quarta-feira, 26 de julho de 2017

A Altinha dos Baixinhos




Há décadas sendo uma grande estrela do Oiapoque ao Chuí, Xuxa Meneghel, a menina que veio de Santa Rosa, RS, mantém-se na crista da onda com muito trabalho e dedicação. Além de ser o monstro televisivo que é, Maria da Graça – nome de batismo – ganha dinheiro com uma franquia de casas de festas infantis, a Casa X, e uma de clínicas de depilação, com loja até no Shopping Iguatemi de Caxias do Sul. Xuxa tem uma pontinha de agressividade, e isso, aliado a seu carisma de candura, tem um efeito explosivo. Eu cresci vendo Xuxa pela TV. Ela começou com o Clube da Criança na extinta Rede Manchete, e logo chamou a atenção da Rede Globo. Em um recente documentário sobre o legado de Roberto Marinho, um dos descendentes de Marinho declarou que, quando Xuxa entrou em seu gabinete, a apresentadora tem uma aura tão forte que parecia que havia milhões de holofotes sobre ela. Xuxa atravessa gerações, e meu sobrinho, quando este era bem criancinha, adorava os DVDs de Meneghel. Eu perguntava para ele qual DVD ele queria ver, e ele imediatamente dizia: Sussa!.

O empreendedorismo da gaúcha de nascença é agudo, e a própria Xuxa declarou em entrevista que tem tanto dinheiro que sua família, por quatro gerações, não precisará trabalhar. Recordo-me de quando eu estava de viagem pelo Rio de Janeiro com minha família, e no nosso hotel, na mesa do café da manhã, havia iogurtes da marca Xuxa, com direito a ilustrações de desenhos da imagem de Xuxa, dando a esta dinheiro também no ramo de alimentação. Xuxa já lançou também linhas de bonecas, é claro, e lembro-me de minha prima carioca, que mora no Rio, ter ganhado de Natal uma enorme boneca de Xuxa, num brinquedo de quase um metro de altura. Isso sem falar das várias incursões pelo cinema, com bilheterias gordas, consolidando o título que Xuxa recebeu, o de Rainha dos Baixinhos. Ok, concordo, mas temos que ver que Xuxa é, também, a Rainha do Marketing, sem querer aqui inclinar-me para o aspecto pejorativo da palavra marketing, mas temos que observar que Xuxa é mercado e vice-versa. Xuxa tem uma compreensão inata da mente infantil, e sabe que, para os infantes, uma coisa ou é do Bem, ou é do Mal. Desse modo, Xuxa encarna valores positivos, iluminados, benéficos, simpáticos e belos, em contrapartida ao que é de baixo astral, escuro, amargo, feio e doloroso.

Para as crianças, é tudo festa. Xuxa já declarou com veemência que ainda tinha dentes de leite na boca, mesmo quando já adulta. Difícil para os altinhos acreditarem. A Rainha também declarou, de pés juntos, que não só acreditava em duendes como de fato já havia visto alguns deles. Resta saber onde. Será que nos jardins de sua mansão no Rio? Como será que os duendes foram parar ali? Será que eles estavam fugindo de um tiroteio nos morros cariocas? Há muitos anos, apareceu uma enorme matéria sobre Xuxa na revista Veja, e, em uma das fotos, a Rainha estava prestes a abocanhar um sanduíche, dizendo ao jornalista que o segredo era colocar bastante maionese. Pueril, mas Xuxa não é burra nem retardada mental. É, de fato, bem adulta. No backstage, ou seja, nos bastidores, Xuxa é uma profissional e ponto. Para os baixinhos, ela é a Rainha. Nada tenho contra Xuxa, a qual busca incutir nas crianças o conceito de bondade.

Falando em backstage, numa época, em Porto Alegre, trabalhei numa agência de Propaganda chamada Backstage Marketing, e um dos sócios-diretores era o Egon, uma pessoa muito gente fina e simpática. Egon foi, há muitíssimos anos, paquito da Xuxa. Ele foi meu colega na PUCRS, no curso de PP, e chegou até trabalhar na RBSTV de Porto Alegre antes de alçar voo na sua própria agência. Bem-humorado, Egon tinha o divertido termo puta velha para designar pessoas que já estão há anos e décadas por aí, trabalhando e batalhando na inerente dureza da via que é a vida. Nesses dias eu estava vendo uma reprise no canal Viva do programa Globo de Ouro, da Globo, e lá estava Egon entre os paquitos no palco. É assim mesmo: todos somos putas velhas. É claro que Egon adquiriu na Globo um baita know-how sobre Marketing, ainda mais em contato com alguém como Xuxa. Tudo na vida serve como experiência.

Falando em paquitos, é claro que são inesquecíveis as loiras paquitas. De todas que foram paquitas, a única que realmente deslanchou foi Letícia Spiller, que hoje é estrelona. Certa vez no Rio, em 1995, deparei-me com Spiller, e ela mais tarde trabalharia com Fábio Barreto, que me dirigiu, eu, que já trabalhei com um ex-paquito. Mundo pequeno de putas bem velhas.

Xuxa rendeu um divertido tributo na extinta Escolinha do Professor Raimundo, na libidinosa e ninfomaníaca personagem Cacilda, cujo jargão era Beijinho, beijinho! Pau, pau!, parodiando o jargão Beijinho, beijinho! Tchau, tchau! que Xuxa proclamou tantas vezes até tornar-se jargão, lançando até uma canção com esse título. Na nova versão da Escolinha, Cacilda permanece no panteão de personagens cômicos do programa. Outra marca registrada de Xuxa são as marias-chiquinhas, como nos tributos que Xuxa já recebeu de escolas de samba do Rio, desfilando em uma ocasião na Marquês de Sapucaí com enormes marias-chiquinhas, num perdoável exagero carnavalesco. Ainda falando em sátiras, há no Youtube um vídeo hilário do supercomediante Paulo Gustavo, no qual o ator está devidamente trajado de Xuxa: botas compridas, marias-chiquinhas loiras, shortinho e o célebre microfone. Então, na sátira, Xuxa entra em cena dizendo: Este programa é para você Peter Pan, que não cresceu, que não desapegou dos anos oitenta, que cresceu jogando videogame. E, o tempo todo, temos um ator anão trajado de Praga, que era um personagem do Xou da Xuxa que era fantasiado de tartaruga ou algo que o valha. E Praga, na sátira, está o tempo todo cutucando Xuxa, a qual se irrita e diz: Eu já te vi, viado! Paulo Gustavo é show.

Outro tributo foi o de uma banda argentina, em ocasião em que integrantes da banda estavam no mesmo avião no qual Xuxa viajava. Na letra da música Con una Rubia en el Avión, ou seja, Com uma Loira no Avião, o cantor diz que ficou tão excitando em estar na mesma aeronave da Rainha que simplesmente não conseguiu dormir. Temos também que assinalar que Xuxa é muito popular na Argentina, atravessando fronteiras. Mas também não é tão internacional assim, e todo mundo leva tufos da vida. Em certa época, Xuxa levou ao pé da letra o termo conquistar o mundo, e decidiu que queria tornar-se a Rainha dos Baixinhos dos Estados Unidos da América. Xuxa até tentou emplacar o jargão solte a franga, dizendo drop the chicken, mas não deu muito certo. Quando o programa na TV Americana estreou, o canal televisivo só recebeu duas ligações telefônicas de telespectadores: uma para reclamar do sotaque de Xuxa; a outra, para reclamar da roupa de Xuxa, numa sensualidade brasileira pouco compreendida nos EUA. Na mesma época, Xuxa, sob provável estresse, teve um problema de dores na coluna vertebral, talvez uma somatização de tensão psíquica. Inclusive, quando saiu anunciado em um jornal americano sobre a estreia de Xuxa na TV ianque, os jornalistas se atrapalharam e colocaram uma foto da apresentadora Angélica, que sempre foi uma sub-Xuxa. Na mesma matéria, o jornal ensinava a pronunciação correta do nome da Rainha: Shoo-sha. Sofrendo essa derrota, Xuxa volta ao Brasil e passa a compreender que vencer na vida é ter dignidade, não importando se uma estrela é municipal, estadual, nacional ou mundial – o que importa é qualidade e não quantidade.

Certa vez, quando a popstar Madonna estava na excelente fase do álbum Ray of Light, Xuxa foi entrevistá-la, e as duas identificaram-se uma com a outra, mesmo havendo uma diferença quantitativa entre as duas. Em um dado momento da entrevista, Xuxa falava uma palavra e Madonna tinha que dizer a primeira coisa que vinha na mente. Então, quando Xuxa falou “fama”, Madonna imediatamente falou “prisão”. É de se compreender. Uma pessoa como Madonna não pode sair tranquilamente na rua; o mesmo com Xuxa, que fica trancafiada em casa, sempre com medo do que pode acontecer. Xuxa, dentro do Brasil, simplesmente não pode fazer o que uma pessoa comum pode fazer, como caminhar no calçadão ou na orla, ou ir a um cinema, ou sair tranquilamente para jantar em um shopping. Xuxa até chega a sair de casa dirigindo, mas é claro que, colado atrás, vem um carro cheio de seguranças, numa cidade como o Rio de Janeiro, onde o risco de assalto e sequestro é alto. Numa recente edição do Festival de Cinema de Gramado, Xuxa estava no tapete vermelho e foi falar de perto com os fãs, mas é claro que, logo atrás da Rainha, ao menos dois seguranças cuidavam tensamente da Rainha, temendo o pior, como uma facada ou um soco – nunca se sabe. Já, em Nova York, Xuxa tem um pouco mais de liberdade, apesar de ser uma cidade apinhada de brasileiros. Em uma foto na imprensa há anos atrás, Xuxa caminhava calmamente pela Big Apple, sem ser importunada. Então a fama tem dois aspectos: por um lado, Xuxa é privilegiada como uma princesa; por outro lado, é uma espécie de tolhimento. E Xuxa, em homenagem, fez um vídeo inspirado em um vídeo de Madonna, numa metalignuagem: estrelona falando de estrelona.

Xuxa recentemente estreou na TV Record um talk show de entrevistas, inspirado no bem-sucedido talk show da americana Ellen DeGeneres, e Xuxa até imita o cabelo loiro curtinho de Ellen. Também no momento, Xuxa lançou uma fragrância pela empresa Jequiti, de Sílvio Santos, perfume chamado simplesmente Xuxa Meneghel. Sílvio é um visionário, e enxerga acima de mediocridades: o fato de Xuxa estar na Record não a impede de estar na Jequiti, pois Xuxa promove o perfume; o perfume promove o SBT e promove a Record. SS tem uma mentalidade acima de picuinhas. No VT promocional do perfume, Xuxa está numa paradisíaca praia, em um filme publicitário impecável, reafirmando o profissionalismo em torno do produto.

O portão de entrada para o acesso à propriedade de Xuxa no Rio tem um brasão com as iniciais XM. Xuxa construiu um verdadeiro império, tendo vindo do nada, assim como Gisele. E Xuxa gosta de promover namorados, e o fez com Pelé, Senna e Luciano Szafir. Inclusive, no funeral de Senna, Xuxa foi tratada pela família do falecido como a autêntica viúva do ídolo, o que magoou Adriane Galisteu, na época namorada de Airton. Já, com Szafir, pai da filha de Xuxa, o negócio ficou feio, e a família de Luciano chegou a trazer a público o descontentamento com a postura de Xuxa, que simplesmente parou de se relacionar com a família do pai de Sasha. Falando em Sasha, Xuxa até tentou alavancar a filha no showbusiness, mas a menina é jovem ainda e muita bola vai rolar.

Xuxa teve muito tempo de relacionamento profissional com a superempresária Marlene Mattos. Em entrevista à revista Playboy, Xuxa até ironizou o fato das pessoas acharem que as duas não só eram lésbicas como também tinham um caso. Em um dado momento, o “casamento” acabou. Em outra entrevista, Xuxa conta que tinha uma relação de muita dependência em relação a Marlene, deixando esta cuidar de assuntos financeiros da própria Xuxa. Outra polêmica envolvendo a Rainha é o infame filme erótico,e, em entrevista, Xuxa disse que não tem vergonha e que o mesmo filme foi um trabalho como qualquer outro.

Todos sabem que Xuxa tem uma voz medíocre, e que quando pisa num palco, é sempre com playback. Quando a diva americana Sarah Brightman apresentou-se num programa de Xuxa, esta disse, em tom bem irônico, que as vozes das duas eram semelhantes em excelência. Mesmo gaúcha de nascença, Xuxa tem um sotaque carioquérrimo. E nem todas vão tão longe: por exemplo, Mara Maravilha, que nos anos 80 vinha emergindo como uma espécie de “Xuxa morena”, e que hoje está bem humilde, apresentando um programa de fofocas no SBT.

Na produção de um filme com Renato Aragão, os dois tinham que se beijar na boca, e Xuxa caía na risada, nunca conseguindo completar o beijo na cena. Ainda falando em beijo, Xuxa em outro filme beijou um certo galã fumante, e quando a imprensa a perguntou como fora o beijo, Xuxa disse que foi como beijar um cinzeiro.

Habituada com tratamento de estrela, é provável que, em frente a uma poça de água ou lama, um homem tire uma peça de roupa para permitir que a Rainha passe por cima da poça.

Havia boatos infames, como o de que os discos de Xuxa, se tocados ai contrário, traziam uma mensagem de Satanás; outro boato dizia que Xuxa irritava-se com as crianças e as maltratava longe das câmeras. Mas é óbvio que é tudo mentira, bem pelo contrário, Xuxa ama as crianças, e sempre deu espaço na TV para crianças com Síndrome de Down e surdo-mudas, divulgando a linguagem dos sinais.

Por fim, tenho que citar um exemplo de homenagem, na dublagem brasileira da versão francesa do filme A Gaiola das Loucas. Numa dada cena, um senhor homossexual idoso está borrifando com água suas flores, cantando o música Doce Mel, grande sucesso de Xuxa, nos versos: Doce, doce, doce! A vida é um doce! Vida e mel! No exemplo raro de uma dublagem ser mais engraçada do que o idioma original.

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Tempere a Vida




            Não sei quanto a vocês, mas fico extremamente entretido ao ver os outros cozinhar. Esses programas são um deleite, mas confesso que não sou um ás na cozinha. Faço uma massa, um guisado, um pastel, uma pizza, um sanduíche, uma torrada e era isso! Minha falecida avó materna era um talento na cozinha, e foi pela vó que conheci o bife de peito de frango, o qual apelidei carinhosamente de Bife da Vó. Minha mãe também cozinha muito bem, e faz delícias as quais não sei fazer, como risoto, frango à xadrez, estrogonofe,  pastelão de frango e muitos outros pratos, nas lembranças de minha irmã e eu chegando ao meio-dia do colégio, famintos, e esbaldávamos em pratos simples e deliciosos, como um bom feijão preto muito bem feito, bolo de carne, milho refogado e um arroz soltinho muito competente. É uma lembrança de minha infância minha mãe martelando os bifes para amaciá-los, e dos bifes à milanesa sendo passados no ovo antes de serem passados na farinha. Cresci também acostumado com os churrascos que meu pai assava e de como minha mãe gostava de assar uma cebola no espeto. Cresci acostumado com a comida da minha mãe, e ela nunca usava alho, portanto, até hoje eu não curto alho, mas sou fã de cebola.

Certa vez, o poderoso Boni da Rede Globo foi entrevistado, e a ele perguntaram o que o mesmo considerava comida boa. Ao vermos uma pessoa rica como Boni, imaginamos que ele diga que comida boa é no restaurante X carésimo de Paris. E não. Boni disse que comida boa é comida simples, só que bem feita. Achei o Boni de uma simplicidade incrível. Por exemplo: salmão. O salmão eu até gosto cru, no famoso sashimi japonês. Mas quem cozinha o salmão tem que saber o ponto certo, até o peixe ficar cozidinho, mas ainda tenro, pois o salmão cozido demais fica insuportável: duro, borrachudo e sem gosto.

            Nem tudo são flores, e os erros são inevitáveis. Esses chefs de TV, por exemplo, testam a receita antes de trazê-las ao programa. Há chefs que até chegam a testar a receita de duas a três vezes, tal a preocupação em não errar. Nunca ouvimos falar que é errando que se aprende? Eu fui fritar um arroz antes de cozinhá-lo, só que o fiz em uma panela de fundo fininho, e acabou não dando certo. Hoje aprendi que arroz tem que fritar em panelas de fundo mais grosso. Em outra ocasião, há décadas, eu estava na casa de minhas queridas amigas Deneia e Denise, e estávamos fazendo pão-de-queijo. A mim foi delegada a tarefa de salgar a massa, só que pus sal demais, e a receita acabou arruinada. Esses tempos, quando encontrei Deneia na rua, ela brincou e disse-me que eu estava devendo para ela um pão-de-queijo! Em outra ocasião, fui fazer um negrinho de panela na cozinha de minha mãe, e peguei a primeira colher de pau que encontrei na gaveta. Só que eu, na minha ignorância, não sabia que a colher de refogar cebola era apenas para refogar cebola. Então, fiz o negrinho com a colher de cebola e o negrinho acabou saindo com sabor de cebola! Ficou horrível! Ainda falando em cozinha, certa vez meus vizinhos esqueceram a panela de pressão ligada, e é claro que ela estourou, numa explosão tão forte que a mesa de inox do fogão ficou achatada! Também dei uma mancada ao fazer um risoto de aspargos, pois eu não sabia que a água do aspargo em conserva tem que ser usada no preparo dos pratos. Portanto, meu risoto ficou sem gosto! Uma pessoa de minha família, em sua infância, botou para ferver uma lata de leite condensado para fazer doce-de-leite, só que esqueceu a lata no fogo, e a lata explodiu e espalhou doce de leite pela cozinha inteira! Outra “tragédia” foi quando eu estava em um restaurante em Porto Alegre com um querido amigo meu, num buffet a quilo. Eu estava com o prato cheio na bandeja e um copo cheio de Sukita. Então, esse meu amigo, acidentalmente, esbarrou em mim e derrubou toda a Sukita sobre meu prato, e acabei almoçando uma comida sabor Sukita. Em outra ocasião, num buffet com uma bela travessa de camarões, vi uma menininha de cerca de oito anos de idade espirrando bem em cima dos camarões – ainda bem que eu vi antes de me servir. Outra passagem foi quando uma pessoa de minha família, distraidamente, adicionou pequenas uvas passas pretas ao feijão preto, e o feijão saiu sabor uva passa. Ainda falando de tragédias na cozinha, no filme O Diário de Bridget Jones, a personagem central está preparando um jantar para amigos, e tem que amarrar certos ingredientes com um barbante, só que o barbante em questão era azul, e a coloração acabou tomando conta de toda a receita.

            Tenho que narrar outro desastre gastronômico, relatado a mim por um amigo meu de Porto Alegre. Há muitos anos, quando a garrafa de Coca-Cola era de vidro, um amigo de meu amigo convidou este e outras pessoas para um bobó de camarão, o qual foi servido em uma finíssima sopeira de porcelana da bisavó do anfitrião – uma relíquia da família. Então, o anfitrião chegou todo solene com a sopeira com o bobó, e colocou a peça no centro da mesa. O jantar iniciou. Em um dado momento, um que estava do lado de lá da sopeira pediu a Coca-Cola ao que estava do lado de cá da sopeira. Só que o de cá largou a garrafa de refri um pouco antes do de lá pegá-la, e ainda por cima a garrafa estava “suada” por fora. Resultado: a garrafa, em uma fração de segundo, espatifou a preciosa sopeira em vários pedaços, e foi camarão para todos os lados sobre a mesa. Este meu amigo disse que teve que se trancar no banheiro para rir, pois não conseguia parar de rir!

            Jamie Oliver elevou o patamar da Cozinha Inglesa, a qual não chega aos pés de outras, como a Italiana e a Francesa. Baterista nas horas vagas, Jamie tem muita atitude e carisma, e abriu uma rede de restaurantes chamada de Fifteen, ou seja, Quinze, pelo motivo de ter cozinhando quinze estagiários, aos quais o generoso Jamie dá uma chance para que esses estudantes aprendam e aprimorem-se na cozinha. Jamie começou jovem na Televisão, com o show The Naked Chef, ou seja, O Chef Pelado, assim chamado porque a intenção do programa era “desnudar” os segredos da cozinha e esclarecer mistérios e mitos. Logo após, chegou o meu momento preferido na carreira de Jamie, o programa Oliver’s Twist, ou seja, Truques de Oliver, ou A Reviravolta de Oliver, ou ainda O Gingado de Oliver, no qual Jamie recebia convidados diferentes, revelando sua paixão para cozinhar para amigos e família, preparando pratos inusitados e exóticos, esforçando-se ao máximo, até aventurando-se em fazer uma feijoada e uma caipirinha, na qual adicionou gengibre e hortelã, além dos ingredientes tradicionais do drinque brasileiro. Certa vez entrevistado, Jamie revelou-se incansável, pois declarara que, nos dias de folga em casa com a família, Jamie também cozinha. Jamie é um homem laborioso, e um infame tabloide inglês disse que Jamie trabalha tanto que mal tem tempo para ver os próprios filhos. Mentira, é claro. Jamie adora crianças e já cozinhou por várias vezes com infantes, inclusive os próprios filhos. Outro grande programa do chef foi o Jamie At Home, ou seja, Jamie em Casa, no qual, em seu sítio nos arredores de Londres, Jamie cultiva uma vistosa horta, e dela colhe os ingredientes, revelando-se preocupado com a saúde alimentar, até tendo erguido bandeira em nome de alimentação saudável para crianças nas escolas inglesas. Nesse mesmo programa, recebeu vários membros da família, até sua avó, uma senhora cheia de energia. Jamie também gosta de receitas da época de Natal. Mais recentemente, Jamie teve programa que ensinavam a fazer belas refeições em apenas quinze ou trinta minutos. Jamie já esteve no Brasil e cozinhou com a chef brazuca Bela Gil, e fizeram uma moqueca vegana, e Jamie gostou muito, elogiando o toque de exótico leite de coco.

            Ainda na Inglaterra, temos a charmosa Nigella Lawson, a qual, já foi dito, transforma o ato de comer em uma experiência sensual. Nigella já declarou que seu lar gastronômico é a Itália, tendo já morando na nação da bota. Mãe atarefada, Nigella traz o telespectador para o mundo dela, na correria do dia-a-dia de uma casa cheia de comida gostosa e caseira. Feminina, Nigella conversa com a câmera graciosamente, e é mais dona de casa do que chef, podendo-se observar o detalhe de que ela não tem a técnica de chef de cortar ingredientes com a faca. A dispensa de Nigella é um deleite, com produtos de todas as partes do mundo, numa cidade como Londres, que recebe em seus mercados produtos do mundo inteiro, sendo a manga brasileira, por exemplo, muito apreciada pelos ingleses.

            No Rio Grande do Sul, temos o Anonymus Gourmet, do chef José Antônio Pinheiro Machado, que hoje está no SBT RS, e já troquei uma ideia com ele sobre receitas com pinhão. A bandeira de Anonymus é comida simples e deliciosa, sem frescuras. Uma de suas frases emblemáticas é Carne de segunda, sabor de primeira, no sentido de que não se pode ter preconceito em relação a uma carne só porque esta não é filé mignon. Ainda no RS, temos o caxiense Rodrigo Werner, que apresenta o Truques de Cozinha na Band RS, um chef que nos inspira a cozinhar para os amigos.

Em âmbito nacional, temos a adorável Palmirinha, uma doce senhora que faz comida caseira e recebe convidados para comer. Temos ainda a Rita Lobo no Cozinha Prática, numa cozinheira cujo objetivo é trazer o telespectador para a cozinha, a peça da casa que Nigella diz ser o coração de um lar. Temos também Rodrigo Hilbert no Tempero de Família, que viaja pelo Brasil para fazer receitas inusitadas, muitas vezes típicas de cada região. A vegetariana Bela Gil tem a preocupação em fazer alimentos ultra-saudáveis, sempre destacando as propriedades nutricionais e benéficas de cada ingrediente usado nas receitas. E temos o Perto do Fogo, com Felipe Bronze, com receitas feitas estritamente no calor das brasas de uma grelha, em receitas que destacam o sabor defumado e que mostram as novas texturas de sabor que um alimento pode ter na brasa.
           
            Há tempos passava no canal GNT o programa de Annabelle, uma neozelandesa que fazia receitas que levavam ingredientes orgânicos e fresquinhos, e com ela aprendi a lição de que não se pode armazenar tomate na geladeira, pois na geladeira o tomate perde a sua doçura natural.
           
            Às vezes, fico com um incontrolável desejo de consumir junk food, aquela comida microbiótica bem pouco saudável e muito calórica, cheia de frituras. Prefiro o Burguer King por duas razões: a primeira é que se você pedir um xis picanha, você sabe que o que você está comendo é picanha; a segunda é que o refrigerante é liberado. Só vou em outras lanchonetes quando não tenho por perto um Burguer King, pois há muitas lanchonetes nas quais não sabemos que tipo de corte bovino faz parte daquele hambúrguer. Outra comida que curto é a japonesa, só que temos que ter certeza de que o estabelecimento é de confiança e que o peixe cru servido é fresquinho, bem fresquinho. Já aconteceu duas vezes de eu passar mal depois de comer sushi estragadinho. Outra vez também passei mal ao comer um cachorro quente, só que de uma lanchonete bem famosa, bonita e limpinha. Eu tive um colega da faculdade que abriu um restaurante de sushi em Porto Alegre, e era um estabelecimento de confiança. Este mesmo colega disse-me que, em outro restaurante da cidade, viu um sushiman preparando a comida com um band-aid no dedo! Bah! Falando em bah, tem em Porto Alegre o restaurante fino Bah, que serve uma farinha de erva mate, algo que nunca vi antes.

            Gosto de morar em Caxias do Sul, e a cidade tem restaurantes emblemáticos. O irresistível galeto é de comer de joelhos na tradicional galeteria Alvorada e na sofisticada Casa di Paolo, com um galeto temperado com sálvia e uma impecável sopa de agnoloni al dente, sem esquecer das polentas frita e brustolada, esta sendo feita na chapa. Outro ás da culinária caxiense é o Andrea, ultra tradicional, com um tortéi com um tempero inigualável, uma carne macia e suculenta, um espaguete al dente irresistível, uma polenta mole com queijo derretido e uma batata frita muito bem preparada, evocando aqui novamente Boni, que disse que comida boa é comida simples, só que bem feita.
           
            A minha querida amiga Beatriz concorda comigo: bom mesmo é vino i pasta! Cozinhar e comer nos faz humanos. Bon apetit!

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Em Segundo Lugar




            Exatamente no momento em que eu selecionava em minha cabeça um assunto para tratar aqui no blog, estava numa fila do caixa de uma farmácia em Caxias do Sul, e num mural atrás do operador de caixa havia, dentre muitas imagens, uma imagem de Elizabeth II da Inglaterra, isto num estabelecimento comercial em pleno Brasil. Ela é uma monarca que ultrapassa fronteiras, sendo respeitada ao redor do mundo. Nesta imagem na farmácia, ela está num traje rosa, e abana sorrindo. Bisavó, Elizabeth II tem o reinado mais longevo da História da Inglaterra, numa energia que, apesar da idade, nunca deixou de exercer suas obrigações constitucionais. É uma saudável senhora. No casamento do filho Charles com Camilla Parker Bowels, o Príncipe de Gales, ao ver a mãe, deu-lhe um singelo beijo no rosto, quebrando protocolos e formalidades, pois já ouvi dizer que família são todas iguais – só muda o endereço. Uma pessoa de minha família, em recente viagem ao Reino Unido, comprou como souvenir um prato com a imagem impressa da monarca, devidamente sorrindo e coroada com joias, representando um país rico e respeitado, herdando o legado eterno da grande monarca antepassada, a lendária Elizabeth I. Bisneta da popular rainha Vitória, Elizabeth II, no decorrer de suas décadas de reinado, foi aprendendo e crescendo, desenvolvendo um estilo próprio. Líder da família mais famosa do mundo, disse, em discurso ainda jovem, que todos os cidadãos de seu país pertencem à Grande Família Imperial.

            Há muitos anos, vi um inesquecível programa de humor da TV Inglesa, e era um programa no qual bonecos faziam sátiras de grandes personalidades. Então, estava um boneco aludindo à Elizabeth II, com uma coroa de pedras preciosas e as tradicionais luvas da rainha, visto que esta senhora viveu nas décadas em que luvas eram indispensáveis a uma dama em compromissos sociais. Uma atriz imitava a voz da rainha, e era uma voz idêntica. Então estava a rainha fazendo um saque em uma agência bancária eletrônica em Londres, num caixa de autoatendimento. Ao lado do boneco da rainha, estava um boneco imitando o príncipe Charles, e a rainha disse-lhe: Olhe só, Charles, que beleza esta máquina fotográfica que encontrei. Você passa este cartão por esta fenda, pressiona alguns números, e saem fotos suas na hora! Ou seja, uma rainha absolutamente debilmental que não via que as “fotos” eram, na verdade, cédulas de dinheiro daquele país! Anos depois, em outra sátira de um artista plástico, um pouco indiscreta (diga-se de passagem), a rainha aparece sentada em um troninho, não no trono da Realeza, mas no troninho do banheiro, e esta senhora aparece com as saias arriadas, fazendo xixi e cocô, sorrindo, vestida em traje de gala e devidamente coroada. Um pouco agressivo, não? Na verdade, todos precisamos fazer cocô e xixi. A rainha, em suas várias décadas de trajetória, aprendeu a desenvolver senso de humor, pois as grandes figuras públicas não podem ter controle sobre tudo e todos, tendo que abraçar suas próprias personas públicas e entender que as sátiras são declarações de amor.

            O Marketing não é um privilégio só de plebeus. Há as famosas fotos, de décadas atrás, de Charles acompanhando os próprios filhos montados em pôneis, em imagens que repercutiram pela Mídia Inglesa e até Mundial. Nada mais natural, portanto, a monarca lançar mão de uma boa assessoria de Marketing. Há anos, a assessoria da rainha convidou jornalistas daquele país para que presenciassem um momento “íntimo” e informal da monarca: a rainha apareceu docemente colhendo flores em seu jardim e, ao final da colheita, sorriu para os fotógrafos. Claro que tudo premeditado, e a rainha deve ter sido aconselhada pela assessoria para esta senhora tomar parte em uma cena simples, feminina, como uma inocente senhora colhendo flores em seu jardim, como qualquer outra adorável senhora do Reino Unido em seu florido, feminino e frágil jardim. Em outra jogada marqueteira, a rainha, assediada por fotógrafos, previamente convidados para o acontecimento, entrou, acompanhada por outras mulheres da Realeza, em uma loja de pratos de cerâmicas, objetos de uso popular de cidadãos comuns, muito aquém das finas porcelanas com as quais a rainha está acostumada, numa medida de Marketing que buscou aproximar a monarca de seu povo, mostrando que não há algo de errado em comer em simples pratos de cerâmica. Feliz do líder que se revela com simplicidade, ignorando os abismos sociais da rígida estrutura social inglesa. Se quando desencarnamos vamos a um lugar onde somos todos príncipes herdeiros do mesmo rei, lá sobrenomes e dinastias são inúteis nessa dimensão de igualdade. Outra grande tacada de Marketing foi após o assassinato em solo inglês do jovem encanador brasileiro Jean Charles, abatido pela polícia inglesa por ter roubado um simples pacote de biscoitos. O próprio jornalista Boris Casoy disse, ao dar notícia, que o acontecimento tornara-se uma mácula na coroa de Sua Majestade. Pouco tempo depois, a rainha convida o então presidente brasileiro Lula e esposa Marisa, os quais foram recebidos em Londres em um luxuoso jantar formal, recepcionado pela rainha em pessoa. No jantar, acompanhado por jornalistas, foram divulgadas no Brasil as palavras da rainha a Lula, e a monarca disse ao presidente que era um prazer receber no Reino Unido jovens brasileiros que vão a este país para estudar e trabalhar. É claro que a rainha referiu-se, em parte, a Jean Charles, ironicamente com o mesmo nome do herdeiro do Trono da Inglaterra.

            A rainha adora filmes de James Bond, e não perde qualquer première londrina dos filmes de 007. A monarca está sempre presente das sessões de gala de exibição. James Bond é uma espécie de patrimônio cultural inglês, numa combinação de charme e agressividade. Na première do filme de Bond no qual a popstar Madonna canta a música-tema, e rainha, é claro, estava lá, só que ninguém explicou para a diva americana como é cumprimentar a monarca: a rainha estende a mão e a pessoa que a cumprimenta faz um sutil curvamento perante Sua Majestade. Madonna, que está acostumada a estender a mão para cumprimentar as pessoas, estendeu a mão à rainha, a qual também estendeu a mão! Num breve momento de tensão, Madonna cumprimentou a rainha apertando a mão desta, sem curvamento, numa gafe que ficou famosa, com um jornalista brasileiro dizendo: Não é todo o dia em que a Rainha do Pop encontra-se com a Rainha da Inglaterra.

            Discreta, Elizabeth sabe o valor da “invisibilidade” de camaleão. Em sua mente, a rainha entende que todos os cidadãos devem sentir-se iguais em dignidade, herdando valores democráticos como Igualdade, da Revolução Francesa, apesar da milenar rivalidade entre ingleses e franceses. Para a rainha, ser da Realeza é como usar um broche extremamente discreto e singelo, avisando, de forma minimalista, que se trata de um membro da Família Real Inglesa. É claro que a vida tem suas inúmeras vicissitudes, e nem sempre a rainha pode erguer a cabeça empunhando os princípios comuns ingleses de discrição, quietude e elegância. Por exemplo, as recentes imagens do neto da rainha, Harry, absolutamente nu, tapando o sexo com as mãos. Coisa de pirralho, é claro. Mas, depois disso, a rainha tomou providências para acompanhar de perto os compromissos sociais do neto rebelde. Por outro exemplo, os seios nus da então recém-casada Kate, esposa do neto William.

            Elizabeth II é um tanto incompreendida. Ela é uma doce senhora, e fim. Já chegaram a declarar que a rainha tramou o acidente automobilístico que matou Diana, pois há os que acreditavam que a ex-princesa estava grávida do famoso milionário Dodi, um muçulmano, e que a rainha não suportaria o fato de que seus netos caucasianos tivessem meios-irmãos não-caucasianos. Que exagero, pessoal. A própria Diana, após o hecatômbico divórcio, achou que a rainha estava interceptando as ligações telefônicas de Di, como se a rainha nada mais tivesse a fazer da vida. É um grande desafio ser visto com bons olhos, e ser uma pessoa pública não garante que esta seja necessariamente bem-vista.

            Certamente, o maior tributo já feito a EII é o filme A Rainha, que rendeu um merecidíssimo Oscar a Helen Mirren, a qual ironicamente já interpretou Elizabeth I na televisão. EII gostou do filme e até convidou a atriz para um chá. No filme, de início, vemos uma rainha muito segura de si, no controle de tudo, achando que pouco teria mais a aprender. Então, um abalo sísmico ocorre, enorme, descomunal – a morte de Diana. De início, a rainha recorre ao pensamento racional: se Diana divorciou-se, perdeu o título de Alteza Real; logo, não tem direito a um funeral de realeza. A opinião pública entrou em verdadeiro alvoroço, e o senso comum acaba impondo-se: mesmo tendo tecnicamente perdido o título HRH – Her Royal Highness – de jure, Diana, no coração do Povo Inglês, permanecia princesa de facto. A rainha fica bem confusa, e não sabe direito o que fazer. Numa cena, ela está sozinha numa sala, tomando um uísque para abrandar a dureza do dia. Entra em cena um papel decisivo, o então recém-empossado Primeiro Ministro Tony Blair. Tony faz a ponte entre a rainha e o povo desta, e acaba convencendo a monarca de que algo deveria ser feito, de que alguma atitude tinha que ser desencadeada pela rainha. Elizabeth II acaba curvando-se, com sabedoria, e sai vitoriosa do episódio. Vivendo e aprendendo, não importa a idade. E Diana caba tendo um funeral de realeza, difundido pelos quatro cantos do mundo, na famosa cena da rainha curvando-se perante o caixão. Não diz Tao que quem se curva, governa? Não é insuportável um líder arrogante?

            A rainha gosta de fazer uma mensagem anual de Natal para seus súditos, desde jovem até os dias presentes. A monarca foi adquirindo know-how, num complicado início de reinado, como é mostrado na recente série televisiva The Crown, ou seja, A Coroa, exibida pelo Netflix. A série, em seu início, mostra uma Elizabeth recém-casada, em uma viagem de vários meses por colônias inglesas na África. A notícia da morte de seu pai, o Rei, pega-lhe de surpresa, e a viagem por território africano tem que ser abreviada. Ao descer de luto, vestida de preto, e recolocar os pés em solo inglês, a série mostra uma menina obrigada a, imediatamente, tornar-se mulher, numa pessoa tímida que se viu obrigada a desenvolver um modo de lidar com uma mudança de vida, mudança esta tão repentina. Ainda por cima, a rainha sofre comparações com sua antecessora Elizabeth I, uma monarca decisiva no momento da Inglaterra Renascentista.

            Pertencente à geração que testemunhou a II Guerra Mundial, Elizabeth II trabalhou como mecânica durante o conflito e, na tradicional aparição dominical da Família Real aos súditos em uma sacada do Palácio de Buckingham, a jovem Elizabeth, ainda princesa, aparece com o sóbrio uniforme militar, dizendo ao povo que era a hora de deixar o glamour de lado e focar-se em questões mais importantes e imediatas, numa sobriedade que expôs a sisudez da Coroa em frente à grande, amada e transgressora popstar que foi Diana. Na Inglaterra, mulheres da aristocracia nunca devem cruzar as pernas em público e nunca devem tingir seus cabelos, regras que a rainha segue até hoje. Para esta senhora, o dever vem sempre antes do não-dever, ou seja, o “eu” vem em segundo lugar; as obrigações, em primeiro.

            Na ilustração desta postagem, a rainha em compromisso oficial com o então presidente americano Barrack Obama, sendo este uma explosão de carisma. É pesada uma coroa sobre a cabeça, numa função representativa que coloca o rosto da pessoa nas cédulas de dinheiro de um país. A rainha reina, mas não governa. Mesmo assim, existe poder na Coroa da Inglaterra. Apesar de ser o cidadão mais importante da Inglaterra, a rainha não pode votar nas Eleições Parlamentares de seu próprio país. A monarca fica numa contradição: tem poder e, ao mesmo tempo, é impotente. O jornalista Paulo Francis disse, certa vez, que, ao observar-se a função de Elizabeth II, é difícil de se imaginar função mais enfadonha.

            O equivalente latino para Elizabeth é Isabel. Portanto, pode-se tranquilamente dizer a rainha Isabel II da Inglaterra. Do mesmo modo, o equivalente espanhol é Gonzalo para o nome português Gonçalo. Há épocas atrás eu me incomodava quando alguém me chamava ou escrevia Gonzalo, mas hoje aceito ambos os nomes. Nada como a Universalidade.