quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Artistas Populares da Pop Art (Parte 7)




            Falo sobre vários artistas da Pop Art. As análises semióticas a seguir são minhas e não do livro base de Osterwold, minha referência bibliográfica.
            Acima, Liz, uma serigrafia sobre tela de Andy Warhol, de 1965. Aqui, a célebre estrela está com um aspecto de Curinga, o arquinimigo de Batman. Os cabelos negros contrastam com os loiros célebres de Marilyn Monroe, outro monstro midiático. A estrela está certa de si, sabendo que exerce fascínio sobre a Terra. Sua sombra verde sobre os olhos são o verde erótico do Éden, moradia sagrada onde reina a paz e a harmonia. O vermelho nos lábios extrapola o contorno real dos lábios, numa maquiagem circense, visto que o showbusiness nada mais é do que circo. O cabelo da estrela é lustroso, aveludado, cetinoso. Podemos sentir uma deliciosa fragrância no ar, tanto que Liz Taylor lançou em vida uma fragrância. O cabelo de Liz aqui é incerto, ondulado como traiçoeiras ondas no mar, castigando marinheiros. Temos tempestuosidade, visto que a estrela era, na vida real, uma barraqueira que se casou inúmeras vezes, numa vida pessoal turbulenta. Liz recebeu em vida o título de Dama do Império Britânico. Foi uma rainha a seu próprio modo, reinando na indústria cinematográfica, quase quebrando um estúdio com o fracasso da película Cleópatra, um dos maiores abacaxis da História. Aqui, Liz desdenha de quem duvida de seu calibre estelar, sorrindo sarcasticamente daqueles que a consideram uma pseudoestrela. Liz Taylor sabia que uma boa maquiagem é o segredo de uma boa fotogenia, e não vivia sem um maquiador. Seus olhos e sobrancelhas eram impecavelmente delineados, e suas feições delicadas enchiam a tela de glamour. Poucas atrizes conseguiram preencher a tela como Liz o fez. Liz viveu, cresceu e envelheceu em público, no eterno aprisionamento das estrelas em suas respectivas vidas públicas. Certa vez, ao entregar um prêmio, a estrela disse: Estou acostumada a receber prêmios e não a entregá-los. Amiga íntima de Michael Jackson, Liz Taylor mostrou em público o desenvolvimento de seu próprio busto, mostrando que crianças crescem. Foi uma vida pública. Andy Warhol amava as estrelas hollywoodianas, tornando-se ele mesmo uma estrela. Andy brincava com as imagens veiculadas pelas mídias de massas, e soube traduzir isso tudo em sua arte. Andy amava quaisquer manifestações artísticas, e levou a Pop Art em encontro às figuras midiáticas. Liz Taylor aqui está emblemática, marcante, e seus olhos hipnotizam o espectador. Seus cabelos são negros como a asa da graúna, e a estrela nunca teve que ser loira para arrebatar o mundo. Ao interpretar uma estrela de cinema em um filme baseado em um romance policial de Agatha Christie, Liz entregou-se à metalinguagem, pois era astro falando de astro, e ninguém melhor do que um astro para interpretar outro astro. Nesta obra de Warhol, a pele da estrela é simplesmente impecável, feita de seda. Seu nariz é delicado e de perfeitas feições, algo que provavelmente Michael Jackson quis imitar sob cirurgias plásticas. Beleza não se compra; beleza se tem. Liz deu sua beleza às telas, e ocupa o restrito rol de gigantes do panteão hollywoodiano. A função das estrelas é causar comoção; é provocar pensamento artístico. O negror dos cabelos de Taylor são uma noite estrelada de verão, amena, deliciosa, sedutora, agradável. O sobrenome Taylor quer dizer Alfaiate, mostrando que um antepassado da estrela ocupou tal função. E Liz foi isso, uma costureira que confeccionava momentos de brilho na tela, como pedras coruscantes em um vestido de gala. Aqui, Liz sabe que é uma dos grandes, e sabe que tem seu lugar garantido na História.

            Acima, Self-Portrait with Badges, ou seja, Autorretrato com Insígnias, um óleo sobre madeira de Peter Blake, de 1961. Aqui, insígnias abundantes, excessivas, carregadas, como se fossem propaganda política de muitos candidatos. Na mão, uma revista com o rei Elvis Presley com uma mulher, de estatura mais baixa, na eterna lei machista patriarcal, na qual a mulher tem que estar abaixo do homem. O mundo heterocentrado depende dessa situação de submissão feminina: se é uma mulher que é sustentada por um home, ok; se é um homem sustentado por uma mulher, não é ok. Pintando a si próprio, Blake tem uma pele parda, escurecida, e este quadro é todo meio sombrio, imprevisível, misterioso como um assassinato em um romance policial. Peter usa um par de tênis confortáveis, informais, práticos, na marca registrada do estilo americano de ser. Ele usa calça e casaco jeans, outra forma de estilo americano de vestir. As bainhas das calças estão dobradas, sem dar-se ao trabalho de mandar uma costureira costurar uma bainha. Peter está com uma camisa pólo vermelha, vibrante como sangue, o líquido essencial da vida. Atrás de PB, uma cerca de madeira escura, com alguns galhos sombrios de árvores e folhas chacoalhando a um vento persistente, em um cenário de incerteza e instabilidade. Tudo aqui é sombrio, até mesmo a expressão de Blake, com olhos petrificados que observam o espectador que o observa, numa troca de sensações e percepções. Blake está imóvel, paralisado, e não sabemos o que ele pensa. Na cerca de madeira, uma brecha, um escape, uma folga em meio a um mundo tão aprisionador. Acima da revista de Elvis, uma etiqueta com as listras e estrelas da bandeira americana, na vocação de Blake em busca de uma identidade americana, de uma independência estilística. O tecido jeans é de um azul marinho bem discreto, e a roupa trás amassaduras charmosas, como cabelos grisalhos ou uma barba por fazer. Um pouco de desleixo tem seu encanto. Blake aqui está desprovido de movimento, ao contrário da vegetação atrás, que dança sensualmente. Dei-me ao trabalho de contar quantos bótons Blake tem aqui: trinta e cinco, num excesso premeditado. Os bótons são as numerosas mensagens e conceitos transmitidos pela cultura de massa, da qual Elvis foi um verdadeiro embaixador. Nas pinceladas de Blake, nada é extremamente nítido ou claro, e a sugestão de pinceladas incertas e livres mostram o estilo do artista. O quadro todo é escuro, e em poucos lugares deste quadro as cores claras ganham espaço. Blake segura uma revista porque a indústria editorial é um dos maiores pilares da cultura de massa e da indústria cultural. Astros e estrelas estampam as capas, na tentativa de portar irresistibilidade aos olhos cidadão comum, que contempla as pessoas públicas e notórias. Na revista, a mulher está completamente acolhida pelo Rei, o qual protege-a na sua obrigação patriarcal de ser o inabalável machão provedor. Trata-se de uma imagem que expõe preconceitos, e, para um artista, ser medíocre e preconceituoso é inaceitável; é insuportável. O artista quer sempre pensar acima da média, revelando seu próprio talento. Os olhos de Blake hipnotizam aqui, e os bótons, geralmente redondos, vibram em sua diversidade, no sonho de uma América diversificada, na qual as diferenças são democraticamente respeitadas. Os bótons são redondos como o mundo, e o sonho de um artista é ser mundialmente aclamado. A camisa vermelha está completamente abotoada, quase sufocando Blake, impondo disciplina ao artista, o qual tem que se dedicar consideravelmente, sempre persistindo. Blake está praticamente simétrico neste autorretrato, com exceção, por exemplo, das mãos: uma delas está escondida, dentro do bolso da jaqueta jeans. Isso ocorre porque Blake tem uma porção de usa vida, a privacidade, que tem que ser protegida, impondo respeito, visto que as revistas e jornais de fofoca, como esta revista segurada por Blake, são inescrupulosos na hora de expor a vida íntima de pessoas públicas.

            Acima, Bellevue II, uma serigrafia sobre acrílico sobre tela de Andy Warhol, de 1963. Warhol adora as repetições do clichê industrial, como jornais impressos massivamente. Bellevue é uma cidade localizada no estado americano de Washington. Uma rua com impessoais paralelepípedos, onde cada peça carece de individualidade, como no sistema democrático, no qual todos os cidadãos são iguais na hora de votar, numa contradição, pois, num sistema opressor, os cidadãos também são iguais! Um policial uniformizado, ou seja, no exercício da função, está parado e observando, enquanto um segundo está agachado e abordando cidadãos, provavelmente dois – um veste branco e está de cócoras, debruçado sobre algo ou alguém, enquanto outra pessoa está estirada no chão. A figura do homem de branco lembra o formato da face de um alienígena. Andy não nos traz muita clareza aqui, e o espectador tem que ver aquilo que acha que deve ver. Será um momento de abordagem policial a suspeitos? Será o artista flagrando um momento em que a Lei se faz presente? Aqui há borrões incertos, como uma grotesca fotocópia, a qual subtrai muito da qualidade da fotografia xerocada. Nas figuras mais abaixo no quadro, há uma confusão e um embolamento, e as imagens caem umas sobre as outras. Seria um homem morto no chão, na cena do crime? Seria o homem de branco preso em flagrante? O que diabos está acontecendo aqui? A cena passa-se numa calçada, à margem da rua, num ponto de limiar, de exclusão. A qualidade visual é grotesca, de propósito, é claro. O artista aqui não tem preocupação alguma em trazer nitidez e certeza, e esse obscurantismo é o que predomina nesta cena. E por que a ausência de cor? Seria para mapear o conflito racial norteamericano, como no Sul dos EUA, numa época em que a segregação entre preto e branco era aceita como civilizada? As fotos, distribuídas umas ao Aldo das outras, são como os paralelepípedos, numa tentativa de ordem e organização, ordem esta representada pelos policiais. Estaria no chão alguém morto violentamente? Essa ausência de nitidez mostra um Warhol confortável em seu próprio estilo, fazendo a revolução que a Pop Art representou – a Arte nunca mais foi a mesma. O policial em pé fornece-nos uma silhueta, a partir da qual adivinhamos que se trata de um policial. Será que, agachados, há dois policiais e não apenas um? O homem de branco traz a ritualidade da cor branca, como médicos, espíritas e praticantes de candomblé, por exemplo. Será que o homem de branco é mesmo negro ou se trata de uma confusão, visto que aqui Andy não tem preocupação em transmitir clareza de tom? As fotos repetidas são como televisões expostas em uma vitrine de loja de artigos eletrônicos, mostrando a repetição massiva de informações midiáticas, transportando imagens e conceitos aos quatro cantos da nação, criando um poder midiático no qual quanto mais divulgação, melhor. A mídia é quantitativa, como uma pessoa com milhares de amigos no Facebook. O que importa aqui é a quantidade, e não a qualidade. A cultura de massa revela-se na sua vocação de esteira industrial, na qual desfilam produtos produzidos em massa, buscando conquistar o maior número possível de consumidores. Quanto mais um produto for adquirido, melhor – é a ambição mercadológica. Marqueteiros quebram a cabeça em busca de elaboração de conceitos que vendam, e o mundo publicitário quer seduzir. Aqui, Andy traz-nos uma cobertura jornalística falando sobre o que aconteceu nessa calçada obscura, e quanto mais telespectadores um telejornal tiver, melhor. E, para Warhol, quanto mais pessoas gostarem e adquirirem os trabalhos de Warhol, melhor. Todos querem sucesso. A silhueta negra do policial em pé contraste com um fundo esclarecido, fazendo deste personagem o ponto central da trama – o resto é incerto, como um borrão sugestivo, conotativo, nunca claro. O homem de cócoras parece estar defecando, em surto catártico, limpando sua própria alma, e o cocô da catarse torna-se Arte. A rua aqui está impecavelmente limpa, e o assassinato em questão traz sujeira, crime, negatividade.O policial lá está para garantir a integridade do cidadão honesto. E Warhol foi íntegro em sua própria arte, esforçando-se para ser novo e criativo.

            Acima, Self-Portrait, ou seja, Autorretrato, um acrílico e serigrafia sobre tela de Andy Warhol, de 1967. Aqui, Andy está pensativo, em dúvida, ponderando sobre escolhas, visto que a vida é feita de escolhas. Está cuidadoso, fitando o espectador, querendo estabelecer um relacionamento, um vínculo. Sua pele está azul como o céu, azul como os personagens fantásticos do filme Avatar. Seu cabelo está impecavelmente penteado, arrumado, aprumado, como se o artista tivesse se preparado para ser observado por inúmeros espectadores. O fundo é rosa, delicado, tenro, como um miolo de carne malpassada, pois Andu foi delicioso, um belo filé com guarnições chiques. Warhol foi alimento não só para os espectadores, mas para outros artistas também. Os dedos de Andy estão como se ele estivesse tragando um cigarro, num momento relax, tranquilo, de introspecção, talvez pensando nos trabalhos que fará posteriormente e se esses trabalhos serão bem recebidos, pois o artista tem a expectativa de ser visto e compreendido, e muitos artistas são malcompreendidos, como Jesus Cristo crucificado, extremamente malcompreendido. Os cabelos de Andy têm nesgas castanhas, mas, apesar das cores, esta tela é sombria, imprevisível. Ao lado do artista, um grande retângulo negro, num trabalho com um metro e oitenta de altura. Mas, no restante do cabelo, preto, assim como traços da face e como o traje usado pelo artista. É um autorretrato sombrio, pessimista, denso, e não podemos ver o que o artista quer dizer. Será que há depressão? Será que há melancolia? Será que há um futuro bem incerto? Será que o artista manter-se-á no topo, sendo sempre amado e respeitado? O azul é o céu limpo, claro, profundo em sua beleza colorida e limpa. No azul do céu, o artista deposita seus sonhos e ambições, sempre batalhando para ser reconhecido. Sua orelha é saliente, e o azul remete aos personagens infantis Smurfs. Por que esta subversão de cores, retratando a pele sem a cor original da pele? Existe algo mais monótono do que um artista óbvio e previsível? Warhol surpreendeu o mundo, merecendo ter conquistado a posição de ultradestaque que conquistou. O rosto e mão do artista trazem traços pretos que delineiam uma personalidade que, apesar de contemplativa, é ativa e trabalhadora. Aqui, podemos observar apenas uma metade do rosto, como os dois lados da Lua – um sombrio e um claro. A face negra é a licença que Andy pede para que sua vida particular seja respeitada, revelando uma personalidade reservada e discreta, num atelier dinâmico e produtivo. As proporções desta tela são a de uma capa de disco vinil ou CD, como um popstar vendido em uma loja, como perfume. É claro que AW tinha intenções comerciais, pois todo mundo tem que ganhar a vida. Aliada a isso, vem o comprometimento artístico, a integridade criativa, sempre oferecendo conceitos novos de Arte, explorando as vastas terras da Pop Art. Aqui, o artista está sério, sem qualquer indício de sorriso, pois a vida é algo sério. O azul é um paradisíaco mar caribenho, num momento de prazer e descanso, num artista que, apesar de produtivo, quer curtir a vida e os simples momentos de prazer. Warhol não foi workaholic, como se soubesse que a vida não é só produzir. O preto nesta tela traz traços que revelam o aspecto gráfico, simplificando as imagens e colocando estas ao alcance da mídia de massa, oferecendo ao público produtos, pois um trabalho de Arte, apesar de trazer a individualidade artística autoral, não deixa de ser uma mercadoria, vendida a peso de ouro em leilões. Já ouvi dizer que a obra pertence sempre ao artista, mesma se esta obra tiver sido vendida. A pessoa que adquire uma obra é um cuidador, um portador, nunca um dono. É como se fosse um empréstimo. Um olho de serpente no centro de uma supernova. Uma coroa régia. Um fóssil de dinossauro descoberto. Um apelo comercial irresistível.

            Acima, Self-Portrait Box, ou seja, Caixa de Autorretrato, uma construção em madeiras, fio de lã vermelho-branco-azul, pregos e 50 fotos do artista Lucas Sâmaras, de 1963. Dor, muita dor, em uma mega crucificação, com sangue sagrando em vão. Esta peça lembra o demoníaco personagem de terror Hellraiser, uma entidade cruel e sádica, que rasgava a pele das pessoas com anzóis cruéis, horríveis. Porque aqui Lucas catarteia tanta dor? Os pregos toda a parte exterior visível aos olhos, inúmeros agentes de tortura. Aqui, há um calabouço inescapável. A peça convida à interação, convidando o espectador a ignorar a dor e apreciar a várias fotos do artista nesta caixinha de lembranças. O artista é bonitão, fotogênico, numa empatia que faz com que esqueçamos da dor promovida pelos pregos pontiagudos. As listras rubras exteriores da caixa são o sangue de Jesus, o homem mais incompreendido da História. O forro da caixa é negro, fechado, incomunicável, em luto permanente, num velório que nunca acaba. Se fechada, a caixa fica parecendo um corpo peludo, como um porcoespinho, que refrata quem quiser chegar muito perto. Esta caixa é como um cactos, e fere como a coroa de espinhos do Salvador. É o aspecto de uma barba que precisa ser urgentemente barbeada. Aqui, há um aspecto sujo, desleixado, e há a opção de abrir ou fechar, de avançar ou recuar, conforme a vontade do espectador – Lucas deixa o espectador livre, à vontade, confortável, apesar dos desconfortáveis pregos excruciantes. Aqui, há cheiro de coisa velha, mofada, que está guardada desde sempre, dando-nos a vontade de limpar, arejar, desodorizar. As fotos desse autorretrato pós moderno do artista são em preto e branco, na elegância do registro bicromático, com a eterna valsa de sedução entre claro e escuro. A foto PB tem um apelo clássico, atemporal, e o artista aqui sabe disso. É charme. Só que nem só de charme é feita a vida, e os pregos fincados estão aqui para lembramo-nos de que as coroas de espinhos são inevitáveis, porém suportáveis. Os pregos também parecem-se com delicadas flores com pescoço longilíneo, balançando suavemente ao vento. A caixa é um lúgubre caixão funerário, só que, no interior não há um morto, mas recordações de uma vida – aqui, não há um simples cadáver em decomposição, mas uma vida pulsante e charmosa. A impressão que se tem é a de que estamos invadindo um setor privativo da vida de Sâmaras, e que registros muito particulares estão sendo trazidos a público, no prazer do voyeurismo, dando ao espectador a sensação de estar vendo algo que não deveria estar vendo, numa sensação deliciosa de transgressão e sacanagem. Cada prego dolorosamente fincado é como palavras de crítica, palavras duras que repreendem o artista, num Lucas já calejado por lidar com tantas críticas que sempre rondam o trabalho de qualquer artista. Mas o artista é maior do que isso tudo, e renasce vitorioso, como na ressurreição de Cristo. A grande vingança do artista é, em algum momento, passar a ser apreciado, como num gênio que só foi plenamente reconhecido depois da morte – é uma doce vingança, como se o artista estivesse no túmulo rindo de todos que um dia desdenharam desse mesmo artista. Cada prego fincado traz um local, uma referência, marcando um endereço de alguma loja ou residência em um mapa. Aqui, Lucas está repleto de referências, de lugares, e é um mapa riquíssimo, em uma cidade vibrante e cheia de opções de trabalho, estudo e lazer. Lucas sonha com um mundo melhor, menos preconceituoso, mais livre, como no sonho de uma América democrática e livre, na qual as diferenças não são um empecilho, mas uma necessidade saudável. Esta peça lembra-me de um episódio de minha infância, quando um cachorro veio para cima de mim e me fez cair sobre uma moita de espinhos! As dores existem para ensinar, e elas têm uma função importante na vida. As dores são positivas, apesar de parecerem o contrário. Se arrancarmos cada prego, a caixa ficará toda furada, ferida, marcada, como inocentes poros, cuja função é deixar a pele respirar. Tudo o que um artista quer é respirar. É como um atribulado formigueiro, em constante atividade, como em uma cidade viva e vibrante como Nova York. São como fios de cabelos, crescendo sempre, com vida. É uma floresta densa de árvores-prego, ou uma elegante mata nativa de araucária, com seus troncos longos e elegantes.

Referência bibliográfica:
OSTERWOLD, Tilman. Pop Art. Köln: Taschen, 2007

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