quarta-feira, 26 de julho de 2017

A Altinha dos Baixinhos




Há décadas sendo uma grande estrela do Oiapoque ao Chuí, Xuxa Meneghel, a menina que veio de Santa Rosa, RS, mantém-se na crista da onda com muito trabalho e dedicação. Além de ser o monstro televisivo que é, Maria da Graça – nome de batismo – ganha dinheiro com uma franquia de casas de festas infantis, a Casa X, e uma de clínicas de depilação, com loja até no Shopping Iguatemi de Caxias do Sul. Xuxa tem uma pontinha de agressividade, e isso, aliado a seu carisma de candura, tem um efeito explosivo. Eu cresci vendo Xuxa pela TV. Ela começou com o Clube da Criança na extinta Rede Manchete, e logo chamou a atenção da Rede Globo. Em um recente documentário sobre o legado de Roberto Marinho, um dos descendentes de Marinho declarou que, quando Xuxa entrou em seu gabinete, a apresentadora tem uma aura tão forte que parecia que havia milhões de holofotes sobre ela. Xuxa atravessa gerações, e meu sobrinho, quando este era bem criancinha, adorava os DVDs de Meneghel. Eu perguntava para ele qual DVD ele queria ver, e ele imediatamente dizia: Sussa!.

O empreendedorismo da gaúcha de nascença é agudo, e a própria Xuxa declarou em entrevista que tem tanto dinheiro que sua família, por quatro gerações, não precisará trabalhar. Recordo-me de quando eu estava de viagem pelo Rio de Janeiro com minha família, e no nosso hotel, na mesa do café da manhã, havia iogurtes da marca Xuxa, com direito a ilustrações de desenhos da imagem de Xuxa, dando a esta dinheiro também no ramo de alimentação. Xuxa já lançou também linhas de bonecas, é claro, e lembro-me de minha prima carioca, que mora no Rio, ter ganhado de Natal uma enorme boneca de Xuxa, num brinquedo de quase um metro de altura. Isso sem falar das várias incursões pelo cinema, com bilheterias gordas, consolidando o título que Xuxa recebeu, o de Rainha dos Baixinhos. Ok, concordo, mas temos que ver que Xuxa é, também, a Rainha do Marketing, sem querer aqui inclinar-me para o aspecto pejorativo da palavra marketing, mas temos que observar que Xuxa é mercado e vice-versa. Xuxa tem uma compreensão inata da mente infantil, e sabe que, para os infantes, uma coisa ou é do Bem, ou é do Mal. Desse modo, Xuxa encarna valores positivos, iluminados, benéficos, simpáticos e belos, em contrapartida ao que é de baixo astral, escuro, amargo, feio e doloroso.

Para as crianças, é tudo festa. Xuxa já declarou com veemência que ainda tinha dentes de leite na boca, mesmo quando já adulta. Difícil para os altinhos acreditarem. A Rainha também declarou, de pés juntos, que não só acreditava em duendes como de fato já havia visto alguns deles. Resta saber onde. Será que nos jardins de sua mansão no Rio? Como será que os duendes foram parar ali? Será que eles estavam fugindo de um tiroteio nos morros cariocas? Há muitos anos, apareceu uma enorme matéria sobre Xuxa na revista Veja, e, em uma das fotos, a Rainha estava prestes a abocanhar um sanduíche, dizendo ao jornalista que o segredo era colocar bastante maionese. Pueril, mas Xuxa não é burra nem retardada mental. É, de fato, bem adulta. No backstage, ou seja, nos bastidores, Xuxa é uma profissional e ponto. Para os baixinhos, ela é a Rainha. Nada tenho contra Xuxa, a qual busca incutir nas crianças o conceito de bondade.

Falando em backstage, numa época, em Porto Alegre, trabalhei numa agência de Propaganda chamada Backstage Marketing, e um dos sócios-diretores era o Egon, uma pessoa muito gente fina e simpática. Egon foi, há muitíssimos anos, paquito da Xuxa. Ele foi meu colega na PUCRS, no curso de PP, e chegou até trabalhar na RBSTV de Porto Alegre antes de alçar voo na sua própria agência. Bem-humorado, Egon tinha o divertido termo puta velha para designar pessoas que já estão há anos e décadas por aí, trabalhando e batalhando na inerente dureza da via que é a vida. Nesses dias eu estava vendo uma reprise no canal Viva do programa Globo de Ouro, da Globo, e lá estava Egon entre os paquitos no palco. É assim mesmo: todos somos putas velhas. É claro que Egon adquiriu na Globo um baita know-how sobre Marketing, ainda mais em contato com alguém como Xuxa. Tudo na vida serve como experiência.

Falando em paquitos, é claro que são inesquecíveis as loiras paquitas. De todas que foram paquitas, a única que realmente deslanchou foi Letícia Spiller, que hoje é estrelona. Certa vez no Rio, em 1995, deparei-me com Spiller, e ela mais tarde trabalharia com Fábio Barreto, que me dirigiu, eu, que já trabalhei com um ex-paquito. Mundo pequeno de putas bem velhas.

Xuxa rendeu um divertido tributo na extinta Escolinha do Professor Raimundo, na libidinosa e ninfomaníaca personagem Cacilda, cujo jargão era Beijinho, beijinho! Pau, pau!, parodiando o jargão Beijinho, beijinho! Tchau, tchau! que Xuxa proclamou tantas vezes até tornar-se jargão, lançando até uma canção com esse título. Na nova versão da Escolinha, Cacilda permanece no panteão de personagens cômicos do programa. Outra marca registrada de Xuxa são as marias-chiquinhas, como nos tributos que Xuxa já recebeu de escolas de samba do Rio, desfilando em uma ocasião na Marquês de Sapucaí com enormes marias-chiquinhas, num perdoável exagero carnavalesco. Ainda falando em sátiras, há no Youtube um vídeo hilário do supercomediante Paulo Gustavo, no qual o ator está devidamente trajado de Xuxa: botas compridas, marias-chiquinhas loiras, shortinho e o célebre microfone. Então, na sátira, Xuxa entra em cena dizendo: Este programa é para você Peter Pan, que não cresceu, que não desapegou dos anos oitenta, que cresceu jogando videogame. E, o tempo todo, temos um ator anão trajado de Praga, que era um personagem do Xou da Xuxa que era fantasiado de tartaruga ou algo que o valha. E Praga, na sátira, está o tempo todo cutucando Xuxa, a qual se irrita e diz: Eu já te vi, viado! Paulo Gustavo é show.

Outro tributo foi o de uma banda argentina, em ocasião em que integrantes da banda estavam no mesmo avião no qual Xuxa viajava. Na letra da música Con una Rubia en el Avión, ou seja, Com uma Loira no Avião, o cantor diz que ficou tão excitando em estar na mesma aeronave da Rainha que simplesmente não conseguiu dormir. Temos também que assinalar que Xuxa é muito popular na Argentina, atravessando fronteiras. Mas também não é tão internacional assim, e todo mundo leva tufos da vida. Em certa época, Xuxa levou ao pé da letra o termo conquistar o mundo, e decidiu que queria tornar-se a Rainha dos Baixinhos dos Estados Unidos da América. Xuxa até tentou emplacar o jargão solte a franga, dizendo drop the chicken, mas não deu muito certo. Quando o programa na TV Americana estreou, o canal televisivo só recebeu duas ligações telefônicas de telespectadores: uma para reclamar do sotaque de Xuxa; a outra, para reclamar da roupa de Xuxa, numa sensualidade brasileira pouco compreendida nos EUA. Na mesma época, Xuxa, sob provável estresse, teve um problema de dores na coluna vertebral, talvez uma somatização de tensão psíquica. Inclusive, quando saiu anunciado em um jornal americano sobre a estreia de Xuxa na TV ianque, os jornalistas se atrapalharam e colocaram uma foto da apresentadora Angélica, que sempre foi uma sub-Xuxa. Na mesma matéria, o jornal ensinava a pronunciação correta do nome da Rainha: Shoo-sha. Sofrendo essa derrota, Xuxa volta ao Brasil e passa a compreender que vencer na vida é ter dignidade, não importando se uma estrela é municipal, estadual, nacional ou mundial – o que importa é qualidade e não quantidade.

Certa vez, quando a popstar Madonna estava na excelente fase do álbum Ray of Light, Xuxa foi entrevistá-la, e as duas identificaram-se uma com a outra, mesmo havendo uma diferença quantitativa entre as duas. Em um dado momento da entrevista, Xuxa falava uma palavra e Madonna tinha que dizer a primeira coisa que vinha na mente. Então, quando Xuxa falou “fama”, Madonna imediatamente falou “prisão”. É de se compreender. Uma pessoa como Madonna não pode sair tranquilamente na rua; o mesmo com Xuxa, que fica trancafiada em casa, sempre com medo do que pode acontecer. Xuxa, dentro do Brasil, simplesmente não pode fazer o que uma pessoa comum pode fazer, como caminhar no calçadão ou na orla, ou ir a um cinema, ou sair tranquilamente para jantar em um shopping. Xuxa até chega a sair de casa dirigindo, mas é claro que, colado atrás, vem um carro cheio de seguranças, numa cidade como o Rio de Janeiro, onde o risco de assalto e sequestro é alto. Numa recente edição do Festival de Cinema de Gramado, Xuxa estava no tapete vermelho e foi falar de perto com os fãs, mas é claro que, logo atrás da Rainha, ao menos dois seguranças cuidavam tensamente da Rainha, temendo o pior, como uma facada ou um soco – nunca se sabe. Já, em Nova York, Xuxa tem um pouco mais de liberdade, apesar de ser uma cidade apinhada de brasileiros. Em uma foto na imprensa há anos atrás, Xuxa caminhava calmamente pela Big Apple, sem ser importunada. Então a fama tem dois aspectos: por um lado, Xuxa é privilegiada como uma princesa; por outro lado, é uma espécie de tolhimento. E Xuxa, em homenagem, fez um vídeo inspirado em um vídeo de Madonna, numa metalignuagem: estrelona falando de estrelona.

Xuxa recentemente estreou na TV Record um talk show de entrevistas, inspirado no bem-sucedido talk show da americana Ellen DeGeneres, e Xuxa até imita o cabelo loiro curtinho de Ellen. Também no momento, Xuxa lançou uma fragrância pela empresa Jequiti, de Sílvio Santos, perfume chamado simplesmente Xuxa Meneghel. Sílvio é um visionário, e enxerga acima de mediocridades: o fato de Xuxa estar na Record não a impede de estar na Jequiti, pois Xuxa promove o perfume; o perfume promove o SBT e promove a Record. SS tem uma mentalidade acima de picuinhas. No VT promocional do perfume, Xuxa está numa paradisíaca praia, em um filme publicitário impecável, reafirmando o profissionalismo em torno do produto.

O portão de entrada para o acesso à propriedade de Xuxa no Rio tem um brasão com as iniciais XM. Xuxa construiu um verdadeiro império, tendo vindo do nada, assim como Gisele. E Xuxa gosta de promover namorados, e o fez com Pelé, Senna e Luciano Szafir. Inclusive, no funeral de Senna, Xuxa foi tratada pela família do falecido como a autêntica viúva do ídolo, o que magoou Adriane Galisteu, na época namorada de Airton. Já, com Szafir, pai da filha de Xuxa, o negócio ficou feio, e a família de Luciano chegou a trazer a público o descontentamento com a postura de Xuxa, que simplesmente parou de se relacionar com a família do pai de Sasha. Falando em Sasha, Xuxa até tentou alavancar a filha no showbusiness, mas a menina é jovem ainda e muita bola vai rolar.

Xuxa teve muito tempo de relacionamento profissional com a superempresária Marlene Mattos. Em entrevista à revista Playboy, Xuxa até ironizou o fato das pessoas acharem que as duas não só eram lésbicas como também tinham um caso. Em um dado momento, o “casamento” acabou. Em outra entrevista, Xuxa conta que tinha uma relação de muita dependência em relação a Marlene, deixando esta cuidar de assuntos financeiros da própria Xuxa. Outra polêmica envolvendo a Rainha é o infame filme erótico,e, em entrevista, Xuxa disse que não tem vergonha e que o mesmo filme foi um trabalho como qualquer outro.

Todos sabem que Xuxa tem uma voz medíocre, e que quando pisa num palco, é sempre com playback. Quando a diva americana Sarah Brightman apresentou-se num programa de Xuxa, esta disse, em tom bem irônico, que as vozes das duas eram semelhantes em excelência. Mesmo gaúcha de nascença, Xuxa tem um sotaque carioquérrimo. E nem todas vão tão longe: por exemplo, Mara Maravilha, que nos anos 80 vinha emergindo como uma espécie de “Xuxa morena”, e que hoje está bem humilde, apresentando um programa de fofocas no SBT.

Na produção de um filme com Renato Aragão, os dois tinham que se beijar na boca, e Xuxa caía na risada, nunca conseguindo completar o beijo na cena. Ainda falando em beijo, Xuxa em outro filme beijou um certo galã fumante, e quando a imprensa a perguntou como fora o beijo, Xuxa disse que foi como beijar um cinzeiro.

Habituada com tratamento de estrela, é provável que, em frente a uma poça de água ou lama, um homem tire uma peça de roupa para permitir que a Rainha passe por cima da poça.

Havia boatos infames, como o de que os discos de Xuxa, se tocados ai contrário, traziam uma mensagem de Satanás; outro boato dizia que Xuxa irritava-se com as crianças e as maltratava longe das câmeras. Mas é óbvio que é tudo mentira, bem pelo contrário, Xuxa ama as crianças, e sempre deu espaço na TV para crianças com Síndrome de Down e surdo-mudas, divulgando a linguagem dos sinais.

Por fim, tenho que citar um exemplo de homenagem, na dublagem brasileira da versão francesa do filme A Gaiola das Loucas. Numa dada cena, um senhor homossexual idoso está borrifando com água suas flores, cantando o música Doce Mel, grande sucesso de Xuxa, nos versos: Doce, doce, doce! A vida é um doce! Vida e mel! No exemplo raro de uma dublagem ser mais engraçada do que o idioma original.

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