Simpatizante da Medicina e da
Ciência, o Espiritismo é a doutrina do futuro. Não é religião, mas tem livros
do fundador Alan Kardec como base e entra em harmonia com o Cristianismo,
trazendo também o conceito de reencarnação hindu. O ser humano é universal, e o
espírito é, ao mesmo tempo, racional e afetivo: tem yin e yang. Para os
espíritas, é absolutamente ok rezar, como uma “Ave Maria” ou um “Pai Nosso”,
tendo em Jesus Cristo
o espírito mais depurado que já encarnou na Terra. O Espiritismo visa a igualdade:
somos todos irmãos, filhos do mesmo Pai, logo, sobrenomes e dinastias são
desnecessários – a mentira dos orgulhos humanos cai por terra. O espírito não
tem raça, cor, sexo nem classe social. Essa pureza, como a dos andróginos
anjos, reflete-se no pensamento racional, logo, temos que nos preocupar com
assuntos sérios e não com bobagens. É o existencialismo espírita – a vida é
algo sério, apesar de ser necessário ter senso de humor, pois a vida está
repleta de ironias, como na Dialética, que diz que tudo traz em si a sua
própria contradição, como yin e yang contradizem um ao outro.
O termo “que assim seja”, de muita
força, eu ouvi na primeira vez em que entrei num centro espírita, em Caxias do
Sul, chamado “Fora da Caridade Não Há Salvação”, para o qual meu bisavô Luiz
Veronese contribuiu em vida, homem este tornando-se espírita no final de seus
anos. Quando entrei, um senhor muito sério e respeitável me recebeu. Ele me
informou os horários e dias de passe. O passe, para quem não sabe, é um “banho
de luz” que a pessoa recebe no centro. O passe é feito por um espírita, chamado
de médium, que trabalha no centro e tem como objetivo livrar a pessoa “passada”
de pensamentos ruins e negativos, fazendo com que essa mesma pessoa sinta-se
bem e leve e saia feliz do centro. Inclusive, os espíritas recomendam que se
leve uma garrafa de água mineral pois, no momento do passe, os espíritas creem
que essa água fica “fluidificada” e cheia de propriedades curativas, dando as
instruções de tomar um copo dessa água por dia durante sete dias – findado o
período, se sobrar alguma água, recomenda-se que esta seja descartada. Nunca
levei água para ser fluidificada, mas respeito quem o faz. Quem sabe algum dia
eu o faça. O importante é entrar no centro espírita com fé, do contrário, é
melhor nem entrar. A pessoa tem que crer que o médium pode realmente ajudá-la.
O médium leva esse nome porque, creem os espíritas, faz o intermédio entre o
mundo físico e o mundo metafísico, servindo de canal de comunicação entre os encarnados
e os desencarnados. É uma espécie de telefonista. O médium se entende por um
canal, e entrega-se integralmente no momento da sessão mediúnica, ocasião na
qual esse fenômeno de ponte psíquica toma forma.
Dizer “que assim seja” requer muita
força e humildade, e quer dizer que a pessoa tem que aceitar o que Deus
coloca-lhe nas mãos. No primeiro passe que recebi, eu estava sentado, posição
na qual a pessoa recebe o passe, e eu estava com as mãos voltadas para baixo.
Então a médium delicadamente reposicionou minhas mãos para tê-las voltadas para
cima, num gesto de aceitar de braços abertos o momento de amor fraternal que é
o passe. Nesse primeiro passe, não senti muita coisa. No segundo, anos depois,
senti um calorzinho agradável sobre minha cabeça. O centro espírita faz um
trabalho empenhado, primando pelo bem estar daqueles que procuram
direcionamento espiritual – uma pessoa que vai pedir ajuda é uma pessoa que
está passando por um momento difícil.
- Bom, se estás aqui, é porque não
está tudo bem – disse-me uma senhora em minha primeira visita, e disse-me
também:
- Passaste por várias encarnações e
passará por muitas outras.
- Sou simpatizante do taoísmo –
disse-lhe, e ela respondeu:
- Qualquer crença que vise o Bem é
bem-vinda. As crenças nobres e positivas são dedos de uma mesma mão.
Quando disse-lhe meu sobrenome, ela
lembrou de minha falecida avó paterna, e perguntou-me:
- Como vai sua avó?
- Ela faleceu há onze anos –
disse-lhe. É claro que o pensamento espírita não vê grandes problemas na morte,
pois esta é vista pelos adeptos da doutrina como uma simples vírgula, como uma
pessoa que simplesmente se mudou de endereço. Na crença desta senhora espírita,
minha avó está viva, não importando se esta está encarnada ou desencarnada. É a
lógica da vida eterna. Sem vida eterna, que sentido há na existência? E sem
vicissitudes, que sentido há na encarnação? Se é para não enfrentar dificuldade
alguma, é melhor que sequer encarnemos. As dificuldades, os obstáculos causam
inevitável crescimento e depuração ao espírito encarnado. Não tenha medo da
vida!
Se você perguntar a um espírita o
que é Deus, ele dirá:
- Deus é o infinito.
É claro que o ser humano não tem
condições de compreender o que é o infinito. É o poder divino. Imagine que você
nunca, jamais chegará ao fim. Este é o presente de Deus: o espírito é único,
indivisível e eterno – são as leis espíritas. Absolutamente pessoa nenhuma é
igual a você, você não é a metade de um todo e a morte do corpo físico não é o
final. O próprio taoísmo diz isso:
- Se o seu corpo morrer, não há com
o que se preocupar.
O desencarne das pessoas tranquilas
e desapegadas é fácil e rápido. No velório de uma pessoa de minha família,
respirava-se o ar de “missão cumprida”, e essa pessoa estava totalmente certa
de que seu corpo físico morrera e de que uma nova fase em sua vida começara. É
uma pessoa da qual sinto muita saudade. Era uma pessoa carismática, religiosa e
sensível, e seguidamente pessoas me abordam falando dela, como disse-me uma
amiga dela:
- Ela deve dar gargalhadas com as
nossas trapalhadas aqui na Terra!
O Espiritismo diz:
- Você não imagina a que estado ficam reduzidos aqui (na
dimensão metafísica) aqueles que são considerados felizes na Terra (a dimensão
física).
Falando de quem? Dos ricos e poderosos. O poder mundano pode
agrilhoar mentes e almas. Certa vez vi na TV uma igreja antiga, mas não lembro
de onde era. Mas lembro-me muito bem de que havia a parte da igreja para os brancos
ricos e a parte da igreja para o negros escravos paupérrimos. Na parte dos
ricos, havia mil e um arabescos e detalhes decorativos em ouro; na parte dos
escravos, uma parede branca e limpa, sem qualquer adorno ou fru-fru. É claro
que a parte dos escravos era mais interessante, assinalando um desencarne
agradável àqueles que nunca tiveram muito dinheiro e poder na Terra. A
simplicidade é maior do que o excesso. Você pode ter o ouro, mas o importante é
que o ouro não tenha você. Uma pessoa muito apegada ao mundano sofre no desencarne,
e não aceita a própria morte do corpo físico. O taoísmo diz que cada pessoa
precisa, por si só, aprender o que é simplicidade. O famoso espírito Patrícia,
no clássico da literatura espírita brasileira “Violetas na Janela”, entrou em
um quarto e disse:
- Tudo muito bonito, porém simples.
Eu refaria a sentença e diria:
- Tudo muito bonito, pois, simples.
Qualquer bom arquiteto sabe que os projetos mais simples
são os mais elegantes, como na deslumbrante Fundação Iberê Camargo em Porto Alegre.
Na minha primeira visita ao centro
espírita, outra médium conversou comigo, dizendo-me que eu estava com uma
energia meio negativa. Então ela disse-me algo de que nunca esquecerei:
- Nossa vida, desde sempre, vinha
vindo de uma forma mais ou menos estável, ok. Então, em um certo ponto, ela
começa a decair um pouco mas, por um breve momento, conseguimos reerguê-la. Mas
aí a vida começa a cair novamente, fundo como nunca caiu antes, e cai bem lá
embaixo. Então, é preciso que façamos um esforço ENORME para superar essa
vicissitude e contornar esse obstáculo, levando nossas vidas de volta ao nível
de estabilidade. Mas só consegue quem tem vontade.
No final, a médium despediu-se de
mim com dois beijinhos, e vi que os médiuns são pessoas amigas, que visam o
Bem. Pessoas normais.
Na minha segunda visita àquele
centro espírita, uma senhora na recepção disse que eu estava obcecado. Na
linguagem espírita, estar obcecado significa que há um espírito obsessor em
torno de você, e este espírito quer lhe controlar e fazer sofrer. E, realmente,
eu não estava muito bem. Tudo o que você precisa fazer, numa situação dessas, é
ter pensamento positivo, e não pensar em bobagens. Os
espíritos obsessores e mundanos, no desencarne, não admitem este. Logo, vão
para o Umbral – são nosso irmãos, que sofrem. O Umbral é sinônimo de
desconforto, o que os católicos chamam de “inferno”. Para sair do Umbral, o
espírito precisa ser humilde e admitir que precisa de uma ajuda para sair dali.
É como se estivesse esfolado e sangrando, jogado em uma poça de lama. Há sempre
os espíritos bem intencionados, que querem ajudar, mas se um espírito for
arrogante, nunca receberá ajuda. O espírito fica onde quiser ficar – é a lei do
livre arbítrio, algo que é levado a sério em países democráticos como os EUA,
nos ideais da Revolução Francesa: LIBERDADE, IGUALDADE, FRATERNIDADE.
O Espiritismo tem uma vasta
literatura, normalmente com obras psicografadas, ou seja, espíritos
desencarnados que ditam as palavras para médiuns, os quais registram as
palavras no papel, com livros que muitas vezes resultaram em cinema, com filmes
homônimos: em “Nosso Lar”, um espírito mundano sofre no Umbral até ser
resgatado e dar-se conta da seriedade da existência; em “E a Vida Continua”,
uma mulher desencarna e busca adaptar-se à nova vida; em “As Mães de Chico
Xavier”, mães buscam alento pela morte prematura dos filhos. Aliás, é
impossível falar de Espiritismo sem mencionar o célebre médium falecido Chico
Xavier, tido como um dos maiores do mundo, quiçá o maior. Há décadas atrás, a
atriz Gloria Menezes entrevistou o médium, e ela estava extremamente emocionada
com a simples e humilde presença de Chico. Ela perguntou-lhe:
- Chico, por que o mundo é assim?
Por que uns tem tanto e outros tão pouco?
O que Jesus chamava de “Reino dos
Céus” é o complexo de cidades metafísicas que existe ao redor da Terra. São as
cidades espirituais, nas quais tudo funciona perfeitamente. Lá há trabalho,
estudo e diversão. Há vida plena. Sãs as cidades físicas que são cópias
grosseiras das cidades espirituais. Se tiver um desencarne tranquilo, é para o
lugar metafísico que vai a pessoa, reencontrando-se com amigos e parentes
falecidos, dando continuidade à vida, também acompanhando a vida na Terra de
entes queridos que estão encarnados. Para os gregos antigos, por exemplo,
havia, acima do Monte Olimpo físico, um Olimpo superior, metafísico – essa era
a forma do grego de então referir-se a uma cidade espiritual. É claro que essas
cidades não são vistas na dimensão física, pois pertencem a um outro plano.
Morrer é voltar para casa, como na cena final de “O Senhor dos Anéis – O
Retorno do Rei”: um barco conduz os personagens a uma terra linda, de brancas
praias.
Outro aspecto muito forte no
Espiritismo é a hierarquia: os espíritos mais depurados regem os menos evoluídos,
como numa família, em que os irmãos mais velhos ajudam a criar os mais novos. O
sentido da vida é crescer como espírito: a vida não tem sentido sem
dificuldades. Só que essa hierarquia é irresistível; não é forçada nem estupidamente
imposta. Há os arcanjos, ou seja, os espíritos elevadíssimos, que gozam da
felicidade suprema e recebem as ordens diretamente de Deus, de Tao. E a
doutrina espírita também estabelece que ninguém está sozinho: cada encarnado
tem seu próprio anjo da guarda, uma ideia muito reconfortante.
Conheci uma pessoa que se suicidou
recentemente. Certa vez ele se envolveu em um acidente de trânsito que matou as
pessoas que colidiram com o carro no qual ele estava, mas sobreviveu. Não sei
como essa pessoa suicida está agora. Segundo o Espiritismo, há um setor do
Umbral chamado “Vale dos Suicidas”, por onde estes vagam sem noção de tempo e
espaço. Desconstruindo o suicídio, vê-se que este nada mais é do que um
assassinato, com a diferença de que a pessoa não está mais encarnada para ser punida
pelas leis dos homens. O suicídio é uma grande besteira, um desperdício, uma
pessoa que joga na cara de Deus a vida que esta recebeu – é por isso que a
Psicologia, apesar de laica, tem como meta prevenir o suicídio. Airton – nome
fictício – era um rapaz alto e bonito, e adorava perfumes finos. Gostava muito
da vida social e era presença obrigatória em festas e bailes de gala. A vida
profissional dele estava indo bem. Não sei porque ele fez isso consigo mesmo.
Airton querido, você não gostaria de ir a um lugar bonito onde há deliciosos
perfumes para você usar? Claro que gostaria! A cidade espiritual é um lugar
limpo, onde todos andam cheirosos, bonitos e elegantes. Saia do Umbral, Airton!
Aceite ajuda.
Deus não inventa o Mal – este é uma
invenção humana. O Bem é sempre agradável; o Mal, desagradável. Na ilustração desta postagem, uma homenagem
a Patrícia, que depara-se com flores no mundo espiritual.