sábado, 10 de junho de 2017

De Frente, Sempre




Com décadas de experiência profissional, Marília “Gabi” Gabriela é uma das maiores entrevistadoras da História do Brasil, ao lado de um grande nome como Jô Soares. Já tendo conversado com grandes pessoas do Brasil e do Mundo, Gabi também dá espaço a entrevistas esclarecedoras, entrevistando pessoas menos famosas, como médicos especialistas, os quais respondem a perguntas que moram na cabeça do senso comum, tendo nestas a entrevistadora frequentemente lançando mão de perguntar um sofisticado e maduro “por quê?”. Gabi sabe a arte da conversa, e concentra-se ao máximo no momento da entrevista, nunca tirando os olhos de cima do entrevistado. Dedicação. Direta, simples e prática, Gabi frequentemente, em uma pergunta, lança mão do “ou, ou”, no sentido de perguntar ao entrevistado se algo é deste ou daquele jeito. Gabi sabe que é irritante o entrevistador que quer aparecer mais do que o entrevistado.

Workaholic, Gabi nunca pára, podendo inclusive trabalhar em dois canais de TV ao mesmo passo. Gabi também já se mostrou viciada em sites de notícias, passando boa parte de seu tempo em sites noticiosos, numa pessoa antenada e moderna, sempre a par do que ocorre ao seu redor.

O implacável programa humorístico Pânico na Band já tratou de homenagear Gabi, com a personagem Marília Gabiherpes, a qual tem uma herpes e-nor-me no lábio superior. Então, a primeira entrevistada de Gabiherpes foi a Gabi real, a qual dava gargalhadas com a imitação do talentoso humorista Ceará. Gabiherpes tem uma verdadeira coleção de óculos com armações coloridas, imitando o trejeito de Gabi de tirar e pôr os óculos durante vários momentos nas entrevistas. Ao abrir suas entrevistas, Gabi sempre evoca grandes pensamentos, com frases de pensadores renomados, célebres e respeitado, sempre com pertinência, com frases capazes de resumir, identificar a apresentar o entrevistado. Então, Gabiherpes abriu uma entrevista dizendo: Antes de entrar no elevador, certifique-se de que o mesmo esteja parado no seu andar. Ceará imita a voz grave, com um sutil biquinho nos lábios de Gabi enquanto esta fala. Gabi é assim: ela não entra no elevador sem se certificar de que o mesmo esteja parado no seu andar. Criteriosa na hora de fazer perguntas, nunca pisa em um terreno escorregadio, estando segura de si. Tanto que, num comercial de um desodorante masculino, Gabi aparece entrevistando um homem, o qual fica de costas para a câmera, e Gabi começa a titubear e perder a concentração. Então, o slogan do comercial é mais ou menos assim: Este desodorante deixa inseguras até as mulheres mais seguras.

Outra sátira foi a de Jô – olha ele aqui de novo – no extinto (e formidável) televisivo humorístico Viva o Gordo, da Globo. Jô aproveitou a deixa de um programa de Gabi na época, o Face a Face, cuja angulação de câmera dava a impressão de entrevistador e entrevistado estarem com os narizes colados um no outro – isto é coisa de Gabi, a qual traça uma simples linha reta em direção ao entrevistado. Na referida sátira, havia o Fuça a Fuça, e os atores, de fato, estavam colados um na fuça do outro, quase se beijando. As sátiras, já ouvi dizer, são declarações de amor.

Uma entrevista muito curiosa foi a de Fausto Silva, o qual, com décadas de calejado estilo profissional, simplesmente parou de olhar para Gabi e direcionou-se à câmera, como o faz no programa Domingão do Faustão. Então, Faustão fez exatamente o que faz ao discursar no seu televisivo dominical, absolutamente dispensando perguntas da parte de Gabi, a qual, num extremo momento, disse aos berros a Silva: Esse programa aqui é meu! A coisa ficou engraçada porque Faustão inverteu o jogo e começou ele a apresentar Gabi para a câmera, enaltecendo a entrevistadora, mas perdendo a noção de que ele era o entrevistado. Engraçado.

Ser midiático, Gabi adora aparecer, e o fez inúmeras vezes com quem namorou uma época, o galã Reynaldo Gianecchini, o qual tem idade para ser filho de Marília – uma deixa que sobrou a um humorista que, ao ver Gabi e Reynaldo chegar de carro num evento, perguntou a ela: É teu filho? E Gabi sorriu, mostrando ter senso de humor. Gabi é um misto de intelectual com show woman, sempre primando pela inteligência, mas também gostando de ser celebridade.

            Multimídia, Gabi é atriz também, já tendo feito TV e Teatro. No tablado, se não me engano, interpretou Shakespeare, aceitando desafios e encarando a tarefa difícil de atuar; na TV, fez uma personagem que conheceu a Rainha da Inglaterra numa trama há décadas atrás, tendo Gabi num inglês um pouco sofrível, mas razoável. Dona de uma pele linda, Gabi parece não envelhecer, mesmo sendo uma figura midiática, que volta e meia está nos meios de comunicação, pertencendo ao rol das figuras as quais estão sempre expostas ao público, envelhecendo a olhos vistos. A cabeça de Gabi permanece jovem, sagaz e questionadora, sendo moderna. Numa recente chamada do canal pago GNT, Gabi aparece fincando uma espada de esgrima bem no meio de um combalido alvo, retirando a máscara de esgrima e revelando-se ao público telespectador. Gabi vai direto ao ponto, indo o mais profundo possível. Isso se reflete em uma mesa que numa época serviu de cenário a seu programa de entrevistas no GNT, uma mesa cuja tábua era em forma aproximada de um “C”, com Gabi sentada numa posição que “invade” o entrevistado. Gabi finca uma espada bem no meio do entrevistado, mas é por interesse e não por agressão. Simplicidade de quem entrevista bem.

            Por fim, evocarei o ditado em latim que diz que a verdade é filha do tempo, ou seja, se quisermos enxergar algo com clareza, deixemos o tempo passar. Na famosa entrevista de Gabi com Madonna, a entrevistadora não gostou do resultado. Depois da infame entrevista, Gabi foi entrevistada por Astrid Fontenelle, num programa da MTV Brasil, quando Gabi revelou os bastidores de tudo. Ao decidir que queria entrevistar a Rainha do Pop, Gabi, sempre batalhadora, entrou em contato com a Warner Brasil, a qual, disse Gabi, foi extremamente cordial, mas foi tudo uma longa negociação, talvez a maior da carreira de Gabi. A Warner entrou em contato com a matriz americana, e, então, o escritório de produção de Madonna exigiu vários planos de entrevista, geralmente rechaçando-os, e também exigiu vídeos de entrevistas de Gabi com pessoas de renome mundial. Após findada esta etapa, a produção pediu um plano de divulgação da entrevista, e, num dado momento, disse à produção de Gabi: Vocês são amadores! Isto é uma entrevista com Madonna! Marília Gabriela, com suas décadas de experiência, ser chamada de amadora – nesse ponto, no qual foi insultada, Gabi deveria ter desistido, mas persistiu. Gabi, acostumada a entrevistar pessoas durante quase uma hora, teve que se curvar à exigência de Madonna da entrevista ser de apenas meia hora. Então, foi marcada a entrevista em um restaurante decorado com velas, cedo da manhã, e Madonna chegou com um séquito de produção, e a van, na qual chegou, ficou o tempo todo ligada, caso Madonna se irritasse com a entrevista e simplesmente quisesse deixar o local. Que diva, hein? Ao apertar a mão da estrela, Gabi abriu o jogo logo de início e disse que considerava ela, Madonna, do Balacobaco, o “b” do borogodó, e Madonna agradeceu sumariamente. Para Astrid, Gabi disse que viu na diva uma pessoa mais esperta do que inteligente, com uma Madonna um tanto na defensiva, uma diva calejada por décadas lidando com uma imprensa nem sempre disposta a falar bem de Madonna – e isso confirma-se nessa entrevista de Gabi a Astrid, na qual Marília espinafrou Madonna, quase como uma vingança. Gabi disse que Madonna chegou lá na defensiva, desconfiada, dura, difícil, inacessível, com respostas breves e curtas a perguntas que poderiam render grandes desenvolvimentos de pensamento.

Ao findar a entrevista, Gabi disse ao produtor que achou Madonna muito calada, e o produtor disse que Madonna sempre é assim, monossilábica; o mesmo, ao fim da gravação, cumprimentou Gabi, dizendo que aquela foi uma das melhores entrevistas que alguém já fez com Madonna. E eu concordo. Todos dizem que a entrevista foi Madonna dando coices o tempo todo em Gabi, mas não vejo desse modo. Há momentos em que Madonna se esforça para dar respostas profundas. Gabi disse que, ao elogiar o corpo de Madonna, a mesma debochou, como se Gabi a estivesse cantando. Em outra pergunta, quando Gabi cita uma certa escritora, Madonna diz que esta é desagradável e infeliz – nessa pergunta, Gabi ficou com as expectativas de que Madonna desenvolveria pensamentos mil, mas não foi assim que ocorreu. O problema é que Gabi chegou na entrevista cheia de expectativas, e é difícil de se imaginar Gabi entrevistando a diva novamente, tal o trauma da experiência. Gabi chegou na entrevista com um complexo de inferioridade, o qual acomete os latino-americanos.

Bem humorada, Madonna brincou que chegaria um dia em sua própria vida em que receberia desconto para idosos nas salas de cinema. Madonna é uma pessoa que se construiu em meio às vicissitudes inevitáveis da vida, assim como Gabi construiu a si mesma. Foi o encontro de duas mulheres fortes, porém diferentes uma da outra, bem diferentes. O fato é, antes da entrevista, Madonna não fazia ideia de quem era Gabi, mesmo como todo o cordial intermédio da Warner Brasil, a qual serviu de “cartão de visitas” para Gabi encontrar-se com Madonna, a qual é dura mas não é desumana. Certamente foi uma boa entrevista, mesmo que revelada de um modo o qual Gabi não imaginara. O bom da vida é que nada ocorre como pensamos que iria ocorrer. Gabi deveria perder esse complexo de inferioridade e ver que a entrevista com Madonna foi ótima, mesmo que atípica.

Gabi é como um bom vinho, e está sempre melhor. Tomara que ela nunca faça o que Jô Soares fez – abandonar a carreira de entrevistador, tendo a ausência de Jô abrindo espaço para Pedro Bial. Give time time, ou seja, Dê tempo ao tempo. A verdade vem à tona.

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