Poucos lugares entraram na minha
mente tão poderosamente como o Metropolitan Museum of Art de Nova York, o Met,
o qual visitei no frio mês de fevereiro de 1998. Enorme, é impossível dar conta
de tudo que tem ali – dois dias inteiros dentro dele são insuficientes. A
célebre fachada ostenta sempre grandes banners, anunciando as atrações do
momento no mostruário. São banners eficientes porque são sucintos – carregam
apenas a informação essencial, pois, como diz o taoísmo, menos é mais, e quanto
mais simples for uma mensagem, melhor esta será absorvida. O acesso frontal é
por uma escadaria majestosa, que convida o visitante a uma experiência de
elevação espiritual bem na Quinta Avenida, tendo a instituição tomando parte do
terreno do Central Park, no lado leste do espaço verde. Os arredores são
bairros chiques, tradicionais, onde morar sai bem caro. Mas, apesar disso, não
é caro entrar no Met – alguns poucos dólares já pagam o ingresso, sendo que você
tem o dia inteiro para curtir as galerias, podendo sair e entrar no museu
quando bem entende durante o dia. Na bilheteria, você ganha um discreto broche
com o “M” da logomarca do museu, uma peça que a cada dia muda de cor, para
evitar espertinhos que queiram driblar o controle de fluxo de pessoas.
O hall de entrada é muito espaçoso,
com flores vistosas em grandes vasos, tão grande que parece uma estação de trem.
As pessoas na chapelaria foram muito gentis comigo, principalmente um senhor
negro sorridente. Ao entrar no espaço de exposições, uma senhora idosa muito
bonita me deu as boas vindas. Logo me topei com o famoso Kouros de Nova York –
uma peça grega de Atica de um rapaz, que representa toda a tradição grecolatina
de harmonia estética. Mais adiante, perto de um enorme e sofisticado
restaurante, logo na entrada de uma sala há um conjunto de bustos romanos, e
eles estão virados para a entrada, pegando o visitante de surpresa. Cada um
deles tem personalidade, e realmente parecem ter vida, desafiando o expectador
a decifrá-los. A parte egípcia é a melhor, com inesquecíveis esculturas em
granito de faraós, numa perfeição técnica impressionante, que dá uma idéia do
clima de idolatria que os egípcios tinham por seus deuses e governantes, pois,
na pirâmide social da tradição da nação do Nilo, apenas a divindade estava
acima do faraó, tendo no rei uma figura de intermédio entre o mundo material e
o mundo metafísico – daí vinha toda a dignidade faraônica. A parte pré colombiana
da instituição novaiorquina traz obras em ouro puro. A parte africana é
especialmente impactante, com objetos destinados a rituais de magia. A arte
européia recebe especial atenção. A arte oriental tem particular charme, em
espaços que convidam ao relaxamento sensual do Japão, China, Índia e outras
civilizações. A loja de souvenires é tentadora – adquiri lá dois pôsteres. Os
americanos são um povo mestre em vendas e marketing, aproveitando que o
visitante está com a mente bombardeada com tanta informação museológica.
O Met já passou pelas telonas. Em
“Harry e Sally – Feitos um para o Outro” (When Harry Met Sally...), de 1989, os
protagonistas estão na grande sala egípcia, com uma vidraçaria enorme de vista
para o parque, com um conjunto arquitetônico cuidadosamente importado do Egito
e remontado no museu. Em “Thomas Crown –
A Arte do Crime” (The Thomas Crown Affair), de 1999, cujo pôster está na
ilustração desta postagem, muito gira em torno do Met. O personagem de
Pierce Brosnan é um milionário que freqüenta o Met e é apaixonado por arte, e, por
pura diversão, decide burlar a rigorosa segurança do local e roubar uma obra
impressionista carésima pintada por Claude Monet. O personagem de Rene Russo é
uma policial bela e sofisticada que aparece no início no museu como uma neo Jacqueline
Kennedy Onassis, com óculos escuros que remetem à primeira dama “Nefertiti”
norteamericana – inclusive, o Met já fez uma mostra exclusiva sobre a
ex-primeira dama depois desta morrer, e contou com a visita de uma certa
popstar, cujo nome não mencionarei; também inclusive, o grande lago ao norte do
Central Park leva o nome da icônica Jackie O., como é conhecida. Bem, os dois
personagens centrais de “Thomas...” ingressam em um jogo de sedução e
adivinhações, com a policial totalmente debruçada em recuperar a obra roubada.
Um cena mais para o final mostra uma invasão de senhores com chapéu coco imitando
pinturas da obra de René Magritte, num ato feito por Thomas Crown para
despistar a polícia e, por fim, revelar a devolução da obra ludicamente
roubada. No seriado televisivo “Will & Grace”, o personagem de Debra
Messing está no Met com um colar à moda do Antigo Egito, fazendo referência ao
próprio acervo do museu. No seriado Friends, a piada é quando Joey, um
personagem não muito intelectual, acha que, quando ouve “Met”, querem dizer
“Mets”, o famoso time americano de baseball. Joey quer impressionar uma
namorada levando-a para o museu, e pede uma dica ao amigo Ross, bem mais
erudito do que Joey, e aquele diz ao amigo que entre no museu e entre à
direita, direto na parte egípcia. Então Joey decora mil e uma falas para
impressionar a garota mas, na hora de entrar no museu, entra à esquerda, e
coloca todo o plano por água abaixo!
O programa Manhattan Connection,
transmitido pela Globo News, tem um dos comentaristas Pedro Andrade, um rapaz
que, inclusive, já publicou um guia para viajantes que passam pela ilha. Em um
dos programas, Pedro falou sobre uma mostra no Met, confessando ser aquele museu
o seu lugar favorito, de verdade, em toda a Manhattan. O interessante do Met é
que este nunca está parado. É impossível ficar entediado nele. O Met é não só o
maior museu dos EUA como também um dos maiores do mundo. O museu é um orgulho
nacional, certamente o lugar mais fino dos EUA. Classe e estilo imperam no
local. É chique visitá-lo. Um tsunami de cultura.
O Met é completamente aproveitado em
todos os seus espaços. Tem em seu subterrâneo o acervo que está fora de
exibição. No terraço, a céu aberto, uma galeria de obras que podem ficar ao
relento. A vista do local é deslumbrante, e Nova York mostra todo o seu charme,
em uma cidade que respira cultura, em meio a esquilos rondando pelo Central
Park, com a exótica China Town e lugares lendários como o Plaza Hotel, onde
quem não é hóspede pode tomar café da manhã lá. Nova York serviu de cenário
para tantos filmes que, mesmo quem nunca esteve na ilha, entra nesta e se vê em
um espaço familiar.
Originalmente, no lugar onde hoje
está o Met, havia uma mansão. O espaço foi doado e, mais tarde, foi construída
ao redor a estrutura de hoje, preservando o imóvel original. O museu é uma casa
que acolhe, fazendo com que o expectador sinta-se privilegiado em estar em um
lugar tão inteligente.
Os museus em geral valorizam as
cidades e enaltecem a produção de pensamento, no sentido de que, quando se
visita uma cidade, os museus desta são parte do roteiro de visitação. A
civilização gira em torno da preservação do pensamento resultante da arte e da
ciência, como no Museu de História Natural de NY, o qual infelizmente não visitei,
pois preferi visitar o Met por dois dias inteiros. Quem sabe um dia volto a
visitar Nova York, preparando-me para ir ao Met novamente. É claro que NY tem
múltiplas atrações. Pude apreciar o interior em caracol do Guggenheim, o qual
inspirou o prédio da Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, sendo
este um belo museu com vista para o lago Guaíba. Outro lugar respeitável da Big
Apple é o Museum of Modern Art, o MoMA, com peças de Salvador Dalí, entre
muitas outras, com um convidativo pátio interno. O Museu de Arte Latino Americana
em Buenos Aires
também é um bom passeio. Em Caxias do Sul, o grande “museu” é a Igreja de São
Pelegrino, com obras dos pintores italianos Aldo Locatelli e Emilio Sessa, em
um deslumbrante conjunto de arte sacra envolvendo o Juízo Final e a Via Sacra. Em São Paulo, além do ótimo
Museu de Arte de São Paulo, o MASP, com uma inesquecível escultura em mármore
de uma deusa da Antiguidade, há o Museu do Ipiranga, inclusive neste com um
painel de Locatelli e com a grande tela “Independência ou Morte” de Pedro Américo no Salão Nobre e, no exterior do museu, além de
belos jardins, há um complexo estatuário com a chama da Independência sempre acesa.
Em Salvador, em um antigo mosteiro, foi feito o Museu de Arte Sacra, com
direito a uma capela com um altar todo feito em prata.
Numa cidade diversificada como NY,
num país rico como os EUA, não faltam doações de milionários para fortalecer a
vocação artística da cidade da Estátua da Liberdade. O Met prima pela
diversidade e oferece e dispõe seu acervo de forma claramente delineada, com
bom gosto organizacional, com pertinência, abrangendo o tempo e o espaço. O
lema do museu é: “Cinco mil anos de arte”. Você pode viajar ao redor do mundo
sem sair do museu, num espaço que faz de NY uma cidade cosmopolita e arejada.
Anualmente, na primavera, o museu
tem um evento social beneficente, o Met Gala, num red carpet que traz
simplesmente as maiores estrelas mundiais do momento, e cada edição do baile
tem um tema – o de 2015 foi a China. As mulheres em especial esforçam-se para
aparecer com o vestido mais luxuoso e hot, numa concorrência atroz e
canibalesca pela atenção dos fotógrafos – é uma querendo brilhar mais do que a
outra. A musa negra Beyoncé apareceu recentemente no gala em um vestido de
ousadia indescritível – um jornalista fez um paralelo entre o red carpet do Met
e o red carpet de uma premiação do cinema pornô, e chegou à conclusão de que as
estrelas pornôs estavam vestidas de modo mais recatado do que as estrela não
pornôs do Met Gala! Outra megaestrela que emprestou seu brilho ao evento do Met
foi a bela fera Gisele Bündchen – um monstro, no bom sentido, é claro. O MG é a
nata dos acontecimentos novaiorquinos, numa cidade efervescente com suas
inúmeras galerias de arte espalhadas pela ilha. Certa vez a cantora Marisa
Monte disse que Manhattan cheira a duas coisas: arte e dinheiro. Na minha
viagem, entrei na Quinta Avenida numa esnobe loja de jóias e objetos feitos de
metais preciosos e pedras preciosas, e as caras peças eram horríveis, de
péssimo gosto – eis que o Met, com seu ingresso de poucos dólares, revelou-se
muito, muuuito mais interessante, com seus bens de valor inestimável. Viva a
civilização!
Segundo a Wikipedia, o museuzão foi
o segundo mais visitado no ano de 2012 no mundo, com mais de seis milhões de
pessoas apreciando-o, creio que só perdendo para o Louvre. O site do Met também
é competente, atualizando as mostras em fluxo, num endereço a ser revisitado
inúmeras vezes, sem o risco de se ficar entediado, em um departamento de
comunicação que sabe da importância de se estar na web em grande estilo, sempre
alimentando o site com conteúdo: metmuseum.org
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