quarta-feira, 6 de junho de 2018

Picadinhos de Picasso



Há artistas que, depois de morrer, tornam-se sinônimo de sofisticação e riqueza, como Pablo Picasso, que deu nome a um carro de luxo. Numa cinebiografia, Picasso foi vivido por Anthony Hopkins. Reza a lenda que Picasso confiava muito em si mesmo, e que, na hora de pagar a conta em um restaurante, Picasso fazia um rápido desenho num papel, esperando, assim, com essa “doação”, ficar isento de pagar a conta. Há vários anos, o Shopping Iguatemi de Porto Alegre fez uma mostra de em cerâmicas de Picasso, como pratos. Hoje, ter uma coleção de Arte que abranja Picasso é considerado muito chic. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus.


Acima, Dora Maar com Gato. Este quadro é vertiginoso, pois tem uma inclinação, e tudo ameaça virar e se destruir, como numa sacada frouxa, a qual ameaça desabar a qualquer momento. A cena girando é a passagem do Tempo, num quadro que gira como um relógio, na inevitável Morte que espera todo ser vivo, e Picasso teve que decidir o que fazer com os anos de Vida que lhe restavam. A mulher é uma rainha em um trono, poderosa em sua pose sentada, talvez exercendo poder sobre o próprio Picasso, o qual, reza a lenda tratava mal suas namoradas, mas, aqui, frente a Dora, Pablo se curva. As mãos de Dora têm garras afiadas, como as do gato na cena, e a mulher é uma Mulhergato, sensual, acetinada e, ao mesmo tempo, agressiva e abrasiva, e esses são os lados opostos do artista: liso e áspero, opostos da mesma moeda. A mulher posa confortavelmente, empoderada em seu trono, e o gatinho ao lado é sua paixão, seu amor, no encanto que os felinos exercem sobre a Humanidade desde o Antigo Egito. O gato é a combinação desses dois fatores: duro e mole – duro nas garras afiadas; mole no comportamento agradável e sutil. O gatinho aqui está no cio, eriçado, num Picasso que encontrava muito tesão no próprio trabalho, produzindo feliz e concentrado. Ao fundo da cena, linhas tensas e oblíquas, tratando de colocar tudo aqui num grande liquidificador, fazendo com que as linhas retas rendam-se às curvas desta Mulhergato, a qual tem imprevisíveis cabelos negros como o próprio gato. O trono é altivo e se impõe, num Picasso que se tornou uma espécie de rei da Arte, trazendo identidade cultural à Espanha, um país tão rico de artistas geniais, numa identidade espanhola, sensual, colorida, intensa, apimentada, irreverente, no país do Flamenco e das castanholas, no caldeirão vibrante que é o povo espanhol, que um dia foi a maior potência da Europa. Os trajes da mulher remetem um tanto à obra de Romero Britto, já resenhado neste mesmo blog. Britto gosta de cores variadas e alegres, produzindo subconjuntos de identidade própria, como é o caso deste vestido, rico em estampas variadas. É como se este traje expusesse os órgãos internos da mulher, lançando luz sobre o Feminino, como foi feito recentemente no principal jornal de Caxias do Sul, o qual, ao apresentar as candidatas a Rainha da Festa da Uva, fotografou os objetos que as meninas carregavam na bolsa, ou seja, a bolsa fechada, com coisas misteriosas e ocultas em sua clausura negra, é o Feminino “sujo”, “maléfico”, imprevisível, “insano”, como uma horrenda aranha em uma toca escura, negra; já, os objetos da bolsa, ao serem claramente fotografados, exibidos e iluminados, são o Yin iluminado pelo Yang, fazendo com que a exposição dos objetos das moças fosse muito clara, como a bondosa e iluminada fada Glenda de O Mágico de Oz. Neste gesto ritualístico de exposição e iluminação, a aranha negra torna-se clara com cristal, e esta aranha, ao ser iluminada, não mais assusta, e este é o modo humano de categorizar e conhecer tudo ao seu redor. Neste quadro de Picasso, o vestido da mulher é orgânico, como alimentos sendo processados pelo Aparelho Digestivo. As bolinhas são como pequenos ovinhos de Páscoa, numa rica cesta colorida, nos mistérios caleidoscópicos da Vida, como na Rainha Virgem Elizabeth, cuja virgindade tinha um peso metafórico enorme, como na Imaculada Conceição: um útero intocado e iluminado, no fato de que, a menina que se candidata a Rainha da Festa da Uva, tem que ser solteira, ou seja, virgem. E o Cubismo é assim: tenta expor todos os lados de uma figura, como aqui no rosto da mulher, iluminando cada porção do rosto, trazendo à tona até as faces mais obscuras e misteriosas da existência. E podemos ouvir o gato miando.


Acima, Jacqueline com Flores. As flores são eternos símbolos de Feminilidade, como num namorado apaixonado, presenteando com flores a namorada. A modelo aqui está de perfil, como numa moeda, exercendo um papel simbólico forte, como o faz a Rainha da Inglaterra, cujo rosto está nas cédulas de dinheiro e moedas. O pescoço de Jacqueline é longo e forte, monumental, um forte pilar pétreo, como numa Evita Perón, a qual, no corpo de uma frágil mulher com câncer, transformou-se em um verdadeiro titã. O pescoço é um tronco de árvore, mais duro do que um poste, com a seiva (e o sangue) circulando pela grande via, como numa avenida de cidade, num vaivém incessante de veículos e pessoas, na demanda da Vida. O olho da modelo é enorme, descomunal, como no grande olho onisciente, o qual tudo observa e controla, como no temido olho de Sauron de Tolkien, um olho que deseja se apoderar de tudo e todos, eliminando a Vida, matando tudo como uma bomba atômica de escala global, no sonho de qualquer psicopata – destruir a Vida, como Hitler, que quase destruiu a Terra ao tentar colocar uns contra os outros, no desejo oculto de Hitler de, depois de vencer a II Guerra Mundial, promover um suicídio coletivo entre os vencedores da Guerra, do modo como o próprio tirano se matou. Aqui, no quadro, as flores são a Vida, o perfume, o lado agradável da existência, e estas flores não parecem ter espinhos. O azul ao fundo é um mar belo, majestoso em sua imensidão, no modo como a Humanidade, um dia, pensou que nada havia além da imensidão do Mar, projetando, neste o fato, que Tao é eterno, e esta é a batalha de um artista – tornar-se eterno, na glória consagratória que é reservada a poucos, no sentido competitivo de que todos buscam tal glória. Mais abaixo no quadro, temos um vermelho vibrante, como um vinho que desce pela garganta e aquece a alma, trazendo um pouco de Vida a uma Jacqueline tão pálida, como se banhada pela luz de um luar, no fascínio que a Lua exerce sobre quem gosta de contemplar a Natureza. Jacqueline usa uma joia que parece ser um relógio, no desejo humano de controlar o tempo e medir este, como nos relógios derretidos de Dalí, no sentido de que e tempo é relativo e mutante, como no fato de que, um dia, o dia na Terra terá 25 horas, sendo inúteis as ambições humanas em querer controla o Universo, e, assim, ser Deus; ser Tao. As vestes desta modelo remetem a ilustrações dos jogos de baralho, numa certa claustrofobia de O Iluminado, no terror de uma prisão dentro da qual um louco que matar tudo e todos. O jogo pode ser um sério vício, com pessoas se endividando. Mas, para Picasso, o único bom vício era fazer Arte, ser original, ser ele próprio, na busca terna por identidade, como nos códigos de barra de produtos no supermercado: De onde vim? O que é parte de mim mesmo? Como na proveniência de zonas como o Vale dos Vinhedo de Bento Gonçalves. E cada cidadão tem seu próprio número de CPF e RG. Esta cena parece se passar numa sacada, em uma noite amena, na qual as flores aqui trazem um perfume tão delicado, fundindo-se ao perfume de Jacqueline. É um dia de festa, e a modelo está devidamente aprumada. Seu penteado é como um labirinto sedutor, que “aprisiona” homens apaixonados por uma mulher tão altiva, monumental como se fosse feita de mármore. As linhas retas cubistas tomam conta da cena, e as flores e Jacqueline são um só ser. Seu nariz é reto, impondo-se. Sua boca é mínima e recatada, como a pequena boca de uma gueixa. Jacqueline e Picasso querem ser respeitados. E podemos ouvir em canto de grilo no canteiro de flores.


Acima, As Senhoritas de Avignon. Um harém de belas mulheres, todas à espera de seu faraó, na tarefa de produzir um herdeiro do sexo masculino, para este menino se tornar homem e reinar com senhor do Egito. Todas as cinco estão nuas, como as Spice Girls, que seduziram o Mundo na proposta de “poder feminino”. Todas as senhoritas aqui, neste quando, são como ninfas em uma casa de banho, dentro da qual não há sexualidade, e umas estão à vontade frente à nudez das outras. Todas são belas, de cinturas finas, e seus seios são monumentais, no auge de sua beleza. Seria este um harém imaginário do próprio Picasso, catarseando aqui uma luxúria? São como as esposas de Henrique VIII, o qual se casou com várias mulheres na obsessão de produzir um herdeiro homem. Todas as mulheres aqui têm descomunais olhos de alienígena, no modo como um artista se sente como um alienígena que veio à Terra, buscando se expressar em uma esfera que tanta dificuldade tem para entender a Arte de um determinado artista. É a trajetória existencial artística – encontrar-se em um Mundo tão duro e incompreensivo, assim como Jesus, em vida, foi altamente mal interpretado. As mulheres estão em movimento, em poses sensuais, como se estivessem debaixo de um chuveiro, tomando um banho coletivo. Podemos ouvir os murmúrios de suas conversas, e elas estão se banhando para encontrar-se depois com o marido, o senhor do harém, em fêmeas que têm a simples função de ser úteros reprodutores, no modo como o machista vê a mulher como mera reprodutora, e a feminista vê o homem como mero reprodutor – dois lados para cada moeda. Todas as mulheres aqui olham para o espectador, e algumas parecem ter máscaras de artesanato, talvez africano, como na soberba coleção africana do Met. Junto na cena há toalhas brancas e translúcidas, secando seus corpos e tornando-se vestes improvisadas. Ao fundo no quadro, vemos janelas que têm vista para um paradisíaco céu azul, intercalado por nuvens de alva pureza. As mulheres aqui parecem ser todas virgens, e nenhuma parece ainda ser mãe, na obrigação do faraó de coitar com todas elas, numa ironia, pois, apesar do faraó ser tão sumamente poderoso, tem este peso sobre as costas, o peso de ser pai de um homem. Mais abaixo na cena, uma pequena fruteira, a qual, deliciosa e suculenta, representa uma certa luxúria da parte do faraó, o qual, apesar de ter sexo “obrigatório”, não deixar de estar excitado com a perspectiva de tem um harém, tendo na Virgindade uma metáfora da Dimensão Metafísica, onde tudo é limpo e imaculado. Cada mulher aqui é uma bolinha de uva, compondo um cacho, um harém. A melancia cortada ao meio é o harém sendo desbravado e desvirginado, e há competitividade, pois cada mulher ali quer ser a mãe do próximo faraó, e esta mulher sortuda, nesse status, subirá na escala social – é a ambição humana. Estas mulheres de Picasso parecem ser pacotes de presente sendo abertos, no prazer da violação de um pacote de presente, o qual é aberto e desvirginado, trazendo algo precioso dentro de si. Cada mulher aqui é um objeto, um pacote de presente sendo aberto, num Picasso fazendo catarse e, assim, respeitando as mulheres, no poder terapêutico da Arte. Apesar de cada mulher aqui ser ela mesma, as cinco formam um só harém. Todas estão no auge da beleza, e, assim que entram em período fértil, o faraó é convocado para fazer sexo com elas. Será que existe hierarquia neste harém? Certamente. A mulher mais ao centro é a principal, causando inveja às demais, em joguinhos de vaidades e intrigas dentro do harém, tendo uma querendo arruinar a outra, numa verdadeira selva. A cena é uma revelação, revelando algo que estava escondido, na defloração do Feminino. Estas mulheres são deliciosas como as frutas da cena, chamando a atenção por sua elevação social, sendo escaladas para o harém, no qual não há espaços para mulheres comuns, do povo. É um conjunto privilegiado, do modo como fica difícil imaginar vida mais enfadonha do que a vida de mulher de harém. Cada uma destas mulheres quer seduzir o faraó, tornando-se a Grande Esposa Real, como o foi Nefertiti, a qual só deu filhas mulheres ao faraó, o qual produziu um herdeiro homem por meio de uma esposa secundária do harém.


Acima, Mulher no Espelho. O espelho é o símbolo de Feminilidade, como no Espelho de Galadriel, que tinha poderes mágicos para ver passado, presente e futuro. A mulher aqui está grávida, e está se olhando em um espelho de formato oval, como o ovo que traz a vida nova, numa barriga que gera um filho, no poder feminino de conceber. É como Narciso, seduzido pelo próprio reflexo e, assim, morrendo. Este quadro tem vários círculos, como esferas de planetas e luas, e os seios da mulher são perfeitamente redondos. Com a ajuda do espelho, podemos ver todas a faces e ângulos da mulher, a qual abraça a si mesma, num processo autocognitivo, em que a pessoa enxerga a si mesma, descobrindo seu próprio papel do Mundo. O quadro todo é bem colorido e alegre, e a estampa ao fundo remete a escamas de peixe, como uma Vênus de Botticelli nascida do Mar, no odor oceânico que seduz marinheiros, com sereias que seduzem e aprisionam, num mito um tanto misógino, como a culpa que Eva teve ao trazer a discórdia à Humanidade. Podemos aqui sentir o cheirinho de peixe fresco, num delicioso salmão ao molho de maracujá. As escamas são como armaduras, trazendo proteção ao frágil Feminino, o qual, sem proteção, torna-se vulnerável e é violentado por criminosos covardes. A mulher aqui é voluptuosa e deliciosa, e seu rosto é revelado de vários ângulos. Seu rosto é redondo como a Lua, trazendo uma monumental Lua Cheia, a qual exerce fascínio desde sempre: Por que a Lua é tão inconstante e o Sol tão constante? Aqui, na mulher, vemos o Yin e o Yang, e Sol e Lua, apesar de serem tão diferentes um do outro, têm o mesmo diâmetro quando vistos da Terra, numa ironia – são tão iguais e tão diferentes. Esta mulher, ao se olhar no espelho, quer se conhecer melhor, quer saber quem ela mesma é, quer saber qual é o seu lugar no Mundo, quer saber absolutamente tudo de si mesma, e este é o poder da Arte – fazer com que o artista saiba de si mesmo. E este afã cubista em revelar todas as faces de um só corpo é o afã desta mulher, a qual quer se desdobrar e se descobrir, sem deixar qualquer parcela de mistérios ou escuridão, trazendo conhecimento, iluminação. Esta cena é como um camafeu aberto, o qual revela uma foto da mãe e outra do pai, trazendo o Feminino e o Masculino, os quais, complementando-se, reinam como Tao, o Uno, que não é o melhor caminho, mas o ÚNICO caminho, do modo como todos viemos do mesmo útero imaculado. E este é o útero desta mulher, uma bolsa que se revela em todas as suas nuances, formas e cores, num caleidoscópio mágico e colorido, na magia das cores de um cristal puro e translúcido, como a Matéria Escura, que une o Universo. Essa transparência é a da mulher neste quadro de Picasso, e a mulher é exposta em todos os seus detalhes, surgindo, então, a Beleza, a qual, ouvi numa canção, tem que brotar na Luz. Pois a Luz é a Mãe da Beleza, no termo latino Lux, que remete a conceitos como luz, luxo e leveza, no poder da Dimensão Metafísica, o lugar que não existe em lugar algum da Dimensão Física; só existe em pensamento, no modo como o Ser Humano evoluiu ao começar a produzir pensamento. O irônico é observar o reflexo desta mulher tem cores e formas diferentes da mulher em si, e o que era para ser um mero reflexo torna-se uma explosão de cores, trazendo diversidade, numa mente fértil como a de Picasso. Fértil como o útero aqui retratado.


Acima, Mulher Chorando. A mulher está ansiosa, roendo as unhas. Podemos ver todas as faces de sua angústia, num Picasso catarseando todo um sentimento de desolação e abandono. Podemos ouvir o choro desesperado, apesar de não sabermos exatamente o porquê de tal pranto. Será por luto? Será por uma decepção amorosa? Será por uma mulher que se sente maltratada? Sua boca está aberta ao chorar, e seus dentes revelam um sorriso frio. Seu semblante é triste, com olhos caídos. Os olhos são dois diamantes que brilham frios em um céu noturno desolado, dolorido. Aqui, Picasso se debruça sobre a tristeza feminina, tentando entender o choro de uma namorada, nos meandros dos sentimentos de uma mulher, um tanto enigmáticos para o artista. Seus cabelos negros são de um negror imprevisível, num luto, num dia escuro que pouco reconforto traz. Estaria a mulher em luto por um ente querido? É o escuro do interior de um caixão lacrado, no negror do Umbral, do Inferno de Dante, no qual não há um pingo de luz, mas escuridão e desolação. Os cílios da mulher são duas aranhas assustadoras, que tecem suas teias de sedução para envolver moscas distraídas, no labirinto em que o Minotauro reina absoluto, alimentando-se de pessoas perdidas em seus meandros. Neste quadro, a cor preta é muito importante, pois é a cor que define formas e limites, num Picasso que encontra sentido na Arte, sentido na definição existencial, debruçando-se sobre o Feminino, tentando entender as mulheres e os sentimentos destas, fazendo da Arte uma lupa, que vê a mulher de perto. Todas as faces da mulher aqui estão expostas, sem chances para mistérios, num Picasso que é um detetive em um romance policial, sempre desvendando mistérios, sempre vendo quem é o assassino, numa aurora esclarecedora, iluminadora. Os dedos da mulher são grandes, como os dedos de Tao, o artesão primordial que criou tudo. As sobrancelhas estão arqueadas, tristes. Sobre a cabeça da mulher, um arranjo exótico e colorido, contrastando com tamanha tristeza, como no arranjo capilar de uma Frida Kahlo, trazendo fertilidade e criatividade. É um arranjo com joias de variadas cores, tropical, exuberante, coroando uma cena tão triste e aterradora. É uma cena de ruptura, talvez de uma mulher sendo agredida pelo namorado, numa mulher que, apesar de amar este, sente que o correto a fazer é deixar o mesmo. Os cabelos da mulher são o curso de um rio, sempre fluindo, sempre alimentando vales, na tarefa da Natureza de nutrir seus filhos, como uma cadela amamentando a prole, sempre dando tudo pelos próprios filhos, como uma mãe zelosa, que sempre faz tudo pelos filhos, num Picasso zeloso, que se tornou mãe de sua própria obra, sempre com amor, sempre com esforço e zelo. Há uma porção neste quadro que é em preto e branco, na realidade nua e crua, sem cores, do dia a dia de uma mãe, a qual tem que zelar pela prole e, ao mesmo tempo, amar a si mesma. É um desafio. Na porção inferior do quadro, tons negros imprevisíveis: O que acontecerá com minha prole no futuro? Na porção superior, tons dourados, na glória de uma mãe amorosa, que sabe que, sem ela mesma, sua prole nada é. É o sentimento de amar que um artista tem em relação à própria obra, sentindo-se vazio quando um quadro é doado ou vendido, como me disse uma pessoa, a qual me descreveu que, quando sua filha casou e saiu de casa, essa pessoa me disse que a sensação com que ficou foi a de que um braço dessa mesma pessoa foi levado embora. As tristezas são naturais na Vida; os sentimentos de perda, também. Picasso tenta expor toda essa angústia, num labirinto de fliperama, cheio de etapas e percalços, que acabam delineando o sentido da Vida – ingresse neste baile e cresça.

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