Amigo próximo do príncipe Charles, Rowan Atkinson é o maior
palhaço da atualidade. Vi os trejeitos de Mr. Bean, personagem que consagrou
Rowan ao redor do mundo, sendo imitados por um palhaço do fascinante Cirque du
Soleil, em Porto Alegre. O
programa televisivo Mr. Bean começou a carreira na Inglaterra no início dos
anos 90, e permanece atual, pois o senso de humor é atemporal. Eu era um
adolescente fazendo cursinho pré-vestibular no ano de 1995, e meus amigos já
viam que eu adorava Bean, tendo-me imitando as palhaçadas que eu via na TV. Há
um amigo de meu pai que também é grande fã de Mr. Bean, e este amigo também
imita o personagem, o qual gerou várias temporadas, com Rowan sempre
colaborando no roteiro e agindo instintivamente, e a filha pequena de um grande
amigo meu também ama Mr. Bean. A música de abertura do seriado significa, em
latim, Este é o homem que se chama feijão.
Excepcional ator, Atkinson tem maestria evidente, com boa dose de carisma,
absolutamente confortável na pele do palhaço. Na vinheta de abertura, Mr. Bean
é como um alienígena colocado no mundo por sua nave-mãe. Bean é absolutamente
desprovido de charme e sensualidade. Bean impõe o caos com implacabilidade.
Mr. Bean está numa loja de departamentos fazendo compras, e
faz questão de mostrar a todos que tem um cartão American Express. Quase morre
sufocado pelos perfumes na seção de perfumaria. Abre uma escova de dente para
testar, mas na hora de levar a mercadoria, leva uma escova sem ser aberta. Por
certa circunstância, fica preso ao bolso traseiro de um homem na loja e vai,
involuntariamente ao banheiro com este homem, o qual só nota Bean quando aquele
está sentado na privada.
No Natal, Bean subverte um presépio em uma loja, e associa
este a outros elementos, como um dinossauro, um robô e um helicóptero que
resgata o Menino Jesus de um atentado. Ao testar se as luzinhas de pinheiro
estão funcionando, Bean acaba por desligar todas as luzes da loja. Ao passar
pela vitrine de uma loja de joias, a namorada de Bean aponta claramente o dedo
para a vitrine, desejando um anel, numa vitrine decorada por um display que
mostra um homem presenteando uma mulher com um anel. A namorada de Bean vai
embora cheia de esperanças, e Bean entende que a moça queria o display,
presenteando-a com o mesmo no Natal. Ao receber o display de presente, a
namorada começa a chorar desamparada, e Bean tira do próprio bolso uma caixinha
de anel. A namorada abre a caixinha cheia de surpresa, e adora o presente. Só
que, depois de abrir a caixinha, a namorada dá-se conta de que era apenas um
gancho para dependurar o display na parede.
Numa première de gala de estréia de um filme em Londres,
Bean trata de se arrumar para a chegada da Rainha na sessão. Ao saudar a
monarca, Bean, ao fazer o cumprimento curvando a cabeça, curva-a de mais e
acaba nocauteando a Rainha, a qual cai no chão. Felizmente, ninguém nota que o
responsável por aquilo era Bean, e este esquiva-se quietinho e deixa a “cena do
crime” – os ingleses amam tratar a Rainha com irreverência na mídia.
Na noite da Ano Novo, Bean recebe em sua casa convidados, e
os recebe com chapéus de festa, feitos de jornal. Mas Bean, depois de chegar os
convidados, nota que não tem vinho para brindar. Então, mistura vinagre com
açúcar e serve a bebida, intragável, e os convidados se assustam. Ao servir
petiscos, Bean vê que nada tem de petiscos para servir, então abre a janela da
cozinha e pega galhos de uma árvore lá fora, cortando os pedaços de galhinhos e
cobrindo-os com geleia, servindo então. Os convidados então adiantam o relógio
e dizem Feliz Ano Novo, indo embora imediatamente da casa de Bean.
Na piscina pública, Bean quer escorregar pelo escorregador
de crianças, mas é tolhido pelo vigia. Bean então sobre num trampolim de vários
metros de altura e só se dá conta da altura quando chega no topo. Bean então
tem uma verdadeira crise de aerofobia, como num pesadelo, sendo forçado a cair
n’água quando um menino pisa-lhe a mão, quando Bean estava simplesmente
dependurado na beira do trampolim. Na queda, Bean perde o calção e fica nu. Na
saída do estacionamento na piscina, Bean de jeito nenhum quer pagar o
estacionamento, e faz de tudo para sair grátis do estacionamento pela chancela
eletrônica. Bean aguarda um caro chegar da rua e enfrenta-o, obrigando este a
dar ré e deixar Bean sair. Aliás, há um aspecto interessante em Mr. Bean: o misterioso
carro azul. Este carro é uma espécie de arquiinimigo de Bean, o qual evita o
carro azul incondicionalmente.
No dentista, Bean acaba acidentalmente anestesiando a perna
do dentista, fazendo este cair no chão e ser nocauteado pelo próprio
equipamento do consultório. Então, Bean resolve ele mesmo tratar da cárie e, ao
ver a radiografia de sua própria boca, fica em dúvida sobre qual dente está
avariado, e resolve perfurar todos os dentes, para ter certeza. Antes de sentar
na cadeira do dentista, na sala de espera, Bean quer tomar das mãos de um menininho
um gibi do Batman.
Num hotel, Bean faz um buraco na parede para entrar no
banheiro do quarto ao lado. No refeitório, Bean inventa de rivalizar com outro
hóspede, e come em dobro tudo o que este hóspede comia. Só que este não come as
ostras, e só depois de Bean comer de três a quatro ostras é que o funcionário
do hotel percebeu que estavam podres. Bean tem uma baita intoxicação alimentar.
Então, enquanto dorme, Bean ouve muito barulho no quarto ao lado, e sai nu de
seu quarto par abater na porta do vizinho e pedir silêncio. A porta do quarto
de Bean fecha-se sozinha e ele nota que está nu, trancado fora do quarto. Então
Bean desfila pelo hotel tapando com placas as partes íntimas, acabando por
vestir urgentemente o vestido de gala de uma drag queen, a qual dá-se conta do
“roubo”.
Num show mágica, Bean desmoraliza um mágico, revelando os
segredos deste, fazendo com que a plateia vaiasse o ilusionista. Na sala ao
lado, uma danceteria, a namorada de Bean simpatiza com outro rapaz, e Bean
quase mata este. Por fim, ao ver que perdera a namorada, só por vingança,
desliga a chave geral e deixa a danceteria no breu.
Ao sair para um piquenique, Bean leva consigo a direção de
seu carro, evitando assim roubos. Então, Bean começa a se incomodar com um
inseto inconveniente. Num almoço ao ar livre, ao invés de levar um sanduíche
pronto, Bean vai a um parque, senta-se no banco e tira de seus bolsos todos os
ingredientes: um pão que corta com uma tesoura, sardinhas vivas em um pote de
vidro, pimenta, alface etc. Na hora de tomar o chá, coloca o saquinho uma bolsa
d’água quente, e, no costume inglês de tomar chá com leite, Bean bebe leite de
uma mamadeira e cospe dentro da bolsa.
O episódio da missa é apoteótico. Bean começa a pegar no
sono em pleno sermão, e perturba um senhor que está ao seu lado. Bean
simplesmente vai ao chão e desperta-se logo em seguida. Ao espirrar,
Bean está sem lenço, e limpa-se com a parte interna do bolso do paletó, sempre
observado pelo senhor ao lado. Para passar o sono, Bean abre uma bala para
chupar, mas acaba colocando-as no bolso com ranho. Escatologia também é quando,
em um avião, Bean espalha pela cabine inteira o vômito de um menino a bordo.
Bean também faz uma reforma em seu apê, e a sátira à família
real inglesa segue, com Bean cortando as cabeças de Diana, Charles e até da
Rainha. Na lavanderia, Bean sofre bullying de uma valentão e vinga-se deste,
fazendo com que o valentão colocasse café e não sabão na roupa do autor do
bullying. Numa prova de vestibular, Bean acha que não estudou o que caía na
prova, e tenta de todas as maneiras colar de um estudante ao seu lado. Bean
gosta de rivalizar, e tirar muitas e muitas canetas de seus bolsos, concorrendo
com o homem ao lado, que tem apenas uma caneta e um lápis. Em uma tarde educação
para adultos em uma escola, Bean explode um laboratório de química e, na aula
de desenho, escandalizado com a modelo nua, faz-lhe roupas de argila, material disponível
na mesma sala de aula.
De todos os vários episódios de Bean, não gosto apenas de
dois: o primeiro mostra Bean num parque de diversões, tendo que cuidar de um
bebê que “adotou” involuntariamente; o segundo mostra Bean obcecado em fazer
pontos em um parque de minigolf, tocando a bola com o taco pela cidade inteira.
Esses dois episódios são exceções – normalmente, amo Mr. Bean. Há dois longas-metragens
de Mr Bean. O primeiro é razoável, com Bean estragando, sem querer, uma obra de
arte de valor inestimável; segundo é mais sem graça, com Bean viajando pela
Europa e causando caos no Festival de Cinema de Cannes. Mas nada se comprara ao
grande brilho de Bean na TV. Há ainda um desenho animado de Mr. Bean, mas não
sou muito fã. As crianças, quem sabe, devem gostar do desenho.
Um dos apelos ao público infantil é Teddy, o inseparável
ursinho de pelúcia de Bean. Ao fazer as malas e ter que cortar alguns itens
para que caibam numa mala pequena, Bean quase corta a cabeça ou uma perna do
urso, mas desiste e coloca o inestimável amiguinho inteiro na malinha. Quando Bean
coloca Teddy numa máquina de lavar, o ursinho encolhe, e aquele, desesperado ao
ver Teddy naquele jeito, cutuca o ursinho e este dá sinais de vida, aliviando
Bean. No Natal, Teddy ganha um par de olhos, e pela primeira vez consegue ver o
dono e a casa onde vive. Ao ler histórias em quadrinhos junto com Teddy, este
não consegue ler, e Bean se lembra de colocar os óculos no urso, colocando este
para dormir por hipnose, guardando-o cuidadosamente em uma caixa de sapatos em
baixo da cama.
Mr. Bean tem um universo tão rico que fica difícil falar de
tudo no seriado.
Outro personagem famoso de Rowan é Johnny English, um
agente secreto britânico como James Bond, só que Johnny é um anti-herói, bem
atrapalhado, fazendo muitas bobagens, como espancar a Rainha da Inglaterra
pensando que esta era uma espiã disfarçada. Parece uma versão inglesa do
francês Inspetor Clouseau, ou a franquia norteamericana Corra que a Polícia Vem Aí. English mais atrapalha do que ajuda,
conseguindo se meter numa cerimônia de coroação, acabando com a coroa da
Inglaterra na própria cabeça.
Outro seriado televisivo traz Rowan como um inspetor de
polícia, e a trama desenvolve-se muito no convívio entre os colegas de
escritório na delegacia – infelizmente não lembro do nome do seriado e nem o do
personagem de Atkinson, mas este interpreta um delegado extremamente
tradicional e patriota, que fica chocado quando uma colega diz-lhe que Sherlock
Homes e Watson eram gays e que moravam juntos como um casal. E o personagem de
Rowan diz: Eles apenas conversam e animam
o fogo da lareira.
Certa vez vi também pela TV um show de stand up, apenas com
Rowan no palco, o qual é satisfatoriamente preenchido como o fazem grandes atores.
Em um monólogo, Atkinson é o diabo no inferno, e está coordenando aqueles que
foram ao inferno, como os cristãos, pois o diabo diz: Os cristãos estão aqui? Ótimo. Informo que o judeus estavam certos.
Em outro monólogo, Rowan é um ator local de pouca importância que recebe um
prêmio em nome de um colega ator mais famoso e prestigiado, e o ator rival
sobre ao palco dizendo que o colega premiado é bissexual e tem sífilis. O
personagem de Rowan também está odiando o fato do colega estar fazendo, no momento,
um filme com Meryl Streep. Inclusive, quando o nome do colega é anunciado como
vencedor, o ator de Rowan diz um audível Oh,
shit, ou seja, Que merda,
igualzinho a Samuel L. Jackson no Oscar, quando o nome de outro ator foi
anunciado. Deve ser uma delícia assistir a Rowan ao vivo no palco.
Rowan começou a ser conhecido do público quando interpretou
um padre iniciante no sucesso cômico Quatro
Casamentos e um Funeral – o padre está absolutamente tenso e nervoso, pois
está fazendo o seu primeiro casamento. Metalinguagem, pois é iniciante falando
de iniciante. A tensão do padre é mostrada com maestria pelo ator. Não parece
que estamos vendo um ator; estamos vendo um padre.
Felizmente, há no Youtube muito material de Rowan Atkinson.
É só sentar e rir. Na dureza da vida, o senso de humor é fundamental. Abençoado
seja o palhaço.
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