Há décadas sendo uma grande estrela do Oiapoque ao Chuí,
Xuxa Meneghel, a menina que veio de Santa Rosa, RS, mantém-se na crista da onda
com muito trabalho e dedicação. Além de ser o monstro televisivo que é, Maria
da Graça – nome de batismo – ganha dinheiro com uma franquia de casas de festas
infantis, a Casa X, e uma de clínicas de depilação, com loja até no Shopping
Iguatemi de Caxias do Sul. Xuxa tem uma pontinha de agressividade, e isso,
aliado a seu carisma de candura, tem um efeito explosivo. Eu cresci vendo Xuxa
pela TV. Ela começou com o Clube da Criança na extinta Rede Manchete, e logo
chamou a atenção da Rede Globo. Em um recente documentário sobre o legado de
Roberto Marinho, um dos descendentes de Marinho declarou que, quando Xuxa
entrou em seu gabinete, a apresentadora tem uma aura tão forte que parecia que
havia milhões de holofotes sobre ela. Xuxa atravessa gerações, e meu sobrinho,
quando este era bem criancinha, adorava os DVDs de Meneghel. Eu perguntava para
ele qual DVD ele queria ver, e ele imediatamente dizia: Sussa!.
O empreendedorismo da gaúcha de nascença é agudo, e a
própria Xuxa declarou em entrevista que tem tanto dinheiro que sua família, por
quatro gerações, não precisará trabalhar. Recordo-me de quando eu estava de
viagem pelo Rio de Janeiro com minha família, e no nosso hotel, na mesa do café
da manhã, havia iogurtes da marca Xuxa, com direito a ilustrações de desenhos
da imagem de Xuxa, dando a esta dinheiro também no ramo de alimentação. Xuxa já
lançou também linhas de bonecas, é claro, e lembro-me de minha prima carioca,
que mora no Rio, ter ganhado de Natal uma enorme boneca de Xuxa, num brinquedo de
quase um metro de altura. Isso sem falar das várias incursões pelo cinema, com
bilheterias gordas, consolidando o título que Xuxa recebeu, o de Rainha dos
Baixinhos. Ok, concordo, mas temos que ver que Xuxa é, também, a Rainha do
Marketing, sem querer aqui inclinar-me para o aspecto pejorativo da palavra
marketing, mas temos que observar que Xuxa é mercado e vice-versa. Xuxa tem uma
compreensão inata da mente infantil, e sabe que, para os infantes, uma coisa ou
é do Bem, ou é do Mal. Desse modo, Xuxa encarna valores positivos, iluminados,
benéficos, simpáticos e belos, em contrapartida ao que é de baixo astral,
escuro, amargo, feio e doloroso.
Para as crianças, é tudo festa. Xuxa já declarou com
veemência que ainda tinha dentes de leite na boca, mesmo quando já adulta. Difícil
para os altinhos acreditarem. A Rainha também declarou, de pés juntos, que não
só acreditava em duendes como de fato já havia visto alguns deles. Resta saber
onde. Será que nos jardins de sua mansão no Rio? Como será que os duendes foram
parar ali? Será que eles estavam fugindo de um tiroteio nos morros cariocas? Há
muitos anos, apareceu uma enorme matéria sobre Xuxa na revista Veja, e, em uma
das fotos, a Rainha estava prestes a abocanhar um sanduíche, dizendo ao
jornalista que o segredo era colocar bastante maionese. Pueril, mas Xuxa não é
burra nem retardada mental. É, de fato, bem adulta. No backstage, ou seja, nos bastidores, Xuxa é uma profissional e
ponto. Para os baixinhos, ela é a Rainha. Nada tenho contra Xuxa, a qual busca
incutir nas crianças o conceito de bondade.
Falando em backstage,
numa época, em Porto
Alegre, trabalhei numa agência de Propaganda chamada
Backstage Marketing, e um dos sócios-diretores era o Egon, uma pessoa muito
gente fina e simpática. Egon foi, há muitíssimos anos, paquito da Xuxa. Ele foi
meu colega na PUCRS, no curso de PP, e chegou até trabalhar na RBSTV de Porto
Alegre antes de alçar voo na sua própria agência. Bem-humorado, Egon tinha o divertido
termo puta velha para designar
pessoas que já estão há anos e décadas por aí, trabalhando e batalhando na
inerente dureza da via que é a vida. Nesses dias eu estava vendo uma reprise no
canal Viva do programa Globo de Ouro, da Globo, e lá estava Egon entre os
paquitos no palco. É assim mesmo: todos somos putas velhas. É claro que Egon
adquiriu na Globo um baita know-how sobre Marketing, ainda mais em contato com
alguém como Xuxa. Tudo na vida serve como experiência.
Falando em paquitos, é claro que são inesquecíveis as loiras
paquitas. De todas que foram paquitas, a única que realmente deslanchou foi Letícia
Spiller, que hoje é estrelona. Certa vez no Rio, em 1995, deparei-me com
Spiller, e ela mais tarde trabalharia com Fábio Barreto, que me dirigiu, eu,
que já trabalhei com um ex-paquito. Mundo pequeno de putas bem velhas.
Xuxa rendeu um divertido tributo na extinta Escolinha do
Professor Raimundo, na libidinosa e ninfomaníaca personagem Cacilda, cujo
jargão era Beijinho, beijinho! Pau, pau!,
parodiando o jargão Beijinho, beijinho!
Tchau, tchau! que Xuxa proclamou tantas vezes até tornar-se jargão,
lançando até uma canção com esse título. Na nova versão da Escolinha, Cacilda
permanece no panteão de personagens cômicos do programa. Outra marca registrada
de Xuxa são as marias-chiquinhas, como nos tributos que Xuxa já recebeu de
escolas de samba do Rio, desfilando em uma ocasião na Marquês de Sapucaí com
enormes marias-chiquinhas, num perdoável exagero carnavalesco. Ainda falando em
sátiras, há no Youtube um vídeo hilário do supercomediante Paulo Gustavo, no
qual o ator está devidamente trajado de Xuxa: botas compridas,
marias-chiquinhas loiras, shortinho e o célebre microfone. Então, na sátira,
Xuxa entra em cena dizendo: Este programa
é para você Peter Pan, que não cresceu, que não desapegou dos anos oitenta, que
cresceu jogando videogame. E, o tempo todo, temos um ator anão trajado de
Praga, que era um personagem do Xou da Xuxa que era fantasiado de tartaruga ou
algo que o valha. E Praga, na sátira, está o tempo todo cutucando Xuxa, a qual
se irrita e diz: Eu já te vi, viado!
Paulo Gustavo é show.
Outro tributo foi o de uma banda argentina, em ocasião em
que integrantes da banda estavam no mesmo avião no qual Xuxa viajava. Na letra
da música Con una Rubia en el Avión,
ou seja, Com uma Loira no Avião, o
cantor diz que ficou tão excitando em estar na mesma aeronave da Rainha que
simplesmente não conseguiu dormir. Temos também que assinalar que Xuxa é muito
popular na Argentina, atravessando fronteiras. Mas também não é tão
internacional assim, e todo mundo leva tufos da vida. Em certa época, Xuxa
levou ao pé da letra o termo conquistar o
mundo, e decidiu que queria tornar-se a Rainha dos Baixinhos dos Estados
Unidos da América. Xuxa até tentou emplacar o jargão solte a franga, dizendo drop
the chicken, mas não deu muito certo. Quando o programa na TV Americana
estreou, o canal televisivo só recebeu duas ligações telefônicas de
telespectadores: uma para reclamar do sotaque de Xuxa; a outra, para reclamar
da roupa de Xuxa, numa sensualidade brasileira pouco compreendida nos EUA. Na
mesma época, Xuxa, sob provável estresse, teve um problema de dores na coluna vertebral,
talvez uma somatização de tensão psíquica. Inclusive, quando saiu anunciado em
um jornal americano sobre a estreia de Xuxa na TV ianque, os jornalistas se
atrapalharam e colocaram uma foto da apresentadora Angélica, que sempre foi uma
sub-Xuxa. Na mesma matéria, o jornal ensinava a pronunciação correta do nome da
Rainha: Shoo-sha. Sofrendo essa derrota, Xuxa volta ao Brasil e passa a
compreender que vencer na vida é ter dignidade, não importando se uma estrela é
municipal, estadual, nacional ou mundial – o que importa é qualidade e não
quantidade.
Certa vez, quando a popstar Madonna estava na excelente
fase do álbum Ray of Light, Xuxa foi
entrevistá-la, e as duas identificaram-se uma com a outra, mesmo havendo uma
diferença quantitativa entre as duas. Em um dado momento da entrevista, Xuxa
falava uma palavra e Madonna tinha que dizer a primeira coisa que vinha na
mente. Então, quando Xuxa falou “fama”, Madonna imediatamente falou “prisão”. É
de se compreender. Uma pessoa como Madonna não pode sair tranquilamente na rua;
o mesmo com Xuxa, que fica trancafiada em casa, sempre com medo do que pode
acontecer. Xuxa, dentro do Brasil, simplesmente não pode fazer o que uma pessoa
comum pode fazer, como caminhar no calçadão ou na orla, ou ir a um cinema, ou
sair tranquilamente para jantar em um shopping. Xuxa até chega a sair de casa
dirigindo, mas é claro que, colado atrás, vem um carro cheio de seguranças,
numa cidade como o Rio de Janeiro, onde o risco de assalto e sequestro é alto.
Numa recente edição do Festival de Cinema de Gramado, Xuxa estava no tapete
vermelho e foi falar de perto com os fãs, mas é claro que, logo atrás da
Rainha, ao menos dois seguranças cuidavam tensamente da Rainha, temendo o pior,
como uma facada ou um soco – nunca se sabe. Já, em Nova York, Xuxa tem um
pouco mais de liberdade, apesar de ser uma cidade apinhada de brasileiros. Em
uma foto na imprensa há anos atrás, Xuxa caminhava calmamente pela Big Apple,
sem ser importunada. Então a fama tem dois aspectos: por um lado, Xuxa é privilegiada
como uma princesa; por outro lado, é uma espécie de tolhimento. E Xuxa, em
homenagem, fez um vídeo inspirado em um vídeo de Madonna, numa metalignuagem:
estrelona falando de estrelona.
Xuxa recentemente estreou na TV Record um talk show de entrevistas,
inspirado no bem-sucedido talk show da americana Ellen DeGeneres, e Xuxa até
imita o cabelo loiro curtinho de Ellen. Também no momento, Xuxa lançou uma
fragrância pela empresa Jequiti, de Sílvio Santos, perfume chamado simplesmente
Xuxa Meneghel. Sílvio é um visionário, e enxerga acima de mediocridades: o fato
de Xuxa estar na Record não a impede de estar na Jequiti, pois Xuxa promove o
perfume; o perfume promove o SBT e promove a Record. SS tem uma mentalidade
acima de picuinhas. No VT promocional do perfume, Xuxa está numa paradisíaca
praia, em um filme publicitário impecável, reafirmando o profissionalismo em
torno do produto.
O portão de entrada para o acesso à propriedade de Xuxa no
Rio tem um brasão com as iniciais XM. Xuxa construiu um verdadeiro império,
tendo vindo do nada, assim como Gisele. E Xuxa gosta de promover namorados, e o
fez com Pelé, Senna e Luciano Szafir. Inclusive, no funeral de Senna, Xuxa foi
tratada pela família do falecido como a autêntica viúva do ídolo, o que magoou
Adriane Galisteu, na época namorada de Airton. Já, com Szafir, pai da filha de
Xuxa, o negócio ficou feio, e a família de Luciano chegou a trazer a público o
descontentamento com a postura de Xuxa, que simplesmente parou de se relacionar
com a família do pai de Sasha. Falando em Sasha, Xuxa até tentou alavancar a
filha no showbusiness, mas a menina é jovem ainda e muita bola vai rolar.
Xuxa teve muito tempo de relacionamento profissional com a
superempresária Marlene Mattos. Em entrevista à revista Playboy, Xuxa até
ironizou o fato das pessoas acharem que as duas não só eram lésbicas como
também tinham um caso. Em um dado momento, o “casamento” acabou. Em outra
entrevista, Xuxa conta que tinha uma relação de muita dependência em relação a
Marlene, deixando esta cuidar de assuntos financeiros da própria Xuxa. Outra
polêmica envolvendo a Rainha é o infame filme erótico,e, em entrevista, Xuxa
disse que não tem vergonha e que o mesmo filme foi um trabalho como qualquer
outro.
Todos sabem que Xuxa tem uma voz medíocre, e que quando
pisa num palco, é sempre com playback. Quando a diva americana Sarah Brightman
apresentou-se num programa de Xuxa, esta disse, em tom bem irônico, que as
vozes das duas eram semelhantes em excelência. Mesmo gaúcha de nascença, Xuxa tem um
sotaque carioquérrimo. E nem todas vão tão longe: por exemplo, Mara Maravilha,
que nos anos 80 vinha emergindo como uma espécie de “Xuxa morena”, e que hoje
está bem humilde, apresentando um programa de fofocas no SBT.
Na produção de um filme com Renato Aragão, os dois tinham
que se beijar na boca, e Xuxa caía na risada, nunca conseguindo completar o
beijo na cena. Ainda falando em beijo, Xuxa em outro filme beijou um certo galã
fumante, e quando a imprensa a perguntou como fora o beijo, Xuxa disse que foi como beijar um cinzeiro.
Habituada com tratamento de estrela, é provável que, em
frente a uma poça de água ou lama, um homem tire uma peça de roupa para
permitir que a Rainha passe por cima da poça.
Havia boatos infames, como o de que os discos de Xuxa, se
tocados ai contrário, traziam uma mensagem de Satanás; outro boato dizia que
Xuxa irritava-se com as crianças e as maltratava longe das câmeras. Mas é óbvio
que é tudo mentira, bem pelo contrário, Xuxa ama as crianças, e sempre deu
espaço na TV para crianças com Síndrome de Down e surdo-mudas, divulgando a
linguagem dos sinais.
Por fim, tenho que citar um exemplo de homenagem, na
dublagem brasileira da versão francesa do filme A Gaiola das Loucas. Numa dada cena, um senhor homossexual idoso está
borrifando com água suas flores, cantando o música Doce Mel, grande sucesso de
Xuxa, nos versos: Doce, doce, doce! A
vida é um doce! Vida e mel! No exemplo raro de uma dublagem ser mais
engraçada do que o idioma original.