É dele o álbum mais bem vendido da História, o Thriller, uma marca que provavelmente
inspirou o título Invincible, ou
seja, Invencível, de seu álbum mais
recente. Realmente, será difícil alguém desbancar aquele que foi chamado de Rei do Pop e de Mago. No início dos anos 80 eu era uma criancinha, e lembro-me
perfeitamente do clipe de Thriller
transmitido pela Globo, provavelmente no programa Fantástico. Eu estava deitado na cama de meus pais, a qual tinha
uma TV em frente, e minha mãe, que estava comigo no quarto, deu um grito no
momento em que Jackson
transforma-se em um terrível monstro no clipe. Nunca alguém foi tão longe nem tão
ousadamente, e um Michael monstruoso ganhou o mundo, que adorou vê-lo
transformar-se em lobisomem e aterrorizar a mocinha do clipe, onde Michael
dança com zubis recém desenterrados de suas covas, num horrível Umbral. Genial
e original. Cantor ok e dançarino excepcional, Jackson inventou o famoso passo Moonwalk, no qual o dançarino parece
estar andando para frente e para trás ao mesmo tempo. E MJ foi assim – andou
para frente e para trás durante sua (conturbada) vida de popstar.
Digno de grandes investimentos por parte de gravadoras, MJ
está no clipe mais caro da História, o Scream,
ou seja, Grito, no qual contracena
com a irmã Janet Jackson, uma cantora ruinzinha que precisa mostrar um dos
seios em público para receber alguma atenção da mídia, como o fez ao lado de
Justin Timberlake. Janet até tenta se vender na mídia, mas está a quilômetros
de distância do talento do irmão. No clipe, em uma excelente fotografia em
preto & branco, Michael e Janet estão em uma espaçonave, e os efeitos
visuais impecáveis (e caros) mostram os dois dançando em uma coreografia empolgante
e fazendo outras coisas, como jogar esportes e videogame, brincando com a falta
de gravidade. A canção não chega aos pés do apuro visual do clipe, e fala de
como Michael, recebendo então apoio da irmã, protesta sobre como a imprensa o
maltrata, publicando informações horríveis, muitas vezes infundadas, como nas
ocasiões em que o Rei foi acusado de pedofilia. E nisso MJ sofreu, e mostra no
clipe a raiva por ser tratado assim, pedindo o respeito das pessoas. Na letra,
Michael diz ter tanta raiva que quer gritar.
Há muitos anos foi promovido um evento chamado O Show da Família Jackson, que mostrou
vários membros da família em performances no palco. É claro que as pessoas que
pagaram ingresso para ir ao show foram querendo ver MJ no palco, sendo que os
shows de seus parentes seriam uma simples preliminar, uma salada antes do
grande prato principal. A plateia ficou absolutamente frustrada quando Michael,
ao final do evento, subiu ao palco, ao lado da amigona Elizabeth Taylor,
dizendo que não faria performance alguma. As pessoas ficaram tão revoltadas que
vaiaram Michael, o qual disfarçou rindo suavemente mas, no íntimo, estava
envergonhado e um tanto humilhado, pois quem é que gostar de ser vaiado? Liz
Taylor intercedeu, e disse à plateia que não era nem um pouquinho legal estarem
vaiando MJ. Nada mais natural do que duas grandes estrelas serem amigas uma da
outra.
A partir de um certo momento, MJ foi sempre cercado de
controvérsia, como nas várias cirurgias plásticas – ele disse ter feitos só
duas: uma no nariz e outra no queixo. Isso sem falar no branqueamento da pele,
o que é irônico dizer que ele foi alvejado em dois sentidos: alvejado na cor
alva de sua pele, como que sob efeitos de água sanitária, e alvejado no sentido
de sofrer ataques. Michael, antes de tanto bisturi, era um negro bonito, e era
a grande coqueluche do conjunto Jackson Five, que montou com os próprios irmãos
nos anos 70, sempre conduzidos pelo pai de Michael, um empresário que se
revelou extremamente duro com os filhos, duro ao ponto de Michael querer cortar
relações com o próprio pai. Autoritário, o pai de Michael gostava de ficar com
o dedo em riste, exigindo sempre o máximo da prole, uma cobrança que fez de
Michael um profissional esforçado e muito competente, ao ponto de se
diferenciar claramente no grande panteão pop. Michael sempre disse que não teve
infância, o que teria uma consequência depois, na vida adulta, num Michael
adulto que dava todos os sinais de um complexo de Peter Pan. O próprio Michael
dizia, que, em seu próprio coração, era Peter Pan. Desde a infância, MJ teve
que trabalhar tanto que simplesmente foi tolhido como infante. Tudo aquilo no
que a pessoa é tolhida na infância vai estourar na vida adulta, como uma consequência,
como algo natural.
Michael recebeu certa vez uma grande homenagem na premiação
anual do Grammy, sendo aclamado como uma verdadeira lenda. Mas nem tudo são
flores. A inexpressiva Latoya Jackson, irmã de Michael, certa vez foi à mídia
dizendo que seu irmão era, de fato, pedófilo, e outros membros da família
Jackson, após isso, disseram que Latoya era desprezível, uma verdadeira pária
da família. Certa vez, a revista brasileira Caras convidou Latoya para vir ao
Brasil e fizeram um ensaio fotográfico com a pária, como se Latoya fosse uma
superestrela. Jesus Cristo, por favor.
Por que MJ resolveu ter filhos com pessoas brancas? Não se
sabe. Certa vez, o astro teve um midiático relacionamento amoroso com a filha
de Elvis Presley, e o casal aparece junto no clipe de uma balada romântica de
Michael. É claro que era tudo para causar estardalhaço na Mídia. MJ era um homem
midiático, muito midiático. Cada suspiro seu era acompanhado e esmiuçado pela Mídia,
como nas famosas imagens de Michael chacoalhando um de seus filhos, ainda bebê,
no lado de fora da sacada de um hotel, sendo bradado por fãs. Muitas pedras já
foram jogadas em MJ, e até acusaram-no de ser sociopata, um verdadeiro Hannibal
Lecter. Que exagero. Nunca os supostos abusos sexuais tiveram provas, e Michael
foi vítima de pessoas de má fé, que queriam arrancar-lhe dinheiro a qualquer
custo. O astro foi humilhado, tendo que ir aos tribunais, sempre sob os holofotes
midiáticos. O cantor até teve que ter suas partes íntimas fotografadas como
parte das investigações. Como pode alguém tão bem-sucedido ser tão humilhado? O
sucesso é uma faca de dois gumes.
A morte de MJ foi trágica. O astro estava em plenos ensaios
de uma bateria de 50 shows em Londres, num espetáculo chamado This Is It, algo como Acabou, É isso, sugerindo que seria
aquela a última vez em que pisaria nos palcos. É claro que Michael ganharia um
bom dinheiro e pagaria suas dívidas. A amarga ironia é que Michael acabou-se
antes mesmo de estrear no show, e há um filme que mostra os bastidores dos
ensaios, num Michael dedicado, com barba por fazer, cuidando de cada detalhe
cênico, de cada verso, de cada dançarino. Não se sabe por que Michael estava
sofrendo de insônia nos preparativos do espetáculo, e pediu ao seu médico
particular que lhe ministrasse grandes doses de um analgésico potente, tão
potente que acabou causando uma parada cardíaca em Michael, o qual foi-se
embora para bem longe dos meandros problemáticos do sucesso. Reza a lenda que,
antes de dormir e morrer, Michael disse, aos sussurros, que queria que This Is It fosse uma experiência única
para seus fãs.
O álbum Dangerous,
ou seja, Perigoso, do início dos anos
90, era para ser um verdadeiro estouro de vendas, como Thriller, mas encalhou feio. Eu lembro de estar viajando pelos EUA,
no início de 1993, e, numa loja de CDs, numa época em que acreditava-se que a
mídia CD jamais ruiria como está ruindo hoje em dia, havia um balcão cheio de
CDs de Dangerous sendo ofertado por
poucos dólares. A música-chefe Black or
White, ou seja, Preto ou Branco,
mostra Michael viajando pelo mundo, entrando em contato com várias etnias,
raças e culturas, exaltando a positividade da diversidade racial e dizendo que
somos todos iguais, tendo em Michael uma espécie de embaixador global. Mas,
mesmo com uma mensagem tão bela, as pessoas trouxeram à luz da discussão a cor
da pele de Michael, a qual, ironicamente, estava entre preto e branco. Exaltado
e nervoso em uma entrevista posterior, quando o repórter perguntou-lhe sobre a
cor de sua pele, Michael disse que era uma doença dermatológica e que exigia
ser respeitado. Até hoje é um mistério: por que um homem negro tornou-se
branco? Será que Michael tinha um distúrbio de imagem e que, quando olhava-se
no espelho, via tudo, menos a si mesmo?
Outro grande clipe é o Remember
the Time, ou seja, Lembre-se da Época,
catarseando um Complexo de Édipo. O cenário é o Egito Antigo, e Michael aparece
como, ironicamente, em metalinguagem, um entertainer, um artista performático,
seduzindo a rainha – a linda modelo negra Iman, incorporando a mágica Nefertiti
– e deixando o faraó – o astro Eddie Murphy – furioso. Então Michael dança com odaliscas
e transforma-se em areia para fugir dos guardas que o perseguem por ruelas e
palácios. MJ está belo, vibrante, um verdadeiro astro, aparecendo no início do
clipe com um misterioso capuz que lhe cobre o rosto de início, revelando-se
depois. Falando em clipes, o irônico em Thriller
é que Michael, que sempre preocupou-se tanto com a própria aparência e beleza, abriu
mão da vaidade e aparece feio, horrendo, ganhando o mundo ao abrir mão da boa
estampa, num momento em
que Michael ficou livre de si mesmo, produzindo pura Arte,
pois, diz Tao, quem é livre de si mesmo, é feliz.
MJ já esteve no Brasil e, sob muito burburinho, gravou em
uma favela do Rio o clipe de They Don’t
Really Care About Us, ou seja, Eles
não se Importam Muito Conosco, numa canção que é um manifesto político
sobre desigualdades sociais. Na gravação, uma fã driblou a segurança e abraçou
Michael, e ficou em sua própria pele com um resquício do pó de maquiagem do
astro, sendo que, depois, uma apresentadora da MTV Brasil entrevistou-a e cheirou
o resquício de maquiagem.
Controvérsia e Michael Jackson andaram juntos. No filme
promocional do álbum HIStory, ou
seja, A História Dele, que traz um
panorama da carreira do astro, Jackson desfila num grande cortejo militar digno
de soviéticos, nazistas ou norte-coreanos, e o astro é saudado por multidões
como um ser apolíneo, perfeito, digno de reverência e adoração.
Em um desses filmes de besteirol americano de comédia, há
uma sátira de Michael, que ironiza as acusações de pedofilia e, quando Michael
leva um chute na virilha, não sente nada, como se fosse castrado. Michael
sempre propagou a ideia de ser assexuado, e, no palco, é realmente sem gênero,
num mistério. Sua fala mansa e afeminada contrasta com o colosso viril que é no
palco, só que em This Is It faltou-lhe
um bom coreógrafo. Não que os trejeitos dançantes clássicos e famosos de
Michael não fossem esplendorosos, mas Michael teria que aprender novos passos,
para evitar a repetitividade. Mas existe alguém no mundo que poderia ensinar a
dançar um gênio de coreografias como Michael Jackson? Outro ponto problemático
de Michael é que este acreditava que, ao vivo, a banda tinha que reproduzir
exatamente o mesmo arranjo musical ouvido nos álbuns. Nesse sentido, MJ era
complicado, pois dar novas roupagens a velhas canções faz destas renovadas e
reinventadas. Há uma pessoa do showbusiness, cujo nome não mencionarei, que dá
uma aula em matéria de novas roupagens a velhas canções.
O CD Invincible
não entusiasmou a Crítica, a qual só gostou da música-chefe You Rock My World, cujo clipe é sequer
uma sombra de outros clipes impecáveis da carreira do Mago. No encarte do CD,
um Michael Jackson triste, em preto & branco, contrasta com um fundo com as
cores de um arco-íris, numa latência: como pode haver tanta alegria e tanta
tristeza? MJ foi um adulto recluso, tímido, buscando sobreviver às sequelas de
infância, cercando-se de crianças e fazendo-as divertidas em seu parque de diversões
particular, no exótico comportamento de Michael, um astro nem sempre compreendido
pelo mundo.
Recentemente no televisivo Domingão do Faustão, num quadro onde pessoas famosas homenageiam
outros grandes artistas, como Roberto Carlos, Shakira e James Brown, recebeu
destaque um rapaz que imitou Michael Jackson, dando-nos um gostinho de
lembrança de como fomos privilegiados por termos tido entre nós um artista como
Jackson, nos seus originalíssimos passos de dança e no seu carisma ao palco.
Descanse em paz, Michael. No seu funeral, a filha, emocionada, disse que
Michael foi o melhor pai do Mundo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário