A americana Judy Pfaff é
famosa por suas instalações ousadas e suntuosas, tendo já recebido numerosos
prêmios. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa
leitura!
Acima, Blue Note. 2014. Os fios são um sistema complexo, emaranhado, num
Mundo em que o galgar tecnológico é vertiginoso, como na extinção das mídias CD
e DVD. Temos uma JP que vive no Mundo da Internet, entendendo como a Rede está
mudando o Mundo, e mudando rapidamente. São como veias e artérias de uma cidade
vibrante, cheia de novidades e exclusividades. São raios de tempestade
exercendo seu avassalador poder, no modo como um artista ambiciona ser “uma
força da Natureza”, na tentativa humana de se parecer com os deuses, com os
seres maiores, como nossos irmãos elevados e depurados. Aqui, temos vários círculos,
como na obsessão de Yayoi Kusama por círculos e bolas. Aqui são como doces
lindos e sedutores, à venda, no pecadinho da Gula, no fato como, nas Cidades
Metafísicas, há deliciosos doces para serem degustados, só que doces leves, que
não entorpecem a corrente sanguínea. Vivemos num Mundo altamente interconectado,
numa pluralidade, no modo como as diferenças, as inevitáveis diferenças, têm
que ser respeitadas. Vemos, mais à direita, um grande círculo laranja, no
formato do seio feminino, no organismo provedor, que alimenta o feto e traz um
bebê ao Mundo, no modo como todo artista é mãe, na tentativa humana de
compreender os enigmáticos meandros da Vida, da Biologia, na extrema intimidade
entre filho e mãe, no Amor Incondicional, o grande bem espiritual que rege a
Vida em todas as dimensões, no modo como, na infeliz Terra, tudo gira em torno
de dinheiro, num artista se deparando com uma Nova York na qual Arte e Dinheiro
são gêmeos siameses – como pode um artista ser materialmente desapegado em meio
a tantas ambições de sucesso, num Mundo que pressiona o indivíduo e fazer com
que este deseja ser, simplesmente, Deus? Aqui, a instalação está suspensa,
sustentada, como se fosse leve como ar. Os fios elétricos sugerem a força da
eletricidade, no célebre choque de Lasier na Festa da Uva. É como uma instalação
que vi certa vez, de um artista que instalou estruturas mecânicas magnetizadas
em meio a um temporal, com os poderosos raios, nas marteladas de Thor, exercendo
seu poder cru e impactante, até traumático. O Ser Humano quer entender o Mundo
que o cerca, no modo comum de deificação, identificando com deuses os elementos
naturais, como o Sol, a Lua e o Mar. Estes círculos de JP são intrincados
engenhos metalmecânicos, na demanda industrial de bens sendo produzidos, na
pujança da China, por exemplo, tornando-se um gigante econômico. Estas formas
coloridas estão suspensas como um sonho, num artista sonhando em causar impacto
e ser valorizado, na luta incessante que é a vida de um artista. São como coloridas
serpentinas, alegres, insinuando-se como serpentes da fertilidade, na magia dos
córregos, rios e lagos, nas veias da Natureza, a Enigmática Mãe. É como uma
banda de música, um conjunto no qual cada componente tem sua contribuição, num
grupo coeso, unido, que sabe funcionar como equipe, com bandas longevas como o
U2, num casamento sem sexo. E como temos que ter paciência! Os círculos são
como planetas de um mesmo sistema, filhos de um mesmo senhor, num baile, uma
coreografia de círculos concêntricos, como num bioma, em que cada ser tem um
papel relevante, não havendo pessoa irrelevante, apesar de tantas pessoas, de
baixa autoestima, acharem-se irrelevantes. É uma explosão orgásmica, num
estouro como o poderoso Big Bang, no momento de ruptura divina em que o Cosmos
foi idealizado, havendo no popstar uma tentativa de reproduzir tal estouro, mas
um estouro de Arte, de comoção, como uma facada nos preconceitos patriarcais,
preconceitos que veem com maus olhos a mulher independente. Esta estrutura avança
sobre o espectador, numa avalanche de cor e sensibilidade.
Acima, Capella. 2005. Judy
Pfaff & Jane Rosen, Braunstein Quay Gallery, San Francisco, CA, EUA. Temos aqui uma pitadela de Mondrian, só que com mais
cores, com ênfase aos tons de magenta, numa JP doce, cândida, de quem não perdeu
toda a inocência infantil. É um móvel com várias gavetas, como pastas de
arquivo num computador, fazendo metáfora com a própria mente humana, um lugar
abstrato onde a pessoa arquiva informações, procurando organizar e levar uma
vida positiva e produtiva. Há gavetas proeminentes, avançando agressivamente,
como um vendedor que vai à procura do cliente. Aqui, há um constante movimento,
numa mente dinâmica, no poder da simplicidade de design, nunca cometendo
excessos nem sujeiras desnecessárias, num desenho que sabe que ser simples é
ser limpo, prestando atenção apenas ao que é importante. Temos uma Judy
namorando como design de móveis, como móveis sob medida, num projeto que busca
trazer o maior prazer possível ao cliente, satisfazendo este. Algumas dessas
gavetas em magenta lembram tapumes de construção, tapumes magenta, no recato e
no pudor, cobrindo a aparência feia de um prédio em construção, só removendo os
tapumes quando o projeto estiver pronto para ser lançado e comercializado. De
um certo modo, a vida de qualquer pessoa está sempre cercada de tapumes, pois,
conforme a Dialética, tudo é processo, ou seja, nunca há um ponto final, havendo
no Desencarne uma vírgula, nunca um ponto final. Podemos ouvir o som de abre e
fecha, num móvel extremamente útil, sendo utilizado intensamente, servindo ao
Mundo, na dignidade das pessoas que querem servir, como Tao, que é a Dignidade
Suprema, havendo nos Seres Humanos meros aprendizes. São como teclas de um
piano colorido, na leveza atingida somente pelo intenso praticante, como os
dedos delicados de grande dama ao piano de Diana Krall, no modo como o
instrumento acaba se tornando uma extensão do corpo do artista, numa relação de
intimidade, de costume, como um bebê, íntimo da mãe grávida, numa comunhão,
havendo na mãe o primeiro amigo da pessoa no Mundo. O artista benevolente se
torna célebre, sempre humilde, nunca se gabando, pois se você acha que você é
um sucesso, não trompeteie este mesmo sucesso! Aqui, são como apartamentos de
um mesmo prédio, num prédio luxuoso, num projeto inspirado na Simplicidade.
Mais acima na estrutura, uma janela em vão, vazia, deixando o ar circular. É a
Janela da Vida, deixando que os sentimentos sejam ventilados, nunca deixando o
ar ficar estagnado, no modo como a vida da pessoa estagna quando esta pessoa
acha que atingiu a perfeição. São como várias canchas de tênis em um mesmo
parque de torneios, com muitas partidas acontecendo ao mesmo tempo, numa agenda
vibrante, cheia de craques competindo pelo “óvulo”. É a inevitável
competitividade da Vida em Sociedade, num contexto que faz capital a
necessidade de desenvolvimento de agressividade, fazendo com que o homem
feminino se torne um saco de pancadas. São vários lotes em um condomínio de
luxo, com terrenos amplos, vazios, prontos para receber o sonho de arquiteto. É
como o loteamento na Colônia Italiana no Rio Grande do Sul, arrendando terras e
fazendo o imigrante trabalhar intensamente para o pagamento da dívida para com
o Império Brasileiro. São como livros acondicionados em prateleiras, na riqueza
de uma biblioteca que tem livros sobre quaisquer assuntos, no acúmulo de
Conhecimento, na tentativa de erguer o Ser Humano à condição de ser apolíneo,
pensante, civilizado, no modo como a Educação Brasileira é tão sucateada, tão
subestimada. Aqui, temos um código duro de computador, com informações frias,
na construção técnica do espírito, fazendo com que o instintivo sofra a
influência do racional, fazendo da mortificação tão necessária; fazendo com que
a pessoa observe o Mundo do jeitinho que este é. São como tijolos reunidos
pacientemente, num trabalho incessante de esforço, sempre querendo fazer do
Mundo um lugar melhor.
Acima, Emanation. Art plus Process.
2015. Gotas caindo do teto, como goteiras
invasivas, desrespeitando o concreto e se infiltrando em brechas da Vida em
Sociedade, do modo como um psicopata ardiloso se aproveita dessas amplas
brechas. Temos uma Judy suntuosa, que não se contenta com pouco, numa artista
absolutamente antissimplória – Judy não faz qualquer coisinha. Essas gotas são doces caramelos, num coração
que se derrete perante um novo amor, um novo namorado. Esta sala, em estilo
neoclássico, entra em contraste com uma Judy bem pós-moderna, avançada,
pervertendo os padrões tradicionais estéticos. As grandes bolas vermelhas no
teto são como casulos, dispositivos transformadores, como a lagarta que se
torna borboleta, no patinho feio vencendo as vicissitudes e se tornando cisne,
na luta incessante que é a Vida. E aquele que é subestimado, vence o jogo,
surpreendendo o Mundo, num artista que precisa ser “engolido” por muitas
pessoas. Os casulos rubros são vibrantes, da cor vital do sangue, no sangue que
interconecta todos os seres vivos, na seiva que faz com que sejamos filhos no
mesmo Imaculado Pai. Estas gotas têm movimento, e quase tocam o chão, num
efeito dinâmico, numa obra que parece ter movimento. Podemos ouvir o som
gotejante, como num lugar úmido, como uma sauna, no reconfortante barulho
aquoso, que nos remete ao conforto uterino do Lar, do universal receptáculo que
faz com que sintamos a sensação gloriosa de Paz e Prazer, batendo de frente com
as pessoas que, simplesmente, não permitem a si mesmas terem prazer, pessoas
que fazem um bloqueio cheio de (desnecessária) culpa. Estes casulos têm
artérias entrelaçadas, como numa cidade dinâmica, vibrante, com vias
movimentadas e vida cultural sedutora, na sensação gloriosa de visitar um
grande centro urbano, como o novaiorquino, com tantas mostras e espetáculos
acontecendo, na vida incessante das cidades espirituais, cidades que nada têm a
ver com a feiura morta cemiterial. Podemos sentir um feminino perfume de
tutifruti, de morango, de cereja, no prazer de ir a um buffet de sorvetes e
montar o seu próprio sundae. Mais à esquerda, vemos um lustre rebaixado, de um
design moderno que contraste com os lustres clássicos do ambiente primordial. O
lustre moderno lembra a deslumbrante loja Cristais de Gramado, um lugar cheio
de produtos pertinentes em vidro, com joias e vasos, havendo no vidro derretido
um barro primordial com o qual o artesão molda os próprios sonhos de concepção,
na magia das Artes Plásticas em transformar materiais e conceber algo novo. As
mãos de um artista são transformadoras, querendo curar os preconceitos
viscerais do Mundo. Na extrema esquerda, vemos outros casulos, só que mais
transparentes, como o Cosmos, extremamente translúcido, deixando que observemos
galáxias muito, muito distantes. O artista é uma espécie de telescópio,
revelando coisas, antes despercebidas, fazendo associações inéditas, numa
demonstração de Inteligência por parte do “artesão”. Na extrema direita,
cristais transparentes, gélidos, frágeis como bolhas de sabão, efêmeros, no
modo como os momentos existenciais passam, e a pessoa nota a necessidade de
“tocar o barco”. Podemos ouvir o tilintar dos cristais tocando uns aos outros,
numa pureza cristalina, numa casa muito limpa, com decoração simples, sem
excessos nem frescuras. E estas veias de serpentina são como novelos sendo
desdobrados, com uma pessoa querendo encontrar o fio da meada, tocando o fluxo
para frente, querendo compreender um Universo tão vasto e enigmático, tão além
de nossa compreensão. É o Grande Plano Divino, do qual pouco sabemos; apenas o
vivemos. Aqui, são os inúmeros ovos colocados por uma tartaruga, com poucos
filhotes que conseguem chegar ilesos ao Mar e virar adultos reprodutores, no
modo como a Vida impõe a necessidade de sobrevivência, exigindo que o Ser
Humano tenha muita força para encarar a própria Encarnação.
Acima, Hanging Judge. 2014. São raios negros de tempestade, talvez
anunciando um agouro, um mau presságio. Quase tocando no chão, um corpo negro,
necrosado, talvez de uma ave, numa carcaça sem vida. Esses raios negros estão
presos ao teto, parecendo ser providos pelo teto, numa referência de lar, de
proveniência. A estrutura aérea desta instalação sequer toca o chão, como um
Davi de Michelangelo não chega a tocar no dedo de Deus, numa relação de quase
felicidade, de quase realização, no modo como ninguém, em vida, consegue se
encontrar por completo, não havendo perfeição na Vida Material, mas sim
percalços e tristezas, até frustrações. É a cor negra da Depressão, uma doença
na qual a pessoa é acometida por um fortíssimo choque de frustração, não mais
encontrando sabor na Vida, no dia a dia. É como um peixe preso numa rede de
pesca, na prisão do corpo encarnatório, sendo impossível o desligamento à
vontade da pessoa; só possível à vontade dos planos da Divina Providência. Ao
fundo, à esquerda, vemos dois rostos, talvez o da Comédia e o da Tragédia,
complementando-se, no sabor agridoce das vivências, com noites e dias se
entrelaçando. São gêmeos, que compartilham uma barriga, na Vida em Sociedade,
que é um compartilhamento. São duas asas da mesma borboleta, no desejo de alçar
voo, de se libertar, buscando na catarse artística uma válvula libertadora de
escape, no sentimento de descarrego, depois de uma grande tempestade negra, a
qual é seguida pela bonança. É o velho recurso de contraste do Design, na
beleza dos opostos sendo encontrados juntos, talvez numa Judy romântica,
querendo conciliar opostos. É como a Lua em momento de eclipse, sendo engolida
por um dragão cor de sangue, sendo libertada logo depois, sobrevivendo e
fazendo-se mais forte, na gigantesca força exigida para que o indivíduo dê a
volta por cima. Atrás dessas veias negras, vemos outro elemento, num grande
mural com formas indefinidas, com cores que vão do ouro, ao prata e ao bronze,
na magia do pódio, revelando o vencedor, o melhor, na natural competitividade
entre as pessoas. São os metais nobres, em hierarquia, fazendo metáfora com a
preciosidade de uma alma boa, benéfica e construtiva, havendo no ouro uma mera
imitação material da virtude imaterial. Desse modo, quanto mais realista, mais
a pessoa se livra das ambições materiais, como colecionar joias, pois Tao já
disse: “Se você não comprar tesouros, ninguém vai querer os roubar”. Portanto,
esvazie o portajoias! Preso nesta teia emaranhada, vemos também, no meio de
tudo, asas negras ceifadas, com os sonhos frustrados de uma pessoa sensível, no
modo como o Mundo pode ser complicado para uma pessoa sensível demais. É o Anjo
da Morte, que vai chegando de mansinho, até impor o momento do Desencarne, no
ponto inevitável de “bater as botas”, como diz o mago Gandalf: “Temos que
decidir o que fazer com o tempo que nos é dado na Terra”. Esta teia negra busca
fazer uma limpeza, uma depuração, captando o desnecessário e estabelecendo
somente o que é útil para se ter uma Vida saudável e desprendida. Estas veias
são verdadeiros labirintos, fazendo com que tantas e tantas pessoas se sintam
perdidas e desnorteadas, até o momento em que um centro, um Norte é
estabelecido pelo indivíduo, matando, assim, a charada: “Decifra-me ou
devoro-te”. Bem ao fundo nesta instalação, no cantinho da sala, estruturas não
muito nítidas, parecendo ovos prateados, na magia de um ninho que gera Vida.
São os ovos colocados por uma mosca, no irrefreável ritmo de um centro urbano
cultural, havendo na Arte o capital papel de Saúde Mental Coletiva. Esses ovos
de prata causam expectativa, pois o que será que virá? No modo como um ardoroso
fã se pergunta o que seu artista predileto “está aprontando”. E esses ovinhos
também não tocam o chão, havendo na intocabilidade uma metáfora com o comportamento
limpo e virtuoso, um comportamento imitado maliciosamente pelo sociopata, o
qual, por sua vez, é uma piada.
Acima, N.Y.C./B.Q.E.. 1987. Whitney Biennial, Whitney Museum of American
Art, New York, NY, EUA. Esta obra passou
pelo museu novaiorquino que trata exclusivamente de Arte Americana, e
infelizmente não pude visitar a instituição em minha ida em 1998 à Big Apple.
Aqui, temos uma explosão orgásmica, na liberação de coisas muito boas e
prazerosas, como uma supernova estourando, causando suas comoções, abalando
percepções, na vocação do grande artista em sensibilizar o Mundo. Temos uma
Judy amante das listras, num contraste próprio de placas de trânsito, querendo
chamar a atenção, tendo a maior clareza possível, na simplicidade das grandes
mensagens. Esta explosão abraça o espectador, e temos uma candura, como
caramelos coloridos e sedutores, na doçura de um momento como o de um grande
amor, inundando a pessoa de felicidade e satisfação. Na extrema direita
inferior, uma mesinha com duas cadeiras, num charmoso café parisiense, no
prazer em sentar, degustar alguma bebida e simplesmente ver a Vida passar, com
pessoas indo e vindo, cuidando de suas vidas, com pessoas finas, deixando no ar
um perfume, uma fragrância de polidez e civilidade. É o dom do artista em
observar o Mundo, inspirando-se a fazer Arte, querendo compreender este mesmo
Mundo. Perto da mesinha, vários círculos que lembram cachos de uva, no perfume
da estação da colheita, com abelhinhas ensandecidas, querendo extrair o doce da
fruta. É a sensualidade das vindimas, lotando a Itália de sabor e poesia nos
meses de verão, havendo na vindima a celebração da Vida e do Trabalho. Esta
instalação tem vários elementos de fios de ferro, e esta obra avança, e parece
que vai cair no chão, como se fosse uma pintura que adquiriu forma em três
dimensões, como se fosse um filme em 3D, na tentativa de um cineasta em dar ao
espectador a experiência de fazer parte da película. É como uma borboleta
rompendo o casulo e renascendo, bela, como uma pessoa que desencarna e
rejuvenesce, numa borboleta colorida pronta para a Vida, pronta para a explosão
primaveril, na explosão de Vida, como uma gata no cio, louca para sair à rua e
procriar, como tenho a lembrança de um professor de Física no Ensino Médio,
quando, em plena
Primavera, o professor se irritou com a instintiva
inquietação dos adolescentes, e resolveu concluir a aula muito antes da hora de
terminar a aula de fato! Temos uma Judy sedenta por Vida, vibrando junto a
grandes centros como o novaiorquino, querendo fazer parte da vibrante agenda de
um lugar tão emblemático, querendo obter um papel (importante) nessa cena
cultural. Junto à parede vemos pintadas formas de tijolos, numa artista querendo
compreender o que há por trás das coisas, na curiosidade de um cientista em
desvendar os segredos do Universo. Os tijolinhos são o trabalho paciente, como
um ator, tendo que ter paciência e disciplina para compreender e interpretar um
personagem. Os vários círculos aqui são discos sendo jogados, num esporte. São
os discos lançados pelos músicos e cantores, tentando “decepar as cabeças da
percepção”, buscando ser tocados nas rádios e em festas. As listras são
como barras de prisão, no corpo carnal que abriga o espírito – pergunte a um
prisioneiro se este gosta da prisão. Na extrema direita, temos um retângulo que
parece ser um arco-íris, na bonança depois de uma horrorosa tempestade, num
indivíduo que começa a compreender que o próprio tem que reagir se (re)erguer.
É como uma esteira de praia, no prazer de chegar em uma praia e tomar uma água
de coco. É como um toldo, que protege do Sol, no modo como a pessoa tem que se
proteger para não se magoar. Vemos também, pela instalação, formas que parecem
livros sendo abertos e folheados, como um leitor “desvirginando” um livro,
folheando, desbravando terras devolutas, na figura de liberdade que é um livro
sendo aberto. É como um calendário, sendo folheado, marcando a passagem de
tempo, num presidiário que conta os minutos para voltar ao Verdadeiro Lar.
Acima, Neither Here Nor There.
2003. Ameringer/Yohe Fine Art, New York, NY, EUA. Uma artista com o talento para fazer móveis, moldando
a madeira em formas ornamentais, no prazer de moldar um vaso de cerâmica, como
a idosa Rose, em Titanic, com suas
velhas mãos ainda servindo ao Mundo, na dignidade de uma artista servindo ao
Mundo, como me disse minha falecida avó materna, mostrando as próprias mãos: “Estas
mãos foram úteis ao Mundo, pois, com elas, lavei, passei, cozinhei e costurei”.
Nesta instalação, há um movimento que não nos deixa saber se estas formas estão
caindo ou ascendendo, numa confusão entre base e teto, no talento de “virar o
Mundo de cabeça para baixo”, como na morte de Elis. Aqui, a brancura traz
pureza, como uma virgem folha em branco, pronta para ser preenchida por um personagem,
no talento do grande ator, havendo neste uma página em branco, preenchida pelo
personagem, no talento de um ator em “desaparecer” perante o personagem, digno
de um Oscar. Estes pilares moldados em madeira combinam com as paredes brancas
da galeria, como um urso polar caminhando pela imensidão branca polar, no modo
como a Vida encontra possibilidades até nos terrenos mais improváveis ou
difíceis, numa artista que busca, simplesmente, sobreviver, virando as páginas
e seguindo em frente.
Estas formas são finas e requintadas, numa Judy empenhada em
não se repetir, no grande desafio que assalta o artista – não fazer sempre a
mesma coisa, pois talento tem que se cercar e força, e só os fortes sabem virar
as páginas. Entremeando estes pilares brancos voláteis, há várias formas
metálicas, cinzentas, estabelecendo vários níveis, no sonho de um arquiteto em
projetar ambientes mágicos, inteligentes, num intrincado jogo sofisticado entre
mezaninos, escadas e sacadas, numa Judy com um certo talento arquitetônico.
Estas formas metálicas insinuam mandalas, com polígonos árabes, do Oriente
Médio, nos fascinantes tapetes voadores, com suas mandalas que buscam
compreender a natureza cíclica das coisas, da Natureza, da Vida. É o ciclo de
estações, varrendo o Mundo numa demanda incrível, com extremos frio e calor
açoitando o Ser Humano encarnado, como tempestades de areia, no modo como a
artista feliz é aquele que se torna uma espécie de “tempestade do Bem”. Estas
mandalas lembram a Estrela de Davi, num povo escravizado e perseguido, no modo
como é absolutamente insuportável para um artista ser censurado e tolhido,
perseguido, mal compreendido, numa mulher que esbarra nos preconceitos
patriarcais: Como uma mulher ousa querer ser tão boa quanto um homem? Como ousa
Eva querer ser Adão? Ao fundo na cena, um ramo vegetal seco, morto,
apodrecendo, no modo como o Fascismo e o Comunismo caíram de podres, na questão
da Evolução Moral da Humanidade, com parâmetros morais se impondo, querendo
Liberdade, simplesmente Liberdade, havendo na eleição democrática um paradigma
fortíssimo – o que virá depois? Algo virá depois ou paramos por aqui? Estas
formas brancas são frágeis, e parecem que não vão suportar o peso... mas
suportam bravamente, pois são subestimadas, julgadas pela sua aparência. Aqui,
há um pensamento sofisticado, em vários níveis, fazendo um discernimento, mas
em tudo há continuidade, sendo tudo membro de um só organismo. Bem no fundinho
da cena, algo parecido com um guardachuva fechado, com seu gancho, como um falo
penetrante, numa artista que quer “estuprar”, transgredir, talvez aplicando no
Mundo uma injeção dolorida a qual fará muito bem a este mesmo Mundo,
ocasionando a evolução deste, e este é o papel do artista – ser um agente
evolutivo. As luzes da galeria mal dão conta de tantas coisas acontecendo ao
mesmo tempo, e Judy nos convida a entrar na cena e penetrar na obra, numa cama
de gato intrincada, cheia de teias furtivas que buscam capturar o demoníaco
inseto do preconceito, numa aranha faminta, que devora as tripas do
preconceito.
Referências bibliográficas:
Installations. Disponível em <www.judypfaffstudio.com>.
Acesso 6 mar. 2019.
Judy Pfaff. Disponível em <www.en.wikipedia.org>.
Acesso 6 mar. 2019.
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