quarta-feira, 11 de julho de 2018

A Fera Fernando



AVISO: Antes de ler esta postagem, saiba que a próxima postagem, ao invés de acontecer na quarta-feira, acontecerá na sexta-feira seguinte. Depois disso, o blog normaliza e as postagens seguem sendo publicadas nas quartas-feiras. Boa leitura!

O portoalegrense Fernando Baril, o qual pertence à geração de meus pais, é um artista hiperprodutivo, produzindo cerca de trinta quadros por mês. Tenho a lembrança de ter visto o majestoso quadro Meus Jesuses certa vez na Casa de Cultura Mário Quintana, de Porto Alegre. Neste momento, Baril está tendo uma retrospectiva no Museu de Arte do RS. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus.


Acima, Amarras I. Há compartimentos, do modo como a Vida em Sociedade é toda compartimentada em horas, dias, anos etc. Remete ao clipe Human Nature de Madonna, em que compartimentos claustrofóbicos oprimem o indivíduo, oprimindo características naturais como a Sexualidade. É como em Matrix, em que o indivíduo já nasce prisioneiro de um sistema, de um estado totalitário, em que a Liberdade é vista como uma ameaça, uma subversão – é por isso o título Amarras, como numa sessão sadomasoquista, em que o sádico tem que ter o controle a qualquer custo, com a submissão de um masoquista, que se submete a tal degradação, num vínculo conciso: um precisa do outro para ser feliz. Há grades como prisões, do modo como os submundos são prisões, quaisquer submundos, que são realidade paralelas, sem conexão clara com o Mundo em geral, gerando subvalores e conceitos que, fora da “gaiola”, nada significam na prática, no modo como nossos pais nos colocaram no Mundo para o Mundo, e não para um submundo, um mundinho em que os prisioneiros sofrem com uma apatia enorme – é o oposto da Felicidade, da Realização, do Realismo, dos pés no chão, no modo como muitas pessoas mergulham no Submundo e deste jamais saem, pois sair do Submundo é um desafio que requer um esforço enorme do indivíduo. Aqui, há vários rostos femininos, no modo como a sexualidade da Mulher é tolhida pelo Patriarcado, que é uma estrutura universal, em que Adão, ou seja, o Homem Primordial, rege o Mundo, havendo na Mulher um elemento que atrapalha o bom funcionamento da Vida em Sociedade. É uma misoginia sem fim. Vemos um bebê recém nascido, e podemos ouvir o choro dele, no trauma que é vir ao Mundo, saindo do acalento delicioso do útero, num indivíduo que já nasce um escravo, já nasce sem ser dono de si, obrigado a funções sociais, tudo goela abaixo, no ancestral modo humano de agir: Imponha regras; se estas não são obedecidas, force. É o egoísmo humano: “se eu estou bem, o resto que se ferre”. É um quadro sombrio, como nas celas escuras do filme Ilha do Medo, num artista buscando na Arte uma oportunidade catártica, um desabafo, uma autolimpeza espiritual, no poder terapêutico da Vida Cultural. Bem abaixo no quadro, uma forma que parece ser uma Lua Cheia, numa visão de beleza, muito longe da Escravidão, na estupidez de arrancar seres humanos da África e forçá-los a trabalhar, sob ameaça de Morte sobre estes. Este é o modo humano de agir: forçando. Esta lua é pura como uma hóstia, trazendo um pinguinho de esperança a um quadro tão fechado e opressor, no modo como os artistas brasileiros sofreram no Regime Militar, e Baril pertence a esta geração, a qual testemunhou de perto o que é ouvir um “cale-se”, o qual é frustrante para o cidadão artista. Acima no quadro, um recipiente de doação de sangue, mas ele está vazio, pobre, carente, precisando de boas almas, ou como num sistema opressor, que simplesmente suga o sangue de seu cidadão, como num país fechado, doente, com cidadãos miseráveis, o que o Taoismo chama de “guia torto”. Temos um Baril com a coragem de catarsear um sentimento sombrio, no modo como ser artista é botar a cara a tapa, esperando ser compreendido e respeitado. São como compartimentos de uma colmeia, num sistema em que cada indivíduo tem um propósito, um trabalho. É um quadro que mostra a vontade de libertar o Feminino, rechaçando um Patriarcado que, no século XXI, dá sinais de enfraquecimento, pois tudo é processo, e a Humanidade está em pleno processo de depuração. Ao lado direito da “hóstia”, um belo corpo de mulher, num biquíni sumário, no modo como a sensual mulher brasileira dá um jeitinho para fugir da opressão patriarcal.


Acima, Amarras II. A armadura é a blindagem psíquica, na necessidade do indivíduo saber dizer “não”, obtendo o controle sobre a própria vida. A armadura é a alma de guerreiro de um artista, num Baril que atua há décadas, conquistando o respeito do público. É a garra, a força, a vontade de vencer, tendo a força para virar as páginas e tocar a Vida para frente, sempre, pois a página, seja doce ou amarga, sempre tem que ser virada. É a proteção das eventuais flechas que podem querer atingir a pessoa, como críticas infundadas ou como subestima, na luta que faz um artista ao querer ser reconhecido. É o lado Yang da Vida. O fundo cor de rosa traz uma certa feminilidade, como na cor de um bordel, ambiente que “cheira” a sexo, na sensação de virilidade que toma o homem que vai para o puteiro. Ao lado da armadura, uma mulher toda fragmentada, analisada, seccionada em partes para que a mulher seja compreendida pelo Yang. A mulher está quase nua, com sutiã, com seios cônicos que mostram o auge de uma beleza. Mais abaixo, uma vulva desprotegida, como uma indefesa princesinha, a qual precisa ser salva pela fálica lança de São Jorge, matando o dragão da animalidade e purificando o Feminino, na vitória da Sabedoria sobre a Malícia. A cabeça da mulher tem vários buracos, como numa estrada irregular cheia de crateras, na provação que são os caminhos tortuosos da Existência, numa estrada cheia de curvas imprevistas, na aventura que é a Vida, na aventura que é a construção de uma carreira. A mulher sorri suavemente, com um sensual batom rubro, e está careca, como um feto, numa porção do ser humano, porção esta que nunca deixa de ser criança, no modo como é necessário que indivíduo mantenha-se sempre jovial, e nunca muito rançoso. Ao lado da mulher, uma rosa, o presente clássico do Dia das Mães, no reconhecimento da Feminilidade como co-construtora do Mundo, ao lado dos padrões patriarcais, numa união de forças: a mulher cuida da casa e o homem sai para trabalhar, numa sociedade, numa simbiose, no modo como cada artista tem que conciliar dentro de si seus próprios Yin e Yang, sempre atento para não projetar em outrem coisas deste mesmo artista. Logo atrás, terno e gravata, no traje oficial de um homem trabalhando, assumindo inúmeras responsabilidades, gerenciando negócio, o podemos ouvir tocando o telefone do escritório, nas responsabilidades de um homem adulto, que precisa sustentar uma esposa e filhos, numa angústia mínima: Será que vou ganhar dinheiro para sustentar os meus? Coroando o terno, vemos uma forma misteriosa, parecendo ser uma coroa com uma cruz na frente, talvez a Coroa Papal, na autoridade de uma elite sobre todo um sistema, numa hierarquia: padres, bispos, arcebispos, cardeais e Papa, na inevitável hierarquialização do Mundo. É o Direito Divino de um monarca, sendo o faraó um representante de Tao na Terra, mas num faraó que, na real, nunca será Tao de fato. São as ritualizações humanas. Mais ao fundo, duas cabeças também carecas, e a Calvície é o Realismo, a falta de construção de ilusões, na necessidade de um artista em se manter o mais real possível, rechaçando ao máximo quaisquer submundos dantescos. As sobrancelhas delineadas são a disciplina de uma pinça, no trabalho constante de um artista que trabalha consideravelmente, calando a boca daqueles que acham que os artistas são vagabundos imprestáveis. Mais ao fundo, há uma bela moldura torneada, a qual é a imposição de limites, no modo como é sábio um homem que sabe até onde pode ir, obtendo Humildade. Acima da moldura, um cabideiro, sustentando peças, organizando uma cena e dando ao artista um sentimento de organização existencial, na qual tudo está em seu lugar, exalando Paz, pois feliz é aquele que não declara Guerra contra si mesmo. A armadura e a mulher formam um belo casal, sendo faces da mesma moeda, numa cena que parece ser um casamento pós-moderno, revolucionário e, ainda assim, respeitando a Tradição, como dizia Osho: o bom rebelde sempre respeita a Tradição.


Acima, Cachorro. É uma cena de confinamento, do modo como a Carne é a prisão do Espírito, num Baril catarseando o sentimento de reclusão. O cão é o guardião do Lar, mas aqui está acorrentado, purgando dias e noites de aprisionamento. A etiqueta à esquerda, com o nome do artista, é a identidade, a identificação com algo, com algum grupo, num Baril respeitado pelos outros artistas plásticos de Porto Alegre. É como o código numérico no pingente de um soldado, ou no código de nossas carteiras de identidade, ou uma tatuagem numérica, identificando prisioneiros num campo de concentração, no sentido da Igualdade, no qual cada um de nós tem um número, e ninguém é melhor ou pior do que ninguém, como anônimos espermatozoides, competindo pelo mesmo óvulo. É a competitividade da Vida em Sociedade. O fundo do quadro, com pintinhas, é como um formigueiro cheio de formigas, sendo umas iguais às outras, trabalhando em conjunto em prol do formigueiro, em prol da grandeza da Vida em Sociedade. A partir desse número identificador, cada indivíduo precisa desenvolver sua própria identidade, sua própria diferenciação, e é da Igualdade que nasce a Diferença, numa contradição muito irônica. São as pintinhas de um dálmata, na concorrência entre cães de raça e viralatas, numa sociedade estratificada, piramidal, com uma aristocracia ao topo, num indivíduo que nasce escravo de um sistema opressor. As pintinhas são como uma chuva de piche, que suja ao invés de lavar, na sujeira inevitável da Dimensão Física. A caixinha aprisiona o pobre bicho, que tem que se contentar com migalhas, alimentando a Fé e a Esperança de que, após o Desencarne, existe uma vida consideravelmente melhor, sem desemprego e sem dor. A caixinha faz alusão à gíria “ficar na casinha”, a qual significa que cada um tem que viver sua vida sem incomodar os outros. O “sair da casinha” é o indivíduo que se excede e perde o foco da Vida em Sociedade, tornando-se uma pessoa marginalizada. A corrente é o elo entre as pessoas, num engajamento de rede, no qual há uma comunhão, uma vida em comum, no modo como a Unidade organiza o Universo: Todos são filhos do mesmo útero, e, ainda assim, cada um tem que ser ele mesmo, no processo de identidade no qual cada indivíduo tem que ser autodidata. Aqui, o cachorro tem um olhar esperançoso, de quem tem a fé de que um dia será libertado, podendo viver a Vida em plenitude, sem tantas correntes, sem tanto confinamento, sem tanta sensação de despertencimento, pois, na Dimensão Metafísica, o sentimento de pertencimento é supremo, constante e inabalável. Acima e abaixo da caixinha confinadora, fios que parecem ser elétricos, negros, agourentos, prendendo as percepções de um cidadão escravizado por um sistema. São cobras malévolas que enforcam e matam; são o curso de um rio altamente sinuoso e traiçoeiro; são minhocas sob a terra, fadadas a servir de alimento a um pássaro, a um sistema; são o oposto da Liberdade, construindo falácias ideológicas, no modo como o Ser Humano tem um talento para produzir ditaduras; são dutos intestinais da mente artística, sempre observando o Mundo de forma singular, na percepção pessoal de cada artista, havendo na Arte um canal para que uma mente se expresse sem imitar outrem. O intestino vai processando o cidadão, até eliminar este, num sistema em que a pessoa é uma mera bateria alcalina, desprezada depois de não mais servir ao sistema, numa metáfora da Psicopatia: quando o sangue da jugular seca, o vampiro parte em busca de outro pescoço. Temos um Baril que mostra o poder libertador da Arte, a qual deve ser acompanhada pela Liberdade de Expressão, pois, do contrário, não é Arte, mas uma propaganda comunista.


Acima, Jesus Cristo Cruzado com o Deus Shiva. Baril entende que o Ser Humano é universal, e nisso se incluem as religiões, pois é humano refletir sobre o Material e o Imaterial, do modo como o Monte Olimpo, para o grego antigo, significava um mundo metafísico, espiritual. É engraçado como os deuses hindus se parecem com aranhas, com várias patas, e cada braço é um atributo, mostrando deuses repletos de atributos, deuses estes que servem de referência espiritual ao indivíduo fiel. Jesus na Cruz é a imagem da humilhação, da danação, da dor, num homem que trouxe uma mensagem muito importante ao Ser Humano. Aqui, os braços superiores se ramificam como árvores, na semelhança entre o formato de vasos sanguíneos e de galhos vegetais, na força da Natureza, como poderosos raios e trovões, identificados como a divindade nórdica Thor, pois o Ser Humano busca explicações para o mundo no qual encarnou, e as religiões são essa tentativa cognitiva, no modo como a vastidão imensurável do Universo tem que, no frigir do ovos, ser atribuída a um Ser Supremo, a uma Inteligência Maior, e a crença em Deus, em Tao, é tudo o que resta ao Homem, pois não existe livro dizendo quem ou o que é Deus, no poder do Infinito, enorme demais para caber na cabeça finita do Homem. A Coroa de Espinhos é o peso de uma responsabilidade, no peso sobre a cabeça que reina, na majestade de ordem divina. Os vários braços nesta cena estão desmembrados, decepados, como num açougue. Uma mão segura um peixe, na Mãe Primordial que é o Oceano, e podemos ouvir o barulho de ondas arrebentando, no odor sedutor do Mar, a Casa Primordial de Tolkien, chamando seus filhos para o inevitável (e maravilhoso) retorno, na Lei do Eterno Retorno; outra mão segura um cachorro quente, símbolo da comida contemporânea, da Vida na Cidade, do modo como a fastfood é divinizada pela Cultura de Massa; outras mãos são robóticas, como máquinas, no modo como o Pensamento Racional faz metáfora com a Tecnologia Digital, na evolução técnica do espírito, e estas mãos sangram, como se fossem um robô humano, uma máquina com sentimentos, no modo como a paixão faz sofrer, numa cena de tanto sofrimento como a Crucificação; outras mãos usam luvas de boxe, na batalha diária de um artista em busca de si mesmo, em busca de ser compreendido pelo Mundo, pois a Vida é luta. No topo da Cruz, uma inscrição – será que em Hebraico? A data, do ano de 1996, traz aqui um microcomputador que, na época, era o chuá da Tecnologia, fazendo metáfora com o pensamento racional, que é necessário para abrandar sofrimento, na questão da mortificação espiritual, sendo esta exaltada pelo Espiritismo, sendo a mortificação, a morte das tolas ilusões, absolutamente capital no progresso existencial. Este Jesus calça um par de tênis, informal, jovial, despretensioso, na simplicidade das grandes mentes, das grandes pessoas, como numa Eva Sopher, certamente uma das pessoas mais respeitadas da História de Porto Alegre, com o famoso molho de chaves da guardiã do Theatro São Pedro, como chaves de um tesouro inestimável. Aqui, um portarretrato com Marilyn Monroe, figura tão constante na Pop Art, movimento que exaltou a Cultura de Massa do Século XX, como vemos também aqui uma lata de sopa tomate e uma garrafa de Coca-Cola, na inevitável industrialização global, numa ironia: vender uma obra de Arte que retrata bens de consumo. Esta Marylin fuma, no poder sedutor do tabaco, o qual prosperou em épocas em que ainda era permitida a plena propaganda da Indústria Tabagista. Vemos também uma pistola reservada, desativada, numa reserva de defesa, na necessidade do indivíduo desenvolver um tanto de Agressividade, num mundo competitivo, onde um indivíduo quer brilhar mais do que o outro. Também vemos um ratinho albino, significando a pureza com a qual um artista concebe algo, sem malícias, sem ambições, mas com zelo e propósito. O fundo do quadro é o Céu, é claro, na morada tão falada pela boca de Jesus, num conceito desenvolvido posteriormente pelo Espiritismo.


Acima, O Halterofilista. O modo como a Sociedade cobra do Homem o pleno desenvolvimento de agressividade, como no herói Hulk, que é 100% agressividade, sequer com uma pontinha de charme ou cavalheirismo, mas uma força bruta da Natureza, destrutiva como um vulcão ou uma tempestade. O halterofilista se esforça para desenvolver a musculatura o máximo possível, nunca contente, sempre querendo ter mais e mais músculos, no modo como a pessoa extremamente atlética tem que cuidar para não se tornar uma pessoa desinteressante, para não se tornar uma pessoa obtusa, que só sabe falar de atividade física, como vi num filme de Woody Allen, em que um casal se diz feliz por ambos serem vazios e nada terem de interessante para pensar ou falar. A beleza do corpo humano é ancestral, muito antiga, no modo do Ser Humano observar a obra de Deus, no modo como Deus concebeu Adão atlético, sem uma gota de gordura no corpo, como nos corpulentos homens de Aldo Locatelli, que são homenzarrões vigorosos, entalhados na dureza do dia a dia. Atrás do atleta, um alvo, na formação de um objetivo, que é vencer um concurso de Halterofilismo, superando todos os concorrentes, na versão masculina de um concurso de beleza feminino: o Homem tem que ser agressivo e a Mulher tem que ser vaidosa, no modo como o Ser Humano é um animal ritualístico, sempre tentando entender os mistérios universais. Aqui, o halterofilista tem um pênis desproporcional, como o de Adão na pintura célebre de Michelangelo, talvez um homem que tenha decidido ser musculoso por ter um complexo de pênis diminuto. Aos pés do alvo, um portaflechas, cheio de objetos pontiagudos e abrasivos, como pirâmides que representavam o temido poder do Egito Antigo. As flechas são a reserva bélica, à disposição para qualquer possibilidade de atrito, do modo como os republicanos nos EUA pregam o lobby das armas e acreditam que todo cidadão deva caminhar na rua armado. A questão do megamacho, do macho alfa, é expressada no corpo musculoso, como He-Man, o homem mais poderoso do Universo, no modo como Trump se sente o machão alfa. Mas essa polarização tem um oposto, que é a superfeminilidade, expressada nos sapatos femininos de salto alto que o halterofilista aqui usa. É uma latência, num indivíduo que pode ser muito macho e, ainda assim, feminino, nas inevitáveis contradições entre as forças opostas que regem o Universo, no discernimento taoista: se digo que algo é belo, é porque conheço o oposto, que é feio, no modo como o liso e o áspero são faces do mesmo trabalho – nada de errado em encarar dificuldades. Aqui, os pés do atleta estão pregados com pregos longos, como os pés de Jesus crucificado, no modo como um atleta tão desenvolvido sofre diariamente na luta por um corpão, como já ouvi na televisão: vida de halterofilista é sofrimento! A pessoa com corpão paga um preço tão alto por tal condicionamento físico, que esta mesma pessoa faz questão de se desnudar em público e mostrar o resultado de seu empenho e de seu sacrifício. Na cabeça deste atleta, uma explosão de elementos gráficos, como um garfo, uma câmera filmadora e óculos escuros, elementos do dia a dia que Baril traz como parte inevitável da Vida Contemporânea. O rosto do atleta está quase todo encoberto, como se tivesse vergonha de ser alguém sem vida intelectual. Este homem é prisioneiro do próprio corpo, numa cena um tanto sadomasoquista, num Baril que catarseia um sentimento de aprisionamento. O corpo cruza o quadro de ponta a ponta, como uma cidade pulsante e desenvolvida, num Arnold Schwarzenegger fisiculturista que brincou ao dizer que ele mesmo era o navio de Titanic, como o homem musculoso que leva o Mundo nas costas.

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