muito talentosas. Uma pessoa, aquela que me assediou discretamente, fez um design de marca imitando, sem dó nem piedade, uma marca que já tinha sido lançada no mercado. Isso se chama mediocridade. E eu tinha que ouvir o dia todo as mesmas músicas – nada contra estas, mas que saco ter que ouvir a mesma coisa todo santo dia. Tchau, disse eu a eles. Less Timeless to me, ou seja, menos Timeless para mim.

Aí, fui estagiar na Must, uma empresa que fornecia serviços de alta qualidade a outras empresas. Só que eu não gostava do ambiente. Sentia-me sufocado ali dentro, reprimido, numa energia um tanto preconceituosa. Eu não me sentia ali um criador, uma pessoa criativa. Fazia trabalhos que pouco exigiam de minha inteligência. Eu era burro de carga. Quando eu não mais aguentava, reuni-me com as pessoas da Must e mandei todos, solenemente, à m..., e até hoje eles devem estar chocados com minha atitude. Inclusive uma delas, anos depois, encontrou-se casualmente com uma pessoa de minha família, e perguntou a essa pessoa porque que eu era daquele jeito. Não gostou? Então se ferre, meu amor. Uma pessoa da Must estava embevecida com a perspectiva de ter alguém abaixo de si na hierarquia da empresa e, mesmo depois de mandá-la para o inferno, ela achou que continuava mandando em mim. Risos! Tchau, querida. Continue sendo esta pessoa sem criatividade que você é. Inclusive, ela começou a ficar paranóica, achando que eu queria destroná-la, como se eu quisesse ser ela. Mais risos! Outra pessoa da empresa, a Carla, era muito preconceituosa, e eu me sentia reprimido pelo conservadorismo dela. O ambiente era morto, sem vida, apesar das instalações limpas e confortáveis. Mas nem tudo foram espinhos. Havia uma pessoa na empresa, um sócio, o Leandro, e este era bem fino e elegante, e entendeu porque eu não mais queria trabalhar ali. Sem falar que a hora para o almoço era de apenas uma hora, tudo isso para ganhar uma miséria por mês. Antes só do que mal acompanhado. Tinha também uma secretária, um tanto incompetente, que também era preconceituosa. Realmente, eu não era feliz ali. Goodbye! Bola pra frente.

Então, comecei uma fase importante em minha vida de publicitário – fui trabalhar no Departamento de Criação da Perfect, uma agência de Propaganda. Lá, sofri assédio moral. Falavam de mim pelas costas, e achavam-se em todo e absoluto direito de ligar para a minha casa à meia-noite, por exemplo. Na Perfect, havia uma pessoa certamente bipolar, o Roger, no fundo uma boa pessoa, mas era uma pessoa agressiva que carregava todos consigo em suas crises de péssimo humor. Era uma pessoa que achava que era ético e justificável tratar as pessoas grosseiramente. Outra pessoa, o Breno, achava-se perfeito e imune a erros, logo, se algo dava errado, a responsabilidade era dos outros, e não de Breno. Bem arrogante, era uma pessoa que me dizia para ser humilde, quando o próprio Breno não era muito humilde. Isso se chama hipocrisia. E Breno era “João do passo certo”: só ele sabia a hora certa de fazer piada e só as piadas dele eram engraçadas. Havia outra pessoa, que tinha todo um verniz paladino, mas na verdade era uma pessoa cagona – desculpe o termo. Mas até que fiz coisas válidas que me deram experiência, como material para várias instituições e empresas. Houve na Perfect um episódio infame: Roger, um lindo dia, deu-nos a notícia de que a Perfect acabava de se tornar a agência de uma grande empresa, a God, um cliente que investia bastante em vendas. Só que Roger não revelou-nos os bastidores daquilo, e só fiquei sabendo da história depois de sair da Perfect: Roger topara ser puta pobre, desculpe novamente o termo, pois Roger aceitara ganhar da God um pagamento muito barato, abaixo do ideal e da ética, e Roger fez isso por achar que, sendo a agência da God, seria uma bela vitrine para a Perfect atrair outros clientes, uma atração que acabou nunca acontecendo. Roger, o que você fez se chama falta de amor próprio, praticamente uma ingerência. Essa história antiética da God começou a denegrir o nome da Perfect no meio publicitário. A filosofia de Roger era a seguinte: hoje eu me ferro mas, amanhã, colho os doces frutos. Só que Roger só se ferrava e os tais frutos nunca vinham. Frustração. A Perfect não durou muitos e muitos anos e, para uma pessoa guerreira como Roger ter jogado a toalha, é porque realmente a imperfeita Perfect estava sem condições, sem clientes, sem poder pagar as próprias contas. A Perfect fechou, mesmo Roger tendo dado à Perfect sangue, suor e lágrimas. E eu não tenho pena. Outro episódio mostra a falta de dignidade da Perfect: Roger ofereceu trabalho de cortesia para uma empresa, a The Best, com a seguinte condição: a Perfect daria de graça o trabalho e, em troca, a The Best adotaria a Perfect como sua agência oficial. Só que a The Best aceitou o trabalho, mas nunca passou a ter a Perfect como sua agência. Isso se chama mentira. Outro episódio retrata a falta de dignidade de Roger e da Perfect: uma grande empresa, a Sexy, estava prospectando uma agência, e a Sexy impunha às agências um comportamento altamente antidignidade, quase cruel, e a Perfect embarcou nessa falácia, e, naquele momento, eu comecei a perceber que meu lugar não era na Perfect. Na Perfect, virávamos noites, éramos workaholics, sem folga em sábados, domingos e feriados. Uma vez, Roger ficou 48 horas sem dormir. Era uma escravidão insuportável, um fundo de poço. Na Perfect não havia vida; só trabalho. Era triste. E Roger sabia ser bem agressivo, tenso, no fundo sofrendo com aquela vida. Havia meses em que Roger sequer ganhava algo como pagamento, e isso lhe dava raiva. Sinceramente, ainda bem que a Perfect fechou, pois aquela vida excruciante não estava fazendo bem a Roger, que é uma pessoa bem empreendedora, batalhadora, mas muito kamikaze: Roger era como mergulhar de cabeça numa piscina sem se certificar: 1) De que a piscina tem profundidade o suficiente; 2) De que a piscina está cheia d’água. Essa é a explicação para Roger ter quebrado a cara tantas vezes, fechando a Perfect. Hoje, não sei como Roger está ou de seus projetos. Espero que ele se encontre na vida. Vá em paz! Nobody is perfect, ou seja, ninguém é perfeito. Ressentimentos não guardo, pois ressentimento é como lixo – tem que ser descartado, pois, do contrário, torna-se prejudicial. A vida tem que ser tocada para frente. Por outro lado, na Perfect conheci uma pessoa muito fina e talentosa, a Mara, e ela me mostrou como ter dignidade é importante. Mara desprezava a falta de autorrespeito, principalmente no episódio da Sexy. Uma dama digna. Elegante, Mara era descendente de uma pessoa importante. Classe e respeito andam juntos.

Na faculdade de Publicidade e Propaganda, tive um professor, o Higher Ground, que se achava o maior gênio em toda a História da Propaganda. Higher Ground era tão deselegante que não desgrudava do computador nem na hora de dar aula, e, quando estava um aluno apresentando um trabalho, esse professor arrogante não conseguia tirar os olhos do próprio monitor. Sem falar que Higher Ground usava os alunos para catar ideias para sua própria agência, a Invincible. Isso se chama falta de ética. Outra professora, a Máxima, tinha o lema “Nós não temos horário; temos prazos”, uma filosofia antidignidade a qual experimentei na “maravilhosa” Perfect. Então eu decidi zombar de Máxima, e mandei a ela um e-mail ironizando o referido lema. Máxima não achou o máximo e depois me humilhou, só de vingança. Sua babaca sem senso de humor. Morra. Hehehehe!!!!!

Tive certa vez uma professora muito boa até, que era um medalhão de uma agência toda poderosa, a Hot. Dez em cada dez publicitários queriam trabalhar na Hot, achando-a simplesmente um tesão. Só que a Hot envolveu-se em um escândalo financeiro e acabou fechando as portas. Quem diria que a Hot, um dia, esfriaria. Gigantes caem.

Quase fui trabalhar numa agência, a Precious, mas dei-me conta de que eu ali seria desprezado, maltratado e assediado moralmente, sofrendo humilhação semelhante a um trote universitário. Não sou masoquista, logo, mandei a Precious à m...! E as pessoas daquela agência ficaram fu-ri-o-sas comigo. Bem feito. Em outra agência, a Golden, eu sequer tinha começado a trabalhar e o assédio moral (contra mim) já estava tomando corpo. Mandei a Golden para a morada de Satanás. Outro lance estranho foi com um publicitário que saiu de uma agência e convidou-me para trabalhar com ele, mas eu logo senti que o negócio ali não era muito às claras. Tchau, querido.

A dolorosa verdade é que Propaganda não é arte; é técnica de venda. O publicitário é um vendedor, um sub-artista. As pessoas não assistem TV por causa dos comerciais, mas APESAR dos comerciais. As pessoas folheiam jornais e revistas, acessam internet e ouvem rádio APESAR dos anúncios. As campanhas publicitárias de esmagador sucesso e carisma são exceção de exceção, são raríssimas, como nas inesquecíveis campanhas “Pipoca com Guaraná Antártica” e dos bichinhos de pelúcia do leite Parmalat. Normalmente, a Propaganda é vender, vender e vender, sem muita poesia.

Outro aspecto asqueroso da Propaganda é a prepotência egocêntrica estelar de muitos publicitários, sendo corriqueiramente pessoas que se acham, de fato, muito acima da média. Conheci uma mulher que começou como publicitária em POA e hoje trabalha em uma grande agência, e uma certa vez, quando por acaso nos encontramos em um evento social, ela me disse: Tu tens trinta segundos para me dizer como estás. Por favor. Vá ser arrogante assim lá na Lua. E há outro certo publicitário (muito famoso) que me dá nojo, e sinto vontade de vomitar na cara dele. O ser humano é assim: eu, eu, eu. É a orquestra do egoísmo, como diz o Taoismo.

Goodbye, my friends, go live your lives, ou seja, Adeus, amigos, vivam suas vidas. Da minha parte é isso. Tem que haver evolução mental e aquisição de experiências. Aprendam a lição do autorrespeito. Amar a si mesmo é uma grande, grande lição. No final das contas, fica um gosto de chocolate meio amargo na boca: tem o doce mas tem o amarguinho junto. Sou grato a todas essas pessoas. Muito grato. Querendo ou não, fazem parte de minha caminhada. Meus irmãos, meus iguais, meus cocidadãos. Tchau, queridos.

sexta-feira, 19 de maio de 2017

Ela não é Patricinha




A revista Veja respeita Patricia Pillar; por outro lado, a Veja não gosta de Gloria Pires, nem dos Barreto, nem do PT. Quando O Quatrilho foi indicado ao Oscar, a Veja teve que engolir os Barreto e Pires – é diferente do que gostar. Na referida edição, o veículo paulistano de Comunicação fez uma grande matéria sobre a produção, e uma pessoa, cuja inteligência respeito, disse que a Veja se redimira, pois, meses antes, quando o filme foi lançado no Festival de Cinema de Gramado, a Veja espinafrou o filme, subestimando Fábio Barreto mas, na mesma amarga resenha, elogiando Patricia, dizendo que esta foi a única que entendera que o filme era, na verdade, uma comédia. No tapete vermelho do Oscar, Patricia vestia um discreto Versolato azul-marinho; Gloria, um vestido de estampa de araras. A Veja, então, disse: Desnecessário dizer qual das duas estava realmente elegante. De quem será que a Veja falou mal, meus caros? Outro exemplo do desprezo por Pires foi uma infame capa de Veja na qual, na mesma foto, estavam Gloria, a filha Cleo e o marido daquela, numa capa que expunha, sem dó nem piedade, um escândalo moral, desmoralizando pessoas e fazendo com que maliciosas fofocas virassem apolíneo insumo sério e jornalístico; ainda outro exemplo do desprezo de Veja por GP é a implacável matéria sobre o filme Lula, o Filho do Brasil, dirigido por Fábio Barreto, hoje em coma. É claro que a Veja tinha toda uma predisposição para odiar a película, acusando esta de endeusar o político. Então, aconteceu algo curioso: Gloria Pires tem papel protagonista na trama, interpretando a mãe de Luís Inácio, e, ao colocar na matéria uma foto de Gloria Pires com uma atriz coadjuvante do filme, a Veja, na legenda da imagem, apenas diz: As atrizes do filme. O nome disso é desprezo. Veja disse algo do filme, do tipo: Não vi; não gostei. Conheço pessoas que gostaram e pessoas que não gostaram do filme. O nome disso é controvérsia. É claro que quem odeia o PT já entrou cheio de preconceitos na sala de cinema. Tenho uma grande amiga que é totalmente anti-PT, e quando eu começo a defender o partido, esta amiga diz-me: Gonçalo, não tente me doutrinar. Não entendo este bangue-bangue, esta bipolaridade entre xiita tucano versus xiita petista. Acredito em diálogo.

Well, voltando a Pillar na Veja. Filha de militar, Patricia é uma mulher de coragem. Ao descobrir que estava com câncer de mama, examinando-se no chuveiro – como deve ser feito – , a atriz fez questão de trazer o drama a público para alertar as mulheres sobre esse tipo de câncer. No dia em que Patricia raspou a cabeça para ir ao hospital e iniciar o tratamento de quimioterapia, é claro que a imprensa a assediou, e Pillar apareceu na capa da Veja careca, mas a revista tratou o assunto com respeito. Na capa, PP está séria, porém bela, mesmo sem cabelo. Muitos anos depois, quando Patrícia interpretou uma arrogante baronesa decadente na novela da Globo Lado a Lado, a Veja publicou uma foto da atriz com um majestoso vestido de época da novela, e, na nota, a revista perguntou se Patricia estava namorando alguém. Patricia disse: Não interessa. E a Veja respeitou sua privacidade. Respeito é tudo. Discreta em sua simplicidade como pessoa, Patricia sempre tratou sua própria vida amorosa assim, sem alardes. Teria sido uma maravilhosa primeira-dama se o político Ciro Gomes, com quem namorou uma época, tivesse tornado-se presidente.

Uma personagem muito marcante de PP é Ana do Véu, acho que na novela global de época Sinhá Moça, nos anos 80. Na trama, a mãe de Ana fez uma promessa, a qual obrigou a filha a nunca sair em público sem um véu sobre a face – deve ter sido fácil, pois nessas cenas Patricia não precisava de maquiagem. Well, corria então pela cidade o rumor de que Ana usava um véu porque esta era absolutamente desfigurada, horrorosa, medonha, um verdadeiro diabo de feia, com um rosto que deveria ser a própria imagem do inferno. Então, houve na novela uma cena muito bonita, um baile de gala, com uma luxuriante cascata no salão, e lembro dos cavalheiros batendo ruidosas palmas usando luvas brancas, em toda a suntuosidade do padrão Globo de produção. Então, Ana deveria ser revelada à sociedade no baile. Ana, sob os olhos de todos no salão (e sob os olhos dos telespectadores do Oiapoque ao Chuí), levanta o véu e revela aquela mulher linda, deslumbrante, de beleza arrebatadora. Uma metalinguagem, pois foi o debut de Ana do Véu e o debut de Patricia, ambas apresentadas ao mundo: revelação falando de revelação. A tomada do véu sendo levantado não mostrou o tecido sendo simplesmente erguido, mas uma sucessão de imagens, quase em câmera lenta, como se tivessem sido desvelados vários véus em um.

No filme Zuzu Angel, Patricia faz o papel-título da estilista que teve o filho desaparecido durante a Ditadura Militar. Numa cena catártica, Zuzu diz a um tribunal militar, que a acusava de desacato, que desacato era não ter o direito de enterrar o próprio filho. No pôster do filme, Zuzu está abraçando o filho, numa metáfora, pois guarda o filho como um anjo da guarda, aludindo ao nome “Angel”. Em outra cena, Patrícia mostra uma Zuzu nervosa e cheia de expectativas, durante um desfile de roupas da estilista.

Ao preparar-se para a novela O Rei do Gado, Patricia resolveu fazer um laboratório radical, e foi, anonimamente, viver alguns dias com boias-frias de verdade, trabalhando no campo e comendo a simples comida campesina, revelando-se uma pessoa sem frescuras nem afetações. Patricia disse que, dias depois, todos os boias-frias deram-se conta de quem ela era.

Guerreira que sempre batalhou na carreira, Patricia revelou iniciativa ao fazer um documentário sobre o cantor Waldick Soriano, e disse que a produção foi muito prazerosa, pois Patricia fez tudo aquilo com calma. Fã de um belo papo, Patricia tomou um vinhozinho em uma noite friazinha de filmagem de O Quatrilho, claro que frio para os padrões sensoriais cariocas. Esforçada na arte de Atuação, frequentou laboratórios sobre Teatro na casa da célebre crítica teatral carioca Bárbara Heliodora.

Brasileiríssima, Patricia defende com unhas e dentes o Cinema nacional. Lembro-me de quando eu perguntei a uma criança se esta já tinha visto o filme americano Pocahontas, e Patricia, no mesmo momento, perguntou à mesma criança se esta já tinha visto O Menino Maluquinho, no qual PP interpreta a mãe do personagem central. Patricia defende a tese de que qualidade vem com quantidade, e que o Brasil precisa produzir um filme atrás do outro e, assim, desenvolver uma identidade cinematográfica brasileira. Patricia disse, no televisivo Programa Livre, de Serginho Groisman, que os filmes americanos também são bacanas, mas que o Brasil tem que ter autoestima cultural. E com isso concordava Fábio Barreto, que disse que o Brasil precisa exportar mais imagem, e não só importar. Falando em Fábio, houve uma passagem engraçada: Fábio mandou chamar Patricia ao set, e o motorista foi ao hotel, buscou a estrela, e esta chegou de banho tomado no set, mas, só depois de ter deslocado-se, Fábio chegou à conclusão de que não era necessária a presença de Patricia, e a mandou de volta ao hotel, e Patrícia ficou indignada, furiosa por ter se deslocado por nada, e deu um “xixi” em Fábio! O diretor chegava no set e, dirigindo-se a Patricia, perguntava-lhe: Como vai minha estrela? E Patricia sempre se comportava de forma discreta, mesmo com esse bajulador tratamento especial de estrela – Fábio tratava-a como uma rainha. Outra coisa que irritava Patricia era o assédio desrespeitoso. Estávamos numa van em frente ao hotel prontos para ir ao set, e hóspedes do hotel viram Patricia e começaram a filmá-la sem a autorização da atriz. Então Pillar esbravejou, dizendo: É por isso que eu não gosto de ficar parada aqui – as pessoas nos tratam como atração de circo. Em outro dia, estávamos indo ao set e um policial nos parou na estrada. Então, Fábio desceu da van e disse quem este era. O policial botou a cabeça para dentro da van e cumprimentou Patricia, a qual pareceu não se irritar, ao menos não daquela vez.

Mesmo tão patriota, Patricia adora Nova York, onde viveu por um tempinho, e ama a trilha sonora do filme Harry e Sally – Feitos um para o Outro, que se passa na Big Apple. Eu também amo esse álbum, e o ouço neste exato momento em que redijo. Depois de passar anos sem fumar, Patricia retornou ao hábito tabagista no ano de 1995, e é claro que levou um baque com as recomendações médicas de parar de fumar por causa do câncer de mama que a acometeu.

Paradoxalmente tímida, mesmo sendo todo o gigante midiático que é, Patricia enrubesceu quando o ator Bruno Campo disse estar entusiasmado com a perspectiva de ser amante de Pillar no Cinema. Generosa, Patricia gosta de ajudar as pessoas, como quando marcou uma audiência comigo com o falecido Paulo Ubiratan, poderoso diretor da Rede Globo. Patricia gosta de crianças, e entretinha os infantes no set. O ser humano não é perfeito, e ela esqueceu do texto na cena que filmou comigo. O que mais posso dizer sobre ela? Uma total antiperua, alguém que construiu a si mesma na dureza da vida. Patricia nunca deixará de brilhar. Despretensiosa, ia aos ensaios de dança de O Quatrilho com jeans e uma camiseta com o título da produção, sendo que só momentos depois os figurantes do filme deram-se conta de que aquela era Patricia Pillar no ensaio. Com uma voz linda, canta cristalinamente – que pena que nunca explorou muito esse seu lado musical. Patricia tem olhos cristalinos que revelam uma alma verdadeira, que vive aberta ao mundo. Ela começou como modelo de moda.

Recentemente, Patricia resolveu processar internautas que a insultaram na web. Deixe disso, Patrícia. Deixe passar. Não se estresse. Ignore. A paz é maior do que a raiva. Você é uma grande atriz e ponto final. Let it go. Assim como nós perdoamos a quem nos tenha ofendido.

quarta-feira, 10 de maio de 2017

Além do arroz com feijão




Amigo próximo do príncipe Charles, Rowan Atkinson é o maior palhaço da atualidade. Vi os trejeitos de Mr. Bean, personagem que consagrou Rowan ao redor do mundo, sendo imitados por um palhaço do fascinante Cirque du Soleil, em Porto Alegre. O programa televisivo Mr. Bean começou a carreira na Inglaterra no início dos anos 90, e permanece atual, pois o senso de humor é atemporal. Eu era um adolescente fazendo cursinho pré-vestibular no ano de 1995, e meus amigos já viam que eu adorava Bean, tendo-me imitando as palhaçadas que eu via na TV. Há um amigo de meu pai que também é grande fã de Mr. Bean, e este amigo também imita o personagem, o qual gerou várias temporadas, com Rowan sempre colaborando no roteiro e agindo instintivamente, e a filha pequena de um grande amigo meu também ama Mr. Bean. A música de abertura do seriado significa, em latim, Este é o homem que se chama feijão. Excepcional ator, Atkinson tem maestria evidente, com boa dose de carisma, absolutamente confortável na pele do palhaço. Na vinheta de abertura, Mr. Bean é como um alienígena colocado no mundo por sua nave-mãe. Bean é absolutamente desprovido de charme e sensualidade. Bean impõe o caos com implacabilidade.

Mr. Bean está numa loja de departamentos fazendo compras, e faz questão de mostrar a todos que tem um cartão American Express. Quase morre sufocado pelos perfumes na seção de perfumaria. Abre uma escova de dente para testar, mas na hora de levar a mercadoria, leva uma escova sem ser aberta. Por certa circunstância, fica preso ao bolso traseiro de um homem na loja e vai, involuntariamente ao banheiro com este homem, o qual só nota Bean quando aquele está sentado na privada.

No Natal, Bean subverte um presépio em uma loja, e associa este a outros elementos, como um dinossauro, um robô e um helicóptero que resgata o Menino Jesus de um atentado. Ao testar se as luzinhas de pinheiro estão funcionando, Bean acaba por desligar todas as luzes da loja. Ao passar pela vitrine de uma loja de joias, a namorada de Bean aponta claramente o dedo para a vitrine, desejando um anel, numa vitrine decorada por um display que mostra um homem presenteando uma mulher com um anel. A namorada de Bean vai embora cheia de esperanças, e Bean entende que a moça queria o display, presenteando-a com o mesmo no Natal. Ao receber o display de presente, a namorada começa a chorar desamparada, e Bean tira do próprio bolso uma caixinha de anel. A namorada abre a caixinha cheia de surpresa, e adora o presente. Só que, depois de abrir a caixinha, a namorada dá-se conta de que era apenas um gancho para dependurar o display na parede.

Numa première de gala de estréia de um filme em Londres, Bean trata de se arrumar para a chegada da Rainha na sessão. Ao saudar a monarca, Bean, ao fazer o cumprimento curvando a cabeça, curva-a de mais e acaba nocauteando a Rainha, a qual cai no chão. Felizmente, ninguém nota que o responsável por aquilo era Bean, e este esquiva-se quietinho e deixa a “cena do crime” – os ingleses amam tratar a Rainha com irreverência na mídia.

Na noite da Ano Novo, Bean recebe em sua casa convidados, e os recebe com chapéus de festa, feitos de jornal. Mas Bean, depois de chegar os convidados, nota que não tem vinho para brindar. Então, mistura vinagre com açúcar e serve a bebida, intragável, e os convidados se assustam. Ao servir petiscos, Bean vê que nada tem de petiscos para servir, então abre a janela da cozinha e pega galhos de uma árvore lá fora, cortando os pedaços de galhinhos e cobrindo-os com geleia, servindo então. Os convidados então adiantam o relógio e dizem Feliz Ano Novo, indo embora imediatamente da casa de Bean.

Na piscina pública, Bean quer escorregar pelo escorregador de crianças, mas é tolhido pelo vigia. Bean então sobre num trampolim de vários metros de altura e só se dá conta da altura quando chega no topo. Bean então tem uma verdadeira crise de aerofobia, como num pesadelo, sendo forçado a cair n’água quando um menino pisa-lhe a mão, quando Bean estava simplesmente dependurado na beira do trampolim. Na queda, Bean perde o calção e fica nu. Na saída do estacionamento na piscina, Bean de jeito nenhum quer pagar o estacionamento, e faz de tudo para sair grátis do estacionamento pela chancela eletrônica. Bean aguarda um caro chegar da rua e enfrenta-o, obrigando este a dar ré e deixar Bean sair. Aliás, há um aspecto interessante em Mr. Bean: o misterioso carro azul. Este carro é uma espécie de arquiinimigo de Bean, o qual evita o carro azul incondicionalmente.

No dentista, Bean acaba acidentalmente anestesiando a perna do dentista, fazendo este cair no chão e ser nocauteado pelo próprio equipamento do consultório. Então, Bean resolve ele mesmo tratar da cárie e, ao ver a radiografia de sua própria boca, fica em dúvida sobre qual dente está avariado, e resolve perfurar todos os dentes, para ter certeza. Antes de sentar na cadeira do dentista, na sala de espera, Bean quer tomar das mãos de um menininho um gibi do Batman.

Num hotel, Bean faz um buraco na parede para entrar no banheiro do quarto ao lado. No refeitório, Bean inventa de rivalizar com outro hóspede, e come em dobro tudo o que este hóspede comia. Só que este não come as ostras, e só depois de Bean comer de três a quatro ostras é que o funcionário do hotel percebeu que estavam podres. Bean tem uma baita intoxicação alimentar. Então, enquanto dorme, Bean ouve muito barulho no quarto ao lado, e sai nu de seu quarto par abater na porta do vizinho e pedir silêncio. A porta do quarto de Bean fecha-se sozinha e ele nota que está nu, trancado fora do quarto. Então Bean desfila pelo hotel tapando com placas as partes íntimas, acabando por vestir urgentemente o vestido de gala de uma drag queen, a qual dá-se conta do “roubo”.

Num show mágica, Bean desmoraliza um mágico, revelando os segredos deste, fazendo com que a plateia vaiasse o ilusionista. Na sala ao lado, uma danceteria, a namorada de Bean simpatiza com outro rapaz, e Bean quase mata este. Por fim, ao ver que perdera a namorada, só por vingança, desliga a chave geral e deixa a danceteria no breu.

Ao sair para um piquenique, Bean leva consigo a direção de seu carro, evitando assim roubos. Então, Bean começa a se incomodar com um inseto inconveniente. Num almoço ao ar livre, ao invés de levar um sanduíche pronto, Bean vai a um parque, senta-se no banco e tira de seus bolsos todos os ingredientes: um pão que corta com uma tesoura, sardinhas vivas em um pote de vidro, pimenta, alface etc. Na hora de tomar o chá, coloca o saquinho uma bolsa d’água quente, e, no costume inglês de tomar chá com leite, Bean bebe leite de uma mamadeira e cospe dentro da bolsa.

O episódio da missa é apoteótico. Bean começa a pegar no sono em pleno sermão, e perturba um senhor que está ao seu lado. Bean simplesmente vai ao chão e desperta-se logo em seguida. Ao espirrar, Bean está sem lenço, e limpa-se com a parte interna do bolso do paletó, sempre observado pelo senhor ao lado. Para passar o sono, Bean abre uma bala para chupar, mas acaba colocando-as no bolso com ranho. Escatologia também é quando, em um avião, Bean espalha pela cabine inteira o vômito de um menino a bordo.

Bean também faz uma reforma em seu apê, e a sátira à família real inglesa segue, com Bean cortando as cabeças de Diana, Charles e até da Rainha. Na lavanderia, Bean sofre bullying de uma valentão e vinga-se deste, fazendo com que o valentão colocasse café e não sabão na roupa do autor do bullying. Numa prova de vestibular, Bean acha que não estudou o que caía na prova, e tenta de todas as maneiras colar de um estudante ao seu lado. Bean gosta de rivalizar, e tirar muitas e muitas canetas de seus bolsos, concorrendo com o homem ao lado, que tem apenas uma caneta e um lápis. Em uma tarde educação para adultos em uma escola, Bean explode um laboratório de química e, na aula de desenho, escandalizado com a modelo nua, faz-lhe roupas de argila, material disponível na mesma sala de aula.

De todos os vários episódios de Bean, não gosto apenas de dois: o primeiro mostra Bean num parque de diversões, tendo que cuidar de um bebê que “adotou” involuntariamente; o segundo mostra Bean obcecado em fazer pontos em um parque de minigolf, tocando a bola com o taco pela cidade inteira. Esses dois episódios são exceções – normalmente, amo Mr. Bean. Há dois longas-metragens de Mr Bean. O primeiro é razoável, com Bean estragando, sem querer, uma obra de arte de valor inestimável; segundo é mais sem graça, com Bean viajando pela Europa e causando caos no Festival de Cinema de Cannes. Mas nada se comprara ao grande brilho de Bean na TV. Há ainda um desenho animado de Mr. Bean, mas não sou muito fã. As crianças, quem sabe, devem gostar do desenho.

Um dos apelos ao público infantil é Teddy, o inseparável ursinho de pelúcia de Bean. Ao fazer as malas e ter que cortar alguns itens para que caibam numa mala pequena, Bean quase corta a cabeça ou uma perna do urso, mas desiste e coloca o inestimável amiguinho inteiro na malinha. Quando Bean coloca Teddy numa máquina de lavar, o ursinho encolhe, e aquele, desesperado ao ver Teddy naquele jeito, cutuca o ursinho e este dá sinais de vida, aliviando Bean. No Natal, Teddy ganha um par de olhos, e pela primeira vez consegue ver o dono e a casa onde vive. Ao ler histórias em quadrinhos junto com Teddy, este não consegue ler, e Bean se lembra de colocar os óculos no urso, colocando este para dormir por hipnose, guardando-o cuidadosamente em uma caixa de sapatos em baixo da cama.

Mr. Bean tem um universo tão rico que fica difícil falar de tudo no seriado.

Outro personagem famoso de Rowan é Johnny English, um agente secreto britânico como James Bond, só que Johnny é um anti-herói, bem atrapalhado, fazendo muitas bobagens, como espancar a Rainha da Inglaterra pensando que esta era uma espiã disfarçada. Parece uma versão inglesa do francês Inspetor Clouseau, ou a franquia norteamericana Corra que a Polícia Vem Aí. English mais atrapalha do que ajuda, conseguindo se meter numa cerimônia de coroação, acabando com a coroa da Inglaterra na própria cabeça.

Outro seriado televisivo traz Rowan como um inspetor de polícia, e a trama desenvolve-se muito no convívio entre os colegas de escritório na delegacia – infelizmente não lembro do nome do seriado e nem o do personagem de Atkinson, mas este interpreta um delegado extremamente tradicional e patriota, que fica chocado quando uma colega diz-lhe que Sherlock Homes e Watson eram gays e que moravam juntos como um casal. E o personagem de Rowan diz: Eles apenas conversam e animam o fogo da lareira.

Certa vez vi também pela TV um show de stand up, apenas com Rowan no palco, o qual é satisfatoriamente preenchido como o fazem grandes atores. Em um monólogo, Atkinson é o diabo no inferno, e está coordenando aqueles que foram ao inferno, como os cristãos, pois o diabo diz: Os cristãos estão aqui? Ótimo. Informo que o judeus estavam certos. Em outro monólogo, Rowan é um ator local de pouca importância que recebe um prêmio em nome de um colega ator mais famoso e prestigiado, e o ator rival sobre ao palco dizendo que o colega premiado é bissexual e tem sífilis. O personagem de Rowan também está odiando o fato do colega estar fazendo, no momento, um filme com Meryl Streep. Inclusive, quando o nome do colega é anunciado como vencedor, o ator de Rowan diz um audível Oh, shit, ou seja, Que merda, igualzinho a Samuel L. Jackson no Oscar, quando o nome de outro ator foi anunciado. Deve ser uma delícia assistir a Rowan ao vivo no palco.

Rowan começou a ser conhecido do público quando interpretou um padre iniciante no sucesso cômico Quatro Casamentos e um Funeral – o padre está absolutamente tenso e nervoso, pois está fazendo o seu primeiro casamento. Metalinguagem, pois é iniciante falando de iniciante. A tensão do padre é mostrada com maestria pelo ator. Não parece que estamos vendo um ator; estamos vendo um padre.

Felizmente, há no Youtube muito material de Rowan Atkinson. É só sentar e rir. Na dureza da vida, o senso de humor é fundamental. Abençoado seja o palhaço.