quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Saci com Duas Pernas



Antes de se encontrar como artista plástico, Luiz Sacilotto trabalhou como publicitário e desenhista de Arquitetura. Muitas de suas obras convidam ao um olhar além da visualização frontal, convidando-nos a observar de vários ângulos. Os textos e análises semióticas a seguir são inteiramente meus. Boa leitura!


Acima, Composição. Óleo sobre brasilit. 24 x 41 cm. 1948. Uma diversificação cromática muito divertida. O círculo vermelho é o Sol nascente do Japão, no deus egípcio do disco solar, como um gongo, esperando para ser tocado, anunciando algo – a chegada de uma visita ou a disposição do almoço na mesa. O som é uma agressão auditiva, marcando a divisão entre dois momentos, no modo como Jesus dividiu em duas a História da Humanidade. É uma gota de sangue, como num exame de sangue, no modo científico ocidental de se fazer verificação empírica, como cozinhar um macarrão, provando um fiozinho para ver se todos os outros fios estão prontos. É o canal natal, pelo qual o indivíduo vem ao Mundo, no túnel de luz que nos espera no desencarne, transportando-nos à dimensão acima, um lugar onde só há gente boa, gente honesta, jogando os maliciosos no impiedoso Umbral. Este quadro é um organismo, no qual cada órgão tem sua função, seu papel, como na Vida em Sociedade, na qual o indivíduo tem que ter alguma função, tem que produzir algo, senão é rejeitado como fezes, na grande latrina das almas desocupadas – é a Justiça Divina, uma coisa séria. Temos algo de quadriculado aqui, como um Mondrian, só que com maior diversificação cromática. São como coloridos confetes carnavalescos, jogados ao alto como um espumante sendo aberto, num momento de euforia, de extravasamento de demônios, no modo como, em toda vida, há de existir uma pitada de diversão; por outro lado, não é patético aquele que só se diverte? Temos alguns elementos negros no quadro, numa noite fechada, na sedução da Vida Noturna, com boates que buscam seduzir o frequentador, com pessoas que caem na sedução das Drogas, numa pessoa agrilhoando a si mesma, pois nunca ouvimos dizer que o Inferno é você mesmo? Os elementos em amarelo são uma majestosa aurora, num nascer que renova a Vida sobre a Terra, num despertador tocando, trazendo o indivíduo para uma nova jornada, um novo momento. É a magia de despertar em um mundo plácido, cheio de beleza, com as cores douradas de uma renovação, de uma nova perspectiva, no modo houve uma aurora na vida de Sacilotto, quando este despertou para a Arte, abraçando a si mesmo e abrindo o próprio coração para o Mundo, como me disse uma psicóloga: Aonde quer que vá, vá com todo o seu coração, pois quem ama o Mundo, por este é amado. É uma meritocracia comportamental, ao contrário de nossos irmãos umbralinos, que sofrem. Quebrando um pouco a quadriculação, o quadro traz linhas orgânicas, como na sinuosidade de um violão, no formato do corpo da mulher, no modo como as modelos magérrimas fazem poses para parecer que têm mais curvas do que realmente têm, e isto é irônico: A Indústria da Moda exige modelos magérrimas e, ao mesmo tempo, exigem que elas pareçam mais voluptuosas (!). Na porção superior do quadro, uma forma que parece ser a cabeça de um cachorro, animal que representa a fidelidade incondicional, ou seja, o melhor amigo do Homem, como os cães farejadores em busca de drogas em aeroportos, auxiliando na incessante guerra contra a drogadição, pois as drogas são sinais auspiciosos, ilusões, reduzindo pessoas a seres patéticos. As partes em azul são a alma sonhadora, com a “cabeça nas nuvens”, no modo como o sonho, acompanhado de labor, tem sua importância, pois como é pobre a vida de quem não sonha nem um pouquinho! O quadrado púrpura, que abriga a assinatura do artista, é a sofisticação, é a cor de um hematoma, nos inevitáveis socos que a Vida vai dando em cada um de nós, fazendo com que o indivíduo tenha a força para se reerguer e continuar amando a Vida. É necessário um espírito olímpico! Ao lado do elemento em púrpura, um quadrado dividido ao meio, como um Frankenstein, uma colagem, uma clipagem, unindo peças separadas e fazendo algo novo, como uma colcha de retalhos.


Acima, Composição. Óleo sobre brasilit. 40 x 58 cm. 1948. Este quadro pertence ao Museu de Arte Moderna do Rio. Um vitral de igreja, talvez num Sacilotto religioso, mesmo que de forma inconsciente. Aqui, a herança mondriânica é mais clara, com arestas e formas truncadas, duras, manifestando toda a dureza do Mundo, um lugar em que a pessoa tem que provar que é boa e competente, pois, sem provas, nada se confirma, numa exigência racionalista, objetiva. Os vitrais coloridos de igreja quebram a sisudez religiosa, numa igreja que exige que o devoto se confesse, fazendo com que o devoto se arrepender de atos naturais e inofensivos, como a Masturbação, pois, como ouvi numa palestra inesquecível de Marta Suplicy, a Adolescência é uma época em que se masturbar dez vezes por dia é perfeitamente normal, ou seja, o Ser Humano tem que aceitar sua própria natureza. Aqui, temos uma mágica cesta de Páscoa, cheia de doces multicoloridos, no sentido de que o Espiritismo crê que, na Dimensão Metafísica, há doces deliciosos para serem degustados, como numa chocolateria gramadense, mas numa dimensão mental na qual a pessoa não engorda pelo formidável pecado capital da Gula – olha a Igreja aí de novo. O que há de errado em se sentir prazer, ora bolas? Neste vitral, temos algumas formas tortuosas, no aspecto orgânico, como sangue líquido circulando por um corpo, ou como uma seiva nutritiva, sempre circulando, sempre ventilando, sempre alimentando corpos e estruturas. Temos aqui vias de uma cidade que não foi planejada, numa urbe que foi se desenvolvendo gradativamente, compondo um semilabirinto o qual apenas os moradores da cidade compreendem completamente, desafiando o visitante, como entender perfeitamente a malha de metrô novaiorquina – eu até tentei andar de metrô em NY, mas, quando cheguei à estação subterrânea, achei tudo de um aspecto medonho, tão medonho que desisti de me aventurar pelo subway. Como na obra de Romero Britto, a cor preta tem um papel decisivo, pois o negror coadjuvante tem a função demarcadora, estabelecendo limites entre os subcobjuntos multicoloridos, estabelecendo ordem e respeito à propriedade alheia, pois há uma doutrina, desculpem-se, que prega o desrespeito a outrem, à propriedade de outrem e à liberdade religiosa. No quadro, as partes em azul são como se estivessem vazadas, proporcionando que o espectador flerte com um belo dia de céu azul, numa cena de limpeza e certeza, num ar puro circulando como fina melodia na Dimensão Metafísica, o Reino dos Céus que nos espera após o inevitável Desencarne. É uma nova perspectiva, e a Arte tem esta função, a de assinalar novos tempos, renovação, arejamento, como o Impressionismo “estuprou” a Pintura Tradicional Acadêmica. Arte é isso – jovialidade, como num da Vinci, que permaneceu jovial e bem-humorado até morrer. Aqui, a diversidade proporciona convívio pacífico, com as individualidades sendo respeitadas, dando nota zero aos que se acham proprietários de outrem, pois Liberdade e Prazer andam juntos – nada de errado em encontrar contentamento e alegria. Este é um vitral que foi estilhaçado pela Reforma Protestante, numa época em que o Respeito à Diversidade era absolutamente ignorado, precisando haver uma revolução para se trazer os valores contemporâneos de Igualdade. Esta explosão cromática traz uma cornucópia nobre e farta, nutrindo fartamente os súditos de um reino, num regente amoroso, que se coloca a serviço do Povo, nunca se opondo a este, como diz Tao: Nunca atrapalhe a escolha de um súdito em ser um pacato cidadão, um súdito que fica quietinho no seu canto, vivendo a Vida com simplicidade, pois quando há contentamento, nada significam talheres de ouro maciço – a Vida é boa quando é simples. Temos aqui um quebracabeça, sendo que cada um o monta do modo como desejar, pois pobre do artista que tem que produzir atrelado a uma ideologia opressora. Nesse sentido, o artista, sem Liberdade, não é artista.


Acima, Composição. Óleo sobre tela. 53 x 66,5 cm. 1949. Fios sustentando pontes, na demanda de uma urbe gigantesca, na demanda de uma pessoa que simplesmente precisa fazer Arte, numa demanda espiritual, no engarrafamento de uma cidade enorme, como um intestino constipado, amarrado, numa crise de fluxo, no prazer da catarse em se fazer cocô, numa sensação libertadora de desamarra. Grades de uma prisão, projetando uma sombra dentro de uma cela, no desespero de um detento em se libertar – não somos todos detentos? É a sombra que um artista deseja projetar no Mundo, fazendo “o chão tremer”, na capacidade do grande artista em causar impacto e comoção, como na declaração antiburguesia que foi Titanic. É como uma máquina de tear, no labor paciente do artesão, como na Divina Providência, tecendo as vidas das pessoas, fazendo com que passemos uns pelos outros, como irmãos se conhecendo e desejando o reencontro em uma dimensão superior, nas almas saudosas, que fazem com que sintamos muita saudade. Mais acima, vemos uma forma azulada no formato de uma mancha, ou de um fantasma, como um ovo sendo frito, no modo como a cabeça de uma pessoa é um forno no qual “pães” são confeccionados, no milagre cristão da multiplicação de peixes, assinalando que, acima da Terra, há rios fartos, sem a miséria de quem é rico; sem a miséria de quem é pobre(!). Essas barras são como uma xilogravura, um carimbo, na necessidade humana em conhecer, organizar e categorizar, enchendo o Mundo de graças e nomes, numa busca incessante por esclarecimento, na missão científica em conhecer e iluminar, numa estrela d’alva, surgindo fria no céu escuro, assinalando o início de uma revolução, de um processo de iluminação, desaparecendo aos poucos em meio às cores douradas de um novo dia, numa terra onde há beleza e limpeza por todos os lados. É uma promessa consoladora, restando à pessoa sonhar. Esta “ponte” é como um leque sendo aberto, numa oferta de múltiplas opções, numa pessoa que tem que decidir fazer algum trabalho, alguma coisa produtiva, pois, do contrário, é insuportável a sensação de nada fazer, como no Umbral, a dimensão maliciosa, um lugar sem algo produtivamente bom para ser feito, numa absoluta falta de sentido e de propósito. São como ângulos de um círculo, em lições matemáticas de pensamento racional e frio, na missão nobre da Matemática em estimular o pensamento lógico, inteligente, conhecimento este que abrange tudo. E como eu desprezava a Matemática! Temos aqui alguns quadrados e retângulos, prontos para serem desbravados e nominados, no frescor que este leque traz, na brisa de novas ideias de revoluções, havendo na Arte um nervo revolucionário – não seria horrível nunca mais haver novos movimentos na Arte? Temos aqui também algumas quinas cortantes e agressivas, no formato piramidal de espinhos, arestas esperando para ser aparadas, numa personalidade um tanto agressiva, cheia de ímpeto, no modo como a pessoa agressiva tem que tomar cuidado para não se tornar uma pessoa barra pesada, que pega pesado, esquecendo de ser sutil, discreta e cavalheiresca. Temos vários subconjuntos negros, imprevisíveis, no que nos espera pelas esquinas da Vida, “dando nos dedos” de quem acha que tudo já sabe, ou seja, a arrogância é a serpente sendo esmagada pelos alvos pés de Nossa Senhora, numa busca por apuro moral, busca esta que é o propósito áureo – a Vida não vai nos fazendo pessoas melhores? São como escadas de uma enorme mansão, absolutamente suntuosa, mas uma mera cópia das mansões metafísicas, sendo estas lugares ao desencarnado, apesar deste não ter documentos que comprovem a posse – a posse é uma ilusão material, pois sequer somos donos de nosso próprios corpos carnais, os quais perecerão. É um cenário gigantesco de uma produção antiga de Cinema, convidando o espectador a sonhar, principalmente durante a II Guerra Mundial, período em que o Cinema tinha que pegar leve, trazendo algum consolo ao espectador em meio às horríveis notícias bélicas da época. Arte é isso – antídoto. É um plano que tenta compreender o Eterno, na comprovação do poder imenso de Tao – jamais haverá fim. É o perfume da Vida Eterna. Irresistível.


Acima, Vibração Ondular. Esmalte sobre madeira. 42,5 x 50, 5 cm. 1953. Teclas de um piano em êxtase jazzista, no namoro entre as Artes. Ou como uma sanfona, produzindo som, como os “noninhos” tocando gaita em frente a um restaurante gramadense, convidando o cliente a apreciar Culinária e Arte. São trilhos de um trem, num trajeto, como em Assassinato no Expresso do Oriente, num trem cheio de assassinos conspiradores, no prazer em se desvendar um enigma, um crime. É como o saudoso Jogo da Vida, da fabricante Estrela, num trajeto existencial que passa por uma faculdade, pela construção de uma família e, por fim, a merecida aposentadoria, ou seja, a chegada a uma dimensão onde a pessoa descansa para, após, retomar a seriedade da Vida. É um trajeto, um desafio, uma trilha, como um LP ou um CD girando, fazendo a pessoa caminhar, num itinerário, como no trajeto nos pavilhões da Exposição Agroindustrial da Festa da Uva. São pauzinhos tentando se organizar, numa dança, num balé, numa coreografia que abrange cada membro do grupo, delegando papéis a todos, pois não é a Vida uma grande ópera? E o rico poderoso desencarna achando que ainda é rico e poderoso: nunca ouvimos que vão-se o anéis e ficam os dedos? Como no suicídio de Getúlio Vargas, no apego ao Poder. É um teatro, como um ator que, depois da encenação, despe-se do personagem e volta a ser a si mesmo, e o filme de uma vida é um filme de Hollywood, com multidões observando encarnações, no indivíduo que, ao desencarnar, sente-se como uma estrela voltando ao saudoso lar, recebido com glória, numa infinidade de significado. Temos aqui o charme entre o preto e o branco, num registro binário, numa grande estrela hollywoodiana fotografada em preto e branco, com uma pele acetinada e cabelos deslumbrantes, aprumados. São como espetos prontos para espetar a carne do churrasco, numa identidade cultural, quando vi, certa vez, ninguém menos do que Paixão Côrtes almoçando carne em um buffet em Caxias do Sul. São as “espetadas” que o psicoterapeuta dá em seus pacientes, para que estes prestem atenção à própria demanda existencial, espetadas que servem para ver se o paciente está vivo e consciente de si mesmo, consciente de sua própria vida. É o termo “colocar os dedos na tomada”, numa sensação desagradável, é claro, mas um remédio amargo que acaba fazendo um tremendo bem à pessoa. Portanto, não devemos reclamar do aspecto “feio” da Vida, pois o percalço vem para ajudar. São como sensuais venezianas num dia quente de verão, deixando o quarto em uma penumbra sexy, numa cena de prazer, de gosto pela Vida, num perfume de Verão, de férias, na pontinha de melancolia quando o Verão acaba e a pessoa tem que voltar a encarar a Vida, havendo nos objetivados um pouco menos dessa melancolia. Aqui, é uma trilha viscosa deixada por um verme inofensivo, na construção de uma carreira artística ou empresarial, na lição de cada momento, como uma cobra trocando de pele, renovando-se, como trocar de forro um sofá velho, como descascar uma fruta, como uma diva com décadas de carreira, chamando a atenção por sua trajetória criativa e colorida, vibrante. É o termo que já ouvi para definir a Linha do Tempo de usuários do Facebook: “penteadeira de puta”. Numa visão machista, a mulher tem que ser imaculada e sem história, jovem para sempre. Portanto, uma mulher artista aniquila este preconceito, havendo na Arte todo um aspecto sociopolítico de contestação, rebelando-se contra um governo que ameaça perseguir os opositores. Este quadro me lembra de um desenho da Pantera Cor de Rosa, num apelo abstrato regado a música, numa experiência onírica em que os elementos surgem da tela de forma estranha e instigadora, no poder da Criatividade, sendo esta a obrigação de um artista. Esta trilha corta o quadro de ponta a ponta, pervertendo os palitos retilíneos, submetendo estes à liquidiscência inevitável da Vida, como em Moby Dick, livro que, em um certo ponto, faz com que o leitor se sinta ondulando em um barco em Alto Mar.


Acima, Abstração. Óleo sobre tela. 60 x 47 cm. 1950. Este quadro pertence ao acervo do banco Itaú. É como um copo d’água derrubado sobre uma toalha, nos inevitáveis acidentes do cotidiano, como diz uma canção: “Acidentes acontecem; crianças crescem”. É a umidade tomando conta de um dia chuvoso, úmido, brumoso. No canto inferior direito, uma cobra coral, traiçoeira, perigosa, venenosa, esgueirando em meio ao mato para matar presas com seu veneno irrefreável, como uma pessoa fofoqueira, que nada mais tem a fazer da Vida – fofocar é uma perda de Tempo, pois fofoca e improdutividade andam juntas. Desinteressante. Temos aqui um prisma poderoso, riquíssimo em cores, numa explosão doce como um saco de jujubas, no modo como a Chiquinha não quis dividir as balas com Quico, fazendo esta ficar com dor de barriga, pois tudo em excesso é prejudicial – deitar na cama para descansar é bom e necessário, mas a pessoa enlouquece quando fica tempo demais na cama. Temos aqui linhas tensas oblíquas, dialogando com formas derretidas, como os relógios de Dalí, como na tórrida superfície venusiana, um ambiente hostil ao Homem, no desafio da Humanidade em desbravar o Cosmos, numa Humanidade ainda jovem demais. Um grande losango alaranjado é uma deliciosa e perfumada laranja, madura no ponto, como no slogan “Economizar é comprar bem”. Há aqui um jogo de transparências muito sensual, com sombras suaves se movendo pelo quadro, como um protetor solar, uma grande invenção. É como um tsunami esgueirando-se por terras secas, nas forças titânicas da Natureza, no modo como o grande artista é uma onda selvagem e gigantesca, arrastando as percepções do espectador, no modo como é feliz a obra que causa comoção, incômodo e contestação, rompendo chãos e trazendo o Mundo a um novo patamar – Arte é educar, mas de forma vibrante, divertida. Temos um Sacilotto amante das cores, num arco-íris sedutor, num prisma de gotículas de água, na promessa de um baú de ouro no fim do arco alegre, mas é uma promessa apenas, pois o pós vida só acontece em um determinado momento, depois da encarnação. É como a cor verde, que faz intermédio entre o amarelo e o azul, duas cores que de nada têm em comum, ou seja, duas cores que guerreiam entre si, em pura desigualdade. Então vem o verde e coloca-se entre os dois pólos birrentos, construindo a promessa de um amanhã menos belicista e mais pacífico. O verde não vai mudar o Mundo, mas vai trazer Esperança, pois já ouvi dizer que a Filosofia não muda o Mundo, mas pode mudar a visão de uma pessoa sobre este mesmo Mundo. Temos aqui linhas como um kilt, com linhas intercruzadas, como complexos circuitos de um produto eletrônico, fazendo metáfora com a construção técnica espiritual, quando a mortificação é necessária, vindo esta aniquilando ilusões auspiciosas. Os percalços causam desilusões, e isto é bom, muito bom – é capital. Temos aqui um namoro entre mole e duro, com linhas fazendo amor entre si, num momento interessante de interação social, como um baile, numa festa, num momento em que pontes são construídas. Então esta “ameba” curvilínea se insinua, trazendo um filtro solar, uma sombrinha, um guardassol, fugindo da obviedade solar e trazendo a discrição capciosa de uma sombra suave e sutil. Aqui, a assinatura do artista está na parte superior do quadro, no modo como os sonhos de artista estão lá no Céu, na Dimensão Metafísica, trazendo o desafio de traduzir estes sonhos e trazer estes para cá, para a Terra, como já ouvi dizer: O Ser Humano precisa tocar o Divino aqui, na Terra. A construção de mitos é inevitável e, ao mesmo tempo, rechaçável. Dispa-se de bobagens auspiciosas. E a serpente curvilínea se insinua sempre, fazendo fluir entre vales a preciosa água, num símbolo antigo de fertilidade, no modo como a mente artística não pode ser estéril, pois, se o for, produzirá qualquer coisa, menos Arte. A Arte é filha da Liberdade, e viceversa.

Referência bibliográfica:
Obra. Disponível em <www.sacilotto.com.br>. Acesso 17 out. 2018.

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